domingo, 13 de maio de 2012

Israel vs Palestina : História de um conflito X (1998-1999)



Em 1998, o ano político começou no Dia de Reis, quando o representante dos Estados Unidos Dennis Ross encontrou Yasser Arafat e Binyamin Netanyahu com o objetivo de preparar um encontro em Washington logo em janeiro.
Porém, antes da reunião acontecer no dia 20, Binyamin Netanyahu voltou a torpedear as conquistas de Yitzhak Rabin anunciando no dia 18 que mesmo que um Acordo de paz fosse assinado Israel manteria o controle de grande parte da Cisjordânia.   
Portanto, quando esteve com Bill Clinton no dia 20 não concordou nem com a perspectiva de implementação de autonomia palestina restrita.
Quando Yasser Arafat chegou em Washington no dia 21 foi encurralado de cara, primeiro pela secretária de Estado Madeleine Albright e no dia seguinte por Bill Clinton.
Nas duas reuniões Arafat foi instado a pôr fim às atividades guerrilheiras do Hamas - então ponto pacífico, já que as bombas-suicidas estavam momentaneamente caladas para deixar espaço ao diálogo -  e em contrapartida os EUA se comprometiam a convencer Israel a proceder a uma retirada militar e civil credível da Cijordânia.  

Checkpoint em Hebron de uma rua para outra
No final os líderes voltaram para casa e enviaram aos Estados Unidos representantes para negociar um plano paralelo.
Enquanto os enviados conversavam, Netanyahu minava o terreno do seu lado.
Um mês após a reunião conciliatória, tropas da IDF na Cisjordânia investiram por um campo de refugiados adentro invadindo residências e prendendo seis homens sob suspeita de futuros ataques, e no dia 11 de março mataram em um checkpoint próximo de Hebron três operários a caminho do trabalho.
O protesto palestino veio na maneira de sempre, com passeatas que terminaram em pedras e queima de pneus contra gases, tanques e balas da IDF, enquanto os soldados implicados no assassinato eram interrogados.
Foram libertados no dia do funeral dos três trabalhadores seguido por milhares de pessoas indignadas com o crime, a impunidade e a situação que em vez de melhorar, piorava.
As passeatas continuaram e em Hebron os feridos aumentaram enquanto o ministro das relações exteriores da Inglaterra Robin Cook terminava a turnê no Oriente Médio com um relatório etregue ao primeiro ministro Tony Blair para que alguma providência oficial fosse tomada.
No terreno os dois líderes se distanciavam, mas nos bastidores seus representantes dialogavam com pouca margem, mas suficiente para que no fim de março os Estados Unidos apresentassem um projeto de retomada das negociações interrompidas em 1997.
Em sua dança de um passo pra frente e três pra trás, Netanyahu rejeitou de cara a proposta de retirada da IDF de 13% da Cisjordânia, embora a porcentagem fosse aquém da prometida por Yitzhak Rabin nos Acordos de Oslo.
E no dia 02 de abril a discórdia chegou ao ápice com a morte de Mohiyedine Sharif, pupilo de Yahya Ayaash, novo artífice das bombas usadas pelo Hamas.
Sharif foi baleado e seu corpo foi deixado perto de um carro explodido para eliminar as marcas do assassinato.
Israel negou o crime, mas mesmo assim o Hamas jurou vingança por não acreditar na versão oficial que Sharif fora vítima de um grupo interno rival não identificado.
A este seguiu o assassinato de um dos líderes do Hamas, desta vez com responsabilidade clara da polícia israelense e Abdel Aziz Rantisi, do Hamas, exigiu a demissão de membros da Autoridade Palestina que acusava de passividade ou cumplicidade com o inimigo.
Em vez de demiti-los, Arafat ordenou a prisão de Rantisi dificultando ainda mais as relações entre o Hamas e a Autoridade Palestina.
Nesse ínterim Tony Blair, recém-empossado em 1997 e ainda vulnerável aos ideais do Partido Trabalhista que o pusera em Downing Street, marcou reunião em Londres no dia 04 de maio para tentar desenredar a situação e durante o ano deu um pulo em Gaza para visitar Arafat.
Enquanto a reunião de Londres estava sendo oranizada, Dennis Ross voltou à carga, pedindo que Netanyahu cumprisse o combinado e tentando acalmar Arafat que sofria pressões de todos os lados por submeter-se às vontades do adversário.
Apesar das dificuldades o Encontro em Londres começou na data marcada, mas foi Madeleine Albright que tomou as rédeas das conversas, separadas, com os líderes israelense e palestino.
O dia foi movimentado, mas embora a Secretária de Estado estadunidense não tivesse conseguido abrir os olhos de Netanyahu nem convencer Arafat a abdicar das magras conquistas do Acordo de Oslo, conseguiu pelo menos que nenhum fosse embora.
As reuniões se repetiram no dia seguinte, Albright anunciou que Arafat concordara com a proposta de resgatar as negociações de paz, pediu para Netanyahu também concordar, o israelense não lhe deu nenhuma bola, e o Encontro terminou no dia 06 sem que nenhum passo adiante fosse dado.
E lá foi Dennis Ross à cata de Netanyahu para convencê-lo a, no mínimo, participar de um diálogo bilateral em Washington, mas não conseguiu a atenção do primeiro ministro israelense nem por uma hora.
Ao ouvir a condição imposta - a devolução à Autoridade Palestina do controle da área combinada - Netanyahu deu de ombros e foi embora.
Nesta altura dos acontecimentos, uma digressãozinha sobre os intermediários escolhidos por Washington para mediar a paz no Oriente Médio parece útil.
A Secretária de Estado Madeleine Albright detestava Yasser Arafat, dizem que por influência histórica.
E o enviado especial Dennis Ross (de volta à ativa este ano junto a Hillary Clinton na questão iraniana) teve sua imparcialidade várias vezes questionada.
Em 2006 Stephen Walt, professor da Universidade de Harvard, nos EUA, incluiu o nome de Ross na lista de membros do lobby israelense em Washington; e em 2008, Daniel Kurtzer, ex-embaixador dos EUA em Tel Aviv (1982-1986), publicou uma monografia que continha depoimentos anônimos de negociadores árabes e estadunidenses que reclamavam que Ross tomava o partido de Israel nas negociações.

Quaisquer que fossem os interesses pessoais e ideológicos dos dois mandatários estadunidenses no processo de paz, Netanyahu estava confiante e pôs todos os trunfos do seu lado voltando a Washington para influenciar Albright em meados de maio.
Não sei se abandonou o navio de propósito, mas escolheu justamente o período do ano em que os palestinos comemoram o luto da Naqba.
Enquanto os dois conversavam, na Cisjordânia e em Gaza a "passeata de um milhão de homens" acontecia no dia 15, aniversário de 50 anos da "Catástrofe".
A repressão foi sangrenta e desenfreada às passeatas que eram também de frustração pelos 14 meses de suspensão da implementação dos Acordos.
O dia terminou com dezenas de feridos e oito mortos. Mas Washington só parecia preocupada com eventuais retaliações do Hamas que prejudicassem a população israelense.
No dia 19 de maio Madeleine Albright foi a Londres encontrar Yasser Arafat sem levar-lhe nem promessas vagas. A reunião foi uma perda de tempo para ambos e ela voltou para casa convencida que Arafat era o mal encarnado, por não se conformar com sua proposta esquálida.
Vendo que os Estados Unidos se encontrava em um beco sem saída e que Tony Blair já era apenas um office boy da Casa Branca, a França e o Egito propuseram a mudança de intermediário em uma Conferência de Paz que os dois países organizariam de boa vontade. Porém, Netanyahu recusou a oferta de Jacques Chirac e Hosni Mubarak.
Tel Aviv não queria nada com o presidente da França, cuja simpatia pela "injustiça cometida contra os palestinos" era notória, mas não tinha nada contra o encontro de seu Ministro da Defesa Yitzhak Mordechai com Mubarak que, devido aos laços que unia o Egito aos EUA, não deixava de ser um precioso aliado no mundo árabe.
Diante da proliferação das invasões na Cisjordânia, no dia 11 de junho os palestinos voltaram a apelar para as Nações Unidas para que protegessem os sítios arqueológicos que Israel estava destruindo em Jerusalém Oriental para expandir as colônias.
Em vão.
Ao invés de interromper as obras controversas e ilegais Israel demoliu mais quatro casas pretextando que  não tinham autorização de Tel Aviv para estar onde estavam.
E para que suas intenções fossem claras, Netanyahu reafirmou que a paz jamais seria alcançada se os palestinos continuassem a reivindicar seus direitos sobre Jerusalém, inclusive a parte Oriental, embora tais direitos lhes tivessem sido outorgados pela própria ONU, que rege - ou deveria reger - as fronteiras planetárias.
E para unir ato à palavra, apesar das críticas da União Europeia e até dos Estados Unidos, Netanyahu decidiu incrementar o seu "super-município"' em Jerusalém no qual incluiu várias colônias da Cisjordânia, dobrando ilegalmente o território que a ONU destinara ao seu próprio Estado.
Do lado oriental da Linha Verde a crise político-administrativa só aumentava e Arafat voltou a trocar vários ministros inconformados com a perda crescente de território sem que Arafat conseguisse recuperar nada.

Enquanto a Autoridade Palestina se enredava, o sheik Ahmed Yassine, fundador do Hamas, que fora ao Cairo para tratamento de saúde, retornava a Gaza e Arafat gritava no vazio que os palestinos defenderiam Jerusalém dos planos expansionistas israelenses com unhas e dentes, se necessário.
Dentes de leite e unhas corroídas até a carne.
Consciente de sua supremacia bélica e da impunidade em que manobrava, a IDF começou o mês  de julho bloqueando, no dia 3, o trânsito dos moradores das cidades de Rafah e Gaza para não poderem se locomover dentro da Faixa de uma a outra cidade.
Os gazauís engoliram em seco, os compatriotas na Cisjordânia protestaram, a tensão aumentou nos dois lugares e em Tel Aviv a oposição começou a relamar que Netanyahu estava conduzindo o país a uma guerra de fato, chamou-o de mentiroso e ele foi perdendo a popularidade.
Nesse ínterim, a ONU decidiu no dia 08 de julho elevar o estatuto da Palestina na Organização, passando de "observador" a "membro sem direito de voto".
Os únicos votos contrários à decisão da Assembleia Geral foram dos Estados Unidos, de Israel e de dois outros membros inexpressivíssimos das Nações Unidas - Micronesia (107 mil habitantes) e Ilhas Marshall (63 mil habitantes), que têm fronteiras devidamente protegidas na Oceânia e gozam dos direitos que aos palestinos negavam.
Dando continuidade à política de proteção incondicional de Israel na ONU e da pressão sobre a Palestina para a segurança absoluta de Israel, Madeleine Albright seguiu a agenda que interessava os EUA e disse em alto e bom som no dia 10 de julho que os dois líderes tinham de encontrar-se para conversar.
Três dias mais tarde uma bomba explodiu na sede da OLP em Jerusalém Oriental deixando os palestinos ressabiados.
Quando Arafat voltou da China ficou sabendo que a responsabilidade pelo atentado não fora determinada e que os Estados Unidos haviam vetado outra Resolução da ONU condenando as invasões em Jerusalém - Netanyahu ousou dizer que seu projeto de expansão estava fora da jurisdição das Nações Unidas.  
Mas nesta altura das disputas Netanyahu não enganava mais nem seus compatriotas quanto mais os diplomatas estrangeiros.
O Knesset começou a discutir e a votar medidas para antecipar as eleições e o povo eleger um  primeiro ministro que os tirasse do impasse no qual o atual os colocara.
Netanyahu não se deu por achado. Atacou com a arma da desinformação que viraria sua marca registrada: "Proponho que os palestinos parem de usar a linguagem de ultimatum. As negociações estão progredindo com a boa vontade de Israel e quero acreditar que também dos palestinos."
Isto porque os representantes da AP que estavam negociando com os israelenses o Tratado, cansados de galgar obstáculos cada vez mais altos, haviam declarado que estavam perdendo tempo e que parariam os contatos se os negociadores israelenes não apresentassem ideias novas e produtivas.
Segundo eles, os enviados de Netanyahu batiam na mesma tecla que os palestinos tinham de renunciar a quase tudo se quisessem paz.
O pessimismo se espalhou pelos Territórios Ocupados e um cisjordaniano matou dois colonos para-militares de 18 e 24 anos que azucrinavam a vizinhança.
Netanyahu respondeu com um decreto que aprovava a construção de mais colônias.
Espremido contra a parede, Arafat voltou a mudar seu ministério e exprimiu sua impotência diante de parlamentares sul-africanos. "Israel desafiou a legitimidade internacional e as Resoluções da ONU abrindo a porta para o retorno da violência, anarquia, guerra e destruição. Cumprimos nossas obrigações, mas o primeiro ministro Binyamin Netanyahu deu as costas aos acordos de paz definidos em Madri e Oslo."

O Hamas estava relativamente controlado, mas atos isolados de revolta eram inevitáveis nas áreas em que a violência dos colonos era constante e não policiada.
Um hebronita esfaqueou o rabino Shlomo Raanan, neto do líder espiritual do movimento radical de colonização da Cisjordânia e pôs fogo na casa que o dito-cujo invadira e morava.
O ato individual gerou a já conhecida punição coletiva contra a população de Hebron inteira, com a  IDF bloqueando todas as vias entre as três zonas e de acesso à cidade. Os palestinos não podiam entrar nem sair de seus bairros nem do município, nem para atividades de primeira necessidade como fazer compras e ir trabalhar.
Netanyahu encurtou suas férias, deu carta branca à repressão, Arafat declarou que o primeiro ministro de Israel estava brincando com fogo na fogueira da ocupação, e no dia 27 de agosto, após uma longa trégua, uma bomba explodiu dentro de Tel Aviv ferindo 21 pessoas. O último atentado fora em março de 1997.
Nenhum grupo palestino de resistência reivindicou o ato, mas a explosão sacudiu os eleitores de Netanyahu, sensibilizou o lobby israelense em Washington e Dennis Ross voltou à carga.
Ross foi dizer para Arafat acalmar seus compatriotas e tentar convencer Netanyahu a devolver aos palestinos um pouquinho do território prometido por Rabin a fim de aplacar a frustração que se alastrava e levava a atos desesperados cuja consequência em Israel nenhum dos dois desejava.
Netanyahu preferiu dificultar a vida de Arafat aprovando o assassinato dos irmãos Imad e Adel Awadallah, dois responsáveis militares do Hamas.
Adel tinha 31 anos, era casado com quatro filhos, tinha estudado Matemática e Tecnologia na Universidade de Jerusalém e estava estudando Literatura árabe na Universidade de Belém quando foi fechada durante a Intifada. Imad era o caçula, também casado, com três filhos.
Os irmãos Awadallah eram ativos em Ramallah e al-Bera, na Cisjordânia, mas o crime repercutiu até na Faixa de Gaza.  
Cinco anos após o aperto de mão entre Arafat e Rabin que selava os Acordos de Oslo e a esperança de paz, o Hamas clamou vingança e em uma operação "preventiva" a IDF pôs as tropas em alerta, bloqueou toda a fronteira da Cisjordânia e da Faixa de Gaza, declarou estado de emergência e procedeu ao mesmo castigo de sempre invadindo residências, ocupando moradias, tornando a vida da população impossível.
Dennis Ross estendeu sua estadia e disse que estava determinado a acabar com os 19 meses de interrupção das negociações de paz.
Isto foi no dia 18 de setembro.
No dia 19, colonos israelenses na Cisjordânia balearam um adolescente palestino, mas a perspectiva da ida de Arafat à ONU fez com que os ânimos dos seus compatriotas não se exaltassem ao ponto do Hamas voltar a recorrer à reciprocidade da violência que lhes era infligida.
No dia 28 de setembro Yasser Arafat usou da palavra na Assembleia Geral das Nações Unidas de maneira comedida, pois prometera a Bill Clinton que não tocaria no assunto de reivindicar "unilateralmente" um Estado Palestino no an seguinte - data fixada nos Acordos de Oslo testemunhados em 1993 pelo próprio Bill Clinton, que já se esquecera que firmara tal compromisso.
O presidente dos EUA não queria irritar Binyamin Netanyahu para quem a reivindicação dos palestinos na ONU dos direitos adquiridos há cinco anos era inadmissível e inviabilizaria as discussões nascentes.
Yasser Arafat se comportou como Israel e os EUA exigiam e os mediadores marcaram data para concretizar um Acordo, enquanto na Galileia os residentes das duas maiores cidades palestinas - Umm al-Faham e Nazaré - faziam greve contra confisco de terra e a IDF usava da mesma força bruta à qual recorriam nos Territórios Ocupados - gás e balas de borracha à vontade.
Em Hebron os problemas só multiplicavam, com o mês de outubro começando com uma confrontação entre hebronitas e soldados, causada por ações dos vândalo-terroristas que estes protegiam. A cidade viveu mais um dos ciclos intermitentes de estado de sítio de comércio fechado, trânsito pedestre obstruído e proibição de locomoção dos hebronitas para o trabalho, compras e aulas. Só os colonos podiam sair às ruas e continuar suas agressões triviais.   
Como desgraça pouca é bobagem, Binyamin Netanyahu resolveu tornar a situação de Yasser Arafat ainda mais insustentável lhe dando um tapa na cara com a nomeação surpreendente para o Ministério das Relações Exteriores - o general Ariel Sharon, verdugo dos palestinos no massacre de Sabra e Shatila, em 1982 no Líbano.
Yasser Arafat engoliu o sapo, pediu para os camaradas do Fatah e do Hamas fazerem o mesmo, e foi para Washington para a reunião de cúpula ruminando o desaforo.

A filosofia dos Acordos de Oslo era que Yasser Arafat e Yitzhak Rabin construissem confiança mútua progressiva entre seus compatriotas que levasse à autonomia e ao reconhecimento natural do Estado da Palestina.
O assassinato de Rabin e a ambição expansionista de Binyamin Netanyahu em dois anos haviam destruído a ideia incial para provocar o inverso que seu predecessor previra - os dois povos estavam se afastando cada vez mais.
Este encontro marcado para o dia 15 de outubro nos Estados Unidos e com duração prevista de quatro dias, se destinava a remediar a situação clarificando as responsabilidades recíprocas estabelecidadas nos Acordos de Oslo II assinados em setembro de 1995.
Mas até para um observador sem grande acuidade mental e capacidade analítica era óbvio que todos estavam lá para agradar um Bill Clinton que queria deixar sua marca, mas cujo ego era mil vezes superior a lucidez e perspicácia.
Em vez de quatro, o presidente dos Estados Unidos demorou oito dias para arrancar de Netanyahu o mínimo que este não queria. E nos bastidores os estadunidenses não deixavam dúvida que temiam que o primeiro ministro israelense não cumprisse a palavra.

No dia 23 quando o Memorandum de Wye River foi assinado na presença do rei Hussein da Jordânia, talvez nem o progenitor estadunidense botasse fé no Acordo que parira. A não ser que fosse ainda mais ingênuo do que parecia.
A desconfiança que reinava entre os adversários era tamanha e o desrespeito de Netanyahu por Arafat era tão gritante que nenhuma cabeça lúcida acreditava que o primeiro ministro de Israel cumprisse as etapas às quais estava se engajando em Washington.
Aliás, os cortes e as colagens do texto final que foi aprovado transformaram o documento em um emaranhado de formulações ambiguas, cheias de buraco, em que tudo e nada era provável.
O Memorandum definia três fases de implementação de Oslo II, nas quais sobressaiam duas medidas que vinham sendo procrastinadas.
Primeiro o controle palestino total da Área A (definida em Oslo II); Área B, controle civil palestino e militar israelense; Área C, controle integral israelense.
Para viabilizar esta fase os israelenses teriam de transferir 1% de controle do território da Área C para a A e 12% para a B, 3% das quais os palestinos designariam reservas verdes e naturais. Os israelenses se comprometiam a manter a área C que continuaria sob seu controle temporariamente (por razões de segurança) como reserva natural.
Segundo, a abertura de um aeroporto palestino, sob controle israelense, nos Territórios Ocupados.
Terceiro, a libertaço de 750 prisioneiros políticos palestinos.

Os palestinos sairam de Washington preocupados com vários aspectos do Memorandum, sobretudo com os pontos que haviam motivado as negociações. Ou seja, a dimensão e prazo da implementação das fases de retirada civil e militar israelense dos Territórios Ocupados, e o mais importante, a potencial declaração unilateral de Estado em maio de 1999 quando vencia o prazo especificado na Declaração de Princípios de 1994.
Mas o pior das negociações de Wye River foi quão generoso foi Bill Clinton com Netanyahu em troca da assinatura deste no Memorandum que forçara, guela abaixo, aos dois líderes.
O presidente dos Estados Unidos concordou em fazer vista grossa à construção da controvertida colônia de Har Homa condenada pela ONU contanto que os israelenses parassem o lobby contra o veto presidencial à transferência da embaixada estadunidense para Jerusalém, prevista no Jerusalem Embassy Relocation Act de 1995. 
(Esta lei, aprovada no Congresso por maioria absoluta (Senado 93 votos contra 5, Câmara dos Deputados 347 contra 37), estipulava que a política oficial dos Estados Unidos em relação a Jerusalém era que Israel tinha direito de determinar sua própria capital; que os EUA tinham de reconhecer Jerusalém como capital de Israel; que Jerusalém não seria dividida; que os direitos de todos os grupos étnicos e religiosos tinham de ser protegidos; que a Embaixada dos Estados Unidos deveria ser estabelecida em Jerusalém o mais tardar no dia 31 de maio de 1999, data definida para a completação dos Acordos de Oslo.
Uma emenda ao Ato deu ao presidente o poder semestral de opor-se à mudança da Embaixada com o argumento de perigo para a segurança dos EUA.
(Desde 1995, tanto Clinton, quanto Bush e Obama vêm renovando o direito de veto por serem cientes que além do perigo, esta mudança interferiria no processo de negociações de paz.)

Voltando a Wye River, Clinton exprimiu desacordo na construção de novas colônias embora concordasse com a "acomodação de crescimento natural".
Com esta finta semântica obteve de Arafat a promessa de não declarar o Estado Palestino no dia 04 de maio de 1999 como os Acordos de Oslo permitiam.
E no final, os EUA aprovaram fundos para ambas as partes: U$1 bilhão para Israel, para "cobrir os custos de retirada da Cisjordânia"; U$300 mil para a Palestina, para "infraestrura econômica".
E como Bill Clinton é vaidoso mas não é bobo, sabia que o Memorandum estava longe de significar um acordo, queria gente sua no terreno e por isto introduziu na jogada um terceiro componente aos dois adversários - a Central Intelligence Agency.
A CIA foi nomeada para o "cargo" de monitor e árbitro de tudo o que se relacionasse a segurança e a contradições antecipadas das interpretações de israelenses e palestinos do que haviam assinado.
Em suma, os EUA se deram o direito de intervenção (secreta) unilateral enquanto negavam sistematicamente às Naçãos Unidas o direito de intervir legalmente no terreno como árbitro imparcial.

A trégua patrocinada por Bill Clinton não durou quase nada, só vinte dias.
Já no início de novembro, Netanyahu procrastinou a ratificação do recente Memorandum condicionando sua assinatura à prisão de trinta suspeitos de participação de atentados contra Israel e argumentando que Arafat não lhe transmitira segurança suficiente.
Seus compatriotas pagaram o pato em seguida, quando um carro explodiu perto do mercado de Jerusalém ferindo 21 pessoas e provocando a morte dos dois bomba-suicidas.
Uma reivindicação anônima emergiu em nome do Hamas, Arafat condenou o atentado, Netanyahu o culpou pela "má-vontade" e a resistência armada palestina justificou o atentado como "o único argumento que as autoridades de Tel Aviv respeitavam".
Deviam ter razão, pois apesar das retaliações da IDF, o Conselho de Estado Israelense resolveu aprovar o Memorandum com uma emenda que o anularia caso os palestinos declarassem um Estado e não tirassem de sua Carta a destruição do Estado de Israel.
O Knesset ratificou a firma no dia 18 (75 votos a favor, 19 contra e nove abstenções) para demonstrar boa-vontade e as negociações seguiram, com os EUA aumentando a verba israelense a U$1.2 bilhões para "cobrir os gastos de implementaçãos dos Acordos".
Para dar uma contrapartida visível ao dinheiro que os estadunidenses desembolsavam, no dia 20 a IDF começou a retirar tropas de 313 km² da Cisjordânia e o governo anunciou a libertação de 250 prisioneiros políticos.

No dia 24 de novembro um Yasser Arafat rindo até as orelhas inaugurou o Aeroporto Internacional de Gaza, louvado como um símbolo da soberania que almejavam.
Aviões egípcios, marroquinos, jordanianos e espanhóis aterrizaram no aeroporto que havia custado U$250 milhões, mas que para os palestinos valia trilhões, se fosse o caso, pois foi a primeira marca de autonomia em seu solo.
A festa foi bonita, o povo exultava de alegria, dançava ao som de uma banda que acolhia com risadas as aterrisagens nos três quilômetros de pista que abafavam o som dos instrumentos e da cantoria animada.
No dia 30 de novembro, representantes de cinquenta países reunidos em Washington prometeram U$3 bilhões à Autoridade Palestina para que esta pudesse financiar sua estrutura socio-administrativa, no dia 02 de dezembro em Assembleia Geral a ONU se comprometu a apoiar a implemenação do Memorandum, tudo parecia em bom andamento, apesar da reticência de Netanyahu a ceder terreno.
Porém, no dia 4 de dezembro Israel suspendeu a retirada que começara para justificar os milhões que embolsava com a desculpa do ataque de dois colonos e no dia 11 a Cisjordânia viveu uma greve geral para marcar o 11° aniversário do levante palestino contra a ocupação.
Bill Clinton, bem informado pela CIA, resolveu ir ao Oriente Médio dar um empurrãozinho na segunda fase do Memorandum - e lembrar Netanyahu que a primeira ainda não fora cumprida, considerou aterrizar em Gaza, mas a pedido de Netanyahu "a fim de não dar aos palestinos mais asas aos clamores de independência que o aeroporto lhes dava", desistiu e o Air Force 1 pousou em Tel Aviv no dia 12 de dezembro. Visitou o aeroporto de Gaza mais tarde.
No dia 14 o Parlamento palestino assinou por unanimidade a renúncia à destruição do Estado de Israel, removendo de sua carta o parágrafo contencioso desde 1964, conforme Clinton pedira para facilitar o Encontro de três dias programado para apaziguar as acusações mútuas de violação dos Acordos.
Mas a alegria de Clinton foi curta. No dia seguinte constatou que não conseguirira convencer Netanyahu a prosseguir a retirada combinada, mas para não perder a face disse que sua viagem de três dias fora um sucesso.
Sua conselheira em segurança nacional foi mais realista quando retificou a frase de Clinton de ter posto o processo de paz de volta no caminho. É um caminho esburacado, disse.
Esburacadíssimo, os repórters concordariam. Pois nem bem uma semana tinha passado quando o Knesset suspendeu a implementação da retirada das tropas conforme o Memorandum mandava, culpando os palestinos. E aprovou no mesmo dia uma Lei antecipando as eleições para o dia 17 de maio de 1999, seguindo uma resolução de desaprovação da política do primeiro ministro Binyamin Netanyahu.

O ano de 1999 começou mal, como sempre, por causa de Hebron.
Um palestino foi morto por soldados, temendo represálias a IDF declarou estado de sítio previsto para uma semana, mas constantemente renovado. As confrontações lá não paravam e em Jerusalém um judeu extremista continuava a esfaquear nativos aumentando sua lista para nove palestinos sem que a polícia israelense tomasse as providências necessárias, a IDF continuava a desapropriar famílias da noite para o dia com os buldozers caterpillars que as deixavam sem domicílio e sem os pertences que eram soterrados como se não valessem nada, e uma ou outra bala de borracha matava algumas das dezenas de crianças, adolescentes e adultos feridos em manifestações de força dos soldados.
Enquanto o caos aumentava, Binyamin Netanyahu lutava e conseguia a nominação à candidatura a primeiro ministro pelo Likud contra o candidato do Parto Trabalhista Ehud Barak.
Fevereiro começou e terminou sem nenhum progresso nas promessas feitas em Wye River. Os 750 prisioneiros políticos continuavam na cadeia, nenhuma estrada fora aberta entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza e a retirada militar israelense dos Territórios Ocupados era nula, enquanto as colônias em vez de pararem, aumentavam.
No dia 10 de fevereiro a ONU aprovou uma outra Resolução por 115 votos contra 2 contrários - dos EUA e Israel - convocando os assinantes da Convenção de Geneva de 1949 a uma convenção para considerar medidas que parassem as atividades coloniais ilegais de Israel na Cisjordânia que violavam os Acordos de Paz.
A única novidade foi a morte do rei Hussein da Jordânia, cujo funeral no dia 8 proporcionou o encontro "casual" do palestino Nayef Hawatmeh e o israelense Ezer Weizman, que apertaram as mãos estendidas, e o encontro de Yasser Arafat com o papa João Paulo II no dia 19, a quem fez o convite de visita a Belém em 2000, para o Milênio.

O mês de março foi de campanha eleitoral em que Netanyahu prometia aos colonos expansão em troca de votos e Ehud Barack prometia paz.
Teria sido corriqueiro se o ministro das relações exteriores Ariel Sharon não tivesse começado a mostrar as garras. No dia 15 considerou Nula a Resolução das Nações Unidas de 1947 de internacionalizar Jerusalém.
Diplomatas estrangeiros contra-atacaram no dia 18 encontrando Yasser Arafat em Jerusalém Oriental apesar das intenções frustradas de Netanyahu de evitar a reunião, que aliás rendeu frutos, pois quatro dias mais tarde, em Washington, Arafat  pediu para Madeleine Albright formalizar sua proposta de adiamento da declaração palestina de Estado em um documento que estabelecesse outro prazo para um acordo final de paz.
Albright não formalizou nada e ficou com mais raiva do líder palestino por ousar exigir que os EUA quebrassem por escrito a palavra dada.
No canto do cisne, Netanyahu continou a minar as bases de Arafat fechando seus escritórios em Jerusalém Oriental, inclusive a Agência de notícias oficial da Autoridade Palestina, embora não tivesse jurisdição nenhuma sobre esta parte da cidade.
Os protestos dos jovens contra o confisco de terras continuou na Cisjordânia em que as moradias dos nativos continuavam a ser derrubadas para abrir caminho para as colônias.

Abril começou com uma piada. Ariel Sharon foi a Washington conversar com Madeleine Albright sobre o processo de paz enquanto o primeiro ministro japonês insistia com Yasser Arafat em nome de Washington a não declarar o Estado da Palestina na data marcada do dia 4 de maio.
Israel continuou suas operações militares no sul do Líbano, bombardeando e anunciando a captura da cidade de Arnun, e o secretário de gabinete de Arafat Ahmad Abdul-Rahman reiterou o pedido aos Estados Unidos de garantir apoio escrito a um Estado palestino em troca do adiamento do prazo de declaração unilateral de Estado, em vão.
Para evitar novas reuniões internacionais que o embaraçasse, Netanyahu arrematou a caça às bruxas fechando a sede tradicional da OLP em Jerusalém, a Casa Oriental que passara a sediar a  Autoridade Palestina e que acolhia as reuniões diplomáticas.
Alguns diplomatas ocidentais reclamaram, mas tudo terminaria em pizza. Até hoje os palestinos lutam para que ela reviva.
E a vitória de Albright, Ross, Clinton e Netanyahu foi completa quando o Conselho palestino decidiu no dia 28 de abril, em uma demonstração de boa vontade que custaria caro a Arafat, adiar a declaração de Estado prevista nos Acordos de Oslo.

Maio chegou e com ele o prazo dado em Oslo para concretização dos Acordos que culminariam com o Estado da Palestina. O dia 04 passou sem alarde.
No dia 17 de maio o candidato do Partido Trabalhista Ehud Barak alcançou vitória esmagadora sobre Binyamin Netanyahu no pleito antecipado.
Em seu discurso na praça Rabin em Tel Aviv, prometeu retirar as tropas do Líbano em um ano, curar as divisões entre os israelenses e um acordo de paz com os palestinos.
A esperança que plantou não chegaria nem ao caule. Ele a mataria no coleto do pragmastimo das vitórias imediatas.
Mas é outra parte da história.

Binyamin Netanyahu, em uma vídeo-pirata de 2001:
"They asked me before the election if I'd honor [the Oslo accords]... I said I would, but [that] I'm going to interpret the accords in such a way that would allow me to put an end to this galloping forward to the '67 borders. How did we do it? Nobody said what defined military zones were. Defined military zones are security zones; as far as I'm concerned, the entire Jordan Valley is a defined military zone. Go argue."
Em seguida Netanyahu explica que condicionou a assinatura dos Acordos de Hebron em 1997, com o consentimento dos Estados Unidos, a que não houvesse nenhuma retirada de localidades militares que ele mesmo especificasse como tal - como o Vale do Jordão.
"Why is that important? Because from that moment on I stopped the Oslo Accords."


Reservista da IDF, Forças israelenses de ocupação,
Shovrim Shtika - Breaking the Silence
 
Global BdS Movement: http://www.bdsmovement.net/



Postscriptum atualidade
No dia 07 de maio houve uma passeata geral dos palestinos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza para chamar a atenção para a greve de fome que centenas de compatriota estão fazendo nas masmorras israelenses.
As condições de prisão em Israel são uma preocupação constante para todos os palestinos que crescem nos Territórios Ocupados, pois sabem que todos os dias correm risco de prisão aleatória em um checkpoint ou em casa e que a partir dos 12 anos pode parar no mesmo lugar sem saber porquê nem quando e se voltará para casa.
Neste mesmo dia 7 de maio a Europa democrática celebrava o armistício da Segunda Guerra Mundial que deu cabo de Hitler, Mussolini, e deveria ter dado cabo do nazismo, do fascismo e de atos inadmissíveis decorrentes destas duas ideologias calcadas em superioridade étnica, repressão de opinião contrária, opressão dos que não enquadram em desígnio próprio, expansão territorial a fim de impor seu domínio e extinguir outros povos, chauvinismo exacerbado à potência máxima da supremacia racial.
Ideologia que concebe o inconcebível, tais como prisões sem motivo e sem delito definido, em que a simples razão de existir constitue crime de lesa majestade que prescinde de formalidades jurídicas básicas para o detento ser punido; torturas variadas pelo simples prazer de emoções fortes ou por desprezar tanto o prisioneiro que o ato ignóbil de supliciar é tido como brinquedo; mordaça da imprensa e das consciências sob pena de vilipêndio e calúnia de quem fizer denúncia; e aparelho de informação desvirtuada, deformada, falsa, que induza o público a admitir e às vezes inclusive abraçar suas ações indefensáveis.
Tal ideologia nunca mais?!
Quem dera!
Se o algoz de hoje tiver sido a vítima de outrora, nada escandaliza e tudo é permitido.
Até o silêncio cúmplice da imprensa e a vista grossa das Nações Unidas.
Onde e quando no mundo mais cerca de 2.000 prisioneiros de guerra (?) políticos (?) (o número aumenta todos os dias) estariam em greve de fome por mais de 75 dias sem que isto virasse manchete de jornal e escândalo planetário?
Até se os prisioneiros fossem de uma ilha perdida na Oceânia, mas com sede na ONU, uma greve de fome legítima ou ilegítima seria notícia.
(Carandirú apareceu em todas as televisões do mundo...)
Mas sendo os prisioneiros em questão palestinos, não tem importância nem relevância alguma.
De tanto ouvirem os israelenses tratarem os palestinos de e como animais, talvez os repórteres já acreditem que este povo não seja humano como os demais.
Por que estas centenas de homens, mulheres e adolescentes enjaulados em presídio israelense estão em greve de fome, que é o recurso desesperado pelo dano que o grevista faz a si mesmo?
A greve é pelo mínimo devido a um prisioneiro em uma sociedade civilizada - tratamento humano e direito de julgamento.
É por isto que os grevistas palestinos estão definhando dia a dia (vários já foram postos sob controle médico) tentando sensibilizar o mundo que nem lhes dá bola porque os jornais não veiculam esta notícia, péssima, mas notícia que os milhões de leitores e telespectadores do planeta merecem receber, mesmo que a causa palestina seja indiferente à maioria (que vive naquela premissa do "enquanto não for comigo, a injusça pode correr solta que não ligo").
Neste caso não é mais nem questão de tomar partido pela justiça. É a simples questão de exercer o ofício informativo de jornalista.
O único caso semelhante ao dos palestinos na história contemporânea foi, em menor escala mas com igual relevância, o dos prisioneiros políticos irlandeses nos presídios britânicos, retratado no filme Hunger de Steve Mcqueen* (abaixo na íntegra).
A ONU monitorada homem a homem por Obama vira o holofote para Assad e a Síria para deixar os israelenses tranquilos para cometer qualquer crime.
Aliás, Netanyahu está seguríssimo de si e do apoio incondicional de Barack Obama - pelo menos até ser reeleito com o apoio da APAIC (lobby israelense em Washington), pois o último encontro entre os dois homens foi o primeiro da história do Estado de Israel em que o presidente dos Estados Unidos nem toca no assunto da Palestina.
Como se a ocupação tivesse acabado, as colônias na Cisjordânia tivessem sido desmanteladas, o Vale do Jordão tivesse sido devolvido aos devidos proprietários, a IDF estivesse com todos os seus soldados do lado ocidental da Linha Verde, os palestinos tivessem recuperado o direito de consumir sua própria água, a Faixa de Gaza estivesse aberta ao trânsito de pessoas e bens básicos de consumo,  as centenas de prisioneiros palestinos estivessem de volta ao lar, os checkpoints tivessem desaparecido do mapa e os muros estivessem em migalhas.
Mas não.
Até esta manhã, no domingo que precede a celebração da Naqba, o status quo era o mesmo e as colônias se expandem de semana a semana como se não fossem invasões e sim construções legais, na indiferença internacional.
Lembro-me que até 2005 ouvia sem parar o argumento que se os palestinos cessassem a resistência armada, ou seja, as bombas-suicidas que explodiam em Israel com estardalhaço, o mundo os ouviria como ouviu Ghandi.
Foi o que fizeram. Mudou algo na concepção das pessoas que repetiam a lenga lenga acima que a violência provocava antipatia?
Os atentados pararam há mais de seis anos, as colônias continuam se expandindo em vez de serem desmanteladas, a situação dos palestinos está tão ruim ou pior do que antes, e a violência de Israel até aumentou; angariando agravo apenas das pessoas bem-informadas que pressionam seus governos e exercem o direito de boicote não comprando produtos israelenses nem de empresas estrangeiras que financiam as invasões que a nossa imprensa chama inclusive de assentamento, que, segundo o Aurélio, indica "algo colocado em seu devido lugar"... Certamente uma tradução apressada do termo errôneo gringo settlement. Deixa pra lá.
O que é mesmo que o mundo está esperando para agir contra esta aberração contemporânea?
Que as bombas voltem a explodir em Tel Aviv para lembrar-se que os palestinos existem e chorar um punhado de mortos e feridos israelenses traumatizados com o atentado, esquecendo as centenas e milhares de vítimas palestinas que padecem da ocupação vivendo traumas quotidianos inimagináveis como ocupados e apátridas há 64 anos?
Durante este período, mais de 250 mil palestinos - de 12 a 70 anos - já foram detidos em prisões israelenses por períodos curtos (seis meses) ou longos, de anos. Todos devidamente humilhados e muitos deles torturados e sem que o "crime" cometido seja discriminado e sem direito a serem julgados.
O Hamas já avisou Israel que se os cadáveres de seus compatriotas começarem a empilhar, a trégua da resistência pacífica através do boicote pode acabar.
"O muro é uma miragem securitária. Só concretiza o apartheid. Não impede nenhum atentado," diz um observador internacional. "Se o Hamas quisesse e quiser voltar o relógio a sete anos atrás, Tel Aviv vai voltar a viver em sobressalto e experimentar na rua o medo que os palestinos sentem dia e noite até dentro de casa. Aí vão lembrar que os "animais" ainda não foram todos exterminados e que jamais abandonarão a terra de seus ancestrais."

 Crianças presas
 Soldado da IDF humilhando uma prisioneira de mãos e pés atados  
 Filhos de prisioneiros

*Filme HUNGER, de Steve McQueen,
com Michael Fassbender no papel do irlandês Bobby Sands


Nenhum comentário:

Postar um comentário