domingo, 24 de novembro de 2013

SOS gazauí: Ditadura egípcia nocauteia Gaza




No mês de novembro, os gazauís celebraram o aniversário do bombardeio israelense do ano passado (Blog 18/11/12) com uma grande passeata em Gaza.
Binyamin Netanyahu também celebrou à sua maneira. Foi visitar um batalhão da IDF estacionado na fronteira e disse que a Operação Pillar of Defense, como os israelenses batizaram o bombardeio, foi um sucesso. Entre outras coisas, seu comunicado de imprensa (acredite quem quiser) dizia que "In the end, this deterrence is achieved by the enemy's knowing that we will not tolerate attacks on our communities and our soldiers, and that we will respond in great strength. This is the foundation of our deterrence."
Ahmed Jamal al-Dalu, um gazauí cuja casa foi bombardeada durante a Pillar of Defense, e que perdeu em seu lar dez membros de sua família no mesmo dia, na mesma hora, no mesmo lugar em que uma das centenas de bombas foram jogadas, suspira e diz que "After one year that this happened, nothing [has] changed in Gaza for us, for our family. Nothing [has] changed. The situation is getting worse - not for us only, but all the Palestinian people."

Embora tenha vivido tempos áureos na antiguidade, desde a vitória traíra de David sobre Golias a Faixa de Gaza é famigerada na desgraça.
Parece que os gazauís dos séculos XX e XXI veem pagando por tudo o que os seus antepassados poderosos tiverem feito de errado quando os Filistinos dominavam a região com sua Pentápolis. Há mais quatro mil anos.
Sua história data de 3.300 anos Antes de Cristo, da Idade do Bronze.
A grande Pentápolis, que se estendia às cinco metrópolis filistinas - Ashdod, Ashkelon, Ekron, Gath e Gaza - pelas quais seu líder Golias enfrentou David para salvar seus concidadãos, é mais recente. Data de mais ou menos 12 séculos AC.
Já falei sobre isso tudo neste blog (12/02/2012). Da História Antiga e à contemporânea que venho abordando há três anos. Mas cada vez que Gaza é chicoteada com uma nova tragédia, uma nova ameaça, a história emerge como se tivesse sido anteontem que os israelitas chegaram à Palestina convencidos que era a Terra Prometida. Que David então matou Golias após um gesto traíra, que os filistinos sobreviventes ao massacre que seguiu a derrota de seu líder se refugiaram na Faixa, que recuperaram sua terra mil anos mais tarde com a queda do templo de Jérusalem e a emigração israelita, que voltaram a refugiar-se na Faixa após novo massacre em 1948, que foram ocupados após a famigerada Guerra dos Seis Dias em 1967, e que desde então têm sido paulatinamente despojados de tudo, até da dignidade que dá ao homem, à mulher, o estatuto humano de verdade.

Volto à carga em favor de Gaza porque quando Morsi foi eleito à Presidência do Egito no ano passado, ficou claro que o bloqueio israelense estava ficando obsoleto e abstrato. O Hamas tem boas relações com a Irmandade Muçulmana e Morsi ousara tomar partido pelos palestinos, ao contrário do governo do deposto Hosni Mubarack que pactuava com Israel e obedecia os Estados Unidos à risca a fim de perpetuar-se.
Durante o período pós-revolucionário a fronteira foi aberta mais amiúde para o comércio e para busca de assistência médica, e os túneis foram tolerados.
Os gazauís renasceram com produtos alimentícios nas prateleitas dos supermercados, com água menos regrada, com materiais de construção para reerguer as casas, hospitais, repartições públicas destruídas pelos mísseis do ocupante. Encontrava-se remédios nas farmácias, tratamento possível nos hospitais também abastecidos com o mínimo.
Israel começou a reclamar da perda da margem de manobra com o Hamas, Washington solidarizou-se com o apelo do afilhado, telefonemas foram dados, pressões vingaram, veio o Golpe Militar, e, de repente, dir-se-ia que o Golpe foi feito para atender as lamúrias de Binyamin Netanyahu e não os revolucionários.
É o que acontece nesses casos.
Uma das primeiras medidas do general egípcio golpista foi voltar a estrangular a Faixa de Gaza. Fechou fronteira, bloqueou os túneis que alimentam os gazauís, fez tudo o que podia para ajudar o bloqueio de todos os gêneros que Israel impõe desde 2006.
A bonança precária acabou. A situação voltou a ser dramática.
As prateleiras dos supermercados voltaram a esvaziar-se, a água potável voltou a ser a raridade turva fornecida a preço de ouro pelos tanques israelenses (que a tiram da própria terra palestina, na Cisjordânia para vender na Faixa...), as contruções pararam, os carros ficaram sem gasolina, enfim, a carência voltou à pauta.
51% da população da Faixa de Gaza (1 milhão e 640 mil habitantes) têm menos de 17 anos. 30%, menos de 29 anos. Ou seja, apenas 312 mil gazauís têm mais de 30 anos.
Confinados nesse território exíguo de 41 quilômetros de comprimento por seis a doze de largura, os gazauís continuam resistindo como podem. Sonham com a liberdade, e dizem que não adianta esfomeá-los, humilhá-los, bombardeá-los, matar quantas crianças quiserem, com balas ou de doenças causadas por subnutrição e água contaminada. "Resistiremos porque a terra é nossas há milhares de anos e é a única pátria que temos," respondem os gazauís de oito a oitenta anos.
Eu poderia relatar varias histórias individuais e coletivas para ilustrar o que acontece na Faixa. Porém, acho melhor deixar falar as imagens abaixo.
Mas antes vou pronunciar a frase que incomoda os sionistas extremistas e seus injustos cupinchas. Todos os problemas que o Ocidente tem com os árabes resume-se em duas palavras recheadas: Ocupação (civil e militar) da Cisjordânia e da Faixa de Gaza.
(Não é que os palestinos se metam em terrorismo internacional ou incitem o mesmo. Muito pelo contrário. É que as populações árabes "normais" ficam tão revoltados com a situação da Palestina (não são os únicos) que acabam (alguns) desculpando os extremistas e às vezes até achando que o discurso deles tem fundamento, embora esses Al Qaedas que semeiam medo e morte não pensem nem um pouco em justiça social e quanto menos nos pobres mortais, qualquer que seja a religião destes.)
A injustiça na Palestina em geral e na Faixa de Gaza em particular é grande demais para ser digerida sem o sapo entalar, sufocar, e como dizia o grande Gonzaguinha, o coração explodir de indignação e quem tem boca, reclamar.

Documentário da Channel 4, de Sandra Jordan (maio de 2003)
 Gaza : The Killing Zone (trailer de 10')
Para assistir ao documentário completo: https://archive.org/details/KillingZone

Falando nos túneis, o general Sissi, golpista do Egito, os visou desde a primeira semana no poder. Seus soldados os bloquearam e de repente, Gaza foi imobilizada.
Ruas movimentadas ficaram pacatas, mais de 20 mil operários de construção perderam o emprego em uma semana, o comércio voltou a marasmo.
Até o dia 03 de julho, havia cerca de mil túneis em funcionamento entre a Faixa e o Egito. Eles empregavam sete mil pessoas na cadeia comercial do transporte até o local em que a mercadoria é apresentada ao consumidor para ser comprada.
Nos últimos seis anos, os túneis têm sido o oxigênio das centenas de milhares de gazauís, espremidos nos 365 km², que precisam deles para obter gêneros alimentícios e outros produtos necessários. Sem contar os materiais de construção para reerguer o que os mísseis e os bulldozers israelenses destroem regularmente.
Desde o Golpe de Sissi, o Egito destruiu ou bloqueou mais de 80% dos túneis.
Parecia até que o golpe fora também para isso. Para voltar a asfixiar os gazauís e o Hamas.
O comércio dos túneis é regulamentado pelo Hamas e o "negócio" é devidamente fiscalizado e impostos são cobrados e pagos.
Eles representam cerca de 40% da renda do governo local que é revertida em bens públicos.
No início de setembro, o ministro da Economia da Faixa, Alaa al-Rafati, disse que "The Gaza Strip has lost around $225m during the past month due to the halt of imports, namely fuel and crude materials for construction, such as cement, gravel and steel."
Milhares de trabalhadores da construção civil foram demitidos porque as obras tiveram de ser interrompidas - Israel só permite a entrada na Faixa de pequenas quantidas de material e apenas para projetos de reconstrução da iniciativa da ONU.
O resto entra pelos túneis. Pois os palestinos estão sob as garras de Israel inclusive para bens como a gasolina, que lhes é vendida a preço exorbitante, considerando os meios escassos dos gazauís. A gasolina levada através dos túneis custa a metade do preço da que é vendida pelos ocupantes.
Os preços de produtos de primeira necessidade, inclusive a cesta básica local, multiplicaram de maneira astronômica.
Segundo Gisha, uma ONG israelense que monitora o movimento de pessoas e produtos para dentro e fora de Gaza, só o preço do cimento aumentou mais de 60% e continua subindo.
Chris Gunnes, da agência da ONU para refugiados (UNRWA), declarou consternado que "The closure of Rafah comes after years of blockade, which have seen an appalling decline in the conditions in Gaza, taking its brutal toll on the population, more than half of whom are children. The restrictions amount to a collective punishment which is illegal under international law."
Um diplomata ocidental defendeu os interesses obscuros estrangeiros aos quais o general Sissi servia fechando os túneis dizendo que "Egypt is in a quandary – it doesn't want to punish Gaza by closing the tunnels, but it needs to secure Sinai.
Esta é a resposta oficial.
Alguns diplomatas estrangeiros menos partidários do asfixiamento da Cisjordânia e da Faixa de Gaza estiveram na Palestina para avaliar os efeitos funestos da ocupação e do fechamento dos túneis.
Pareciam impressionados com a situação lamentável. Foram embora. Falaram com Sissi? Pressionaram Obama e Netanyahu de alguma forma?
Se tiverem falado ninguém reagiu (ainda?) a favor dos ocupados.

Documentário Journeyman: Abu Jamil Street 

Agora vamos à pesca, que em Gaza, é tradicional, antiga, e essencial. Uma profissão transmitida de geração a geração. Os filhos aprendem com os pais e continuam a alimentar suas famílias como fizeram seus avós, bisavós, enfim, em dezenas de séculos passados.
Os Acordos de Oslo assinados em 1993 entre Israel e a OLP (Organização pela Libertação da Palestina) - representados por Yitzhak Rabin e Yasser Arafat - autorizava aos pescadores 20 milhas náuticas (cerca de 37 km). Em 2006 a área de pesca foi reduzida a 3 milhas (cerca de 5.5 km).
Hoje, inclusive dentro destes 5.5 quilômetros a que foram reduzidos, os pescadores continuam sendo atacados, maltratados, e privados do ganha pão quotidiano.
Todos os dias um deles volta para casa morto ou ferido pelos soldados da IDF que os policiam.
A IDF justifica o policiamento violento com os mesmos argumentos que usa para destruir os túneis entre a Faixa e o Egito. Diz que é para evitar o tráfico de armas. Porém, nenhum barco de pescador revistado durante as décadas de ocupação continha nenhum material alheio à pesca.
Os soldados detêm os barcos e fazem a revista como nas casas de família. Invasiva, agressiva, danosa e daninha.
Começam atacando os barcos com jatos d'água. Quando os pescadores se rendem, são obrigados a despir-se e jogar-se no mar, qualquer que seja a estação do ano e a temperatura da água.
Depois, são "pescados" pelo navio que os ataca, são algemados e levados a um porto israelense.
Às vezes, dependendo do comandante encarrregado da "operação", os pescadores são obrigados a nadar até a praia. (As fantasias dos militares israelenses são variadas. Tanto na Cisjordânia quanto na Faixa. Às vezes lembram a personagem do Ralph Fienes no filme A Lista de Schindler.)
Ao chegar à praia, são cercados de soldados que os trancam em uma célula metálica. Depois são interrogados como de praxe. 
Os feridos durante a "operação" de abordagem pirata não recebem atendimento médico imediato. Com sorte, são examinados no mínimo 10 horas mais tarde. 
A maioria dos detidos são soltos dois ou três dias após o sequestro. São deixados no Checkpoint Erez, na entrada da Faixa. São despojados de tudo o que carregavam, inclusive carteira com dinheiro e documentos.
Mesmo estando feridos, têm de virar-se para chegar em casa.
O barco do pescador com todo equipamento - motor, redes, etc. - é confiscado pelos israelenses que nunca os devolvem e riem na cara do proprietário quando este ameaça denunciar a pirataria militar e processá-los por roubo.
O pescador perde então seu meio de subsistência e milhares de euros de equipamento que ele tem de se virar para voltar a comprar inteiramente. A fim de assegurar o ganha pão de no mínimo dez pessoas que dependem dele.
Aí entra na roda-viva de centenas de colegas que sofreram o mesmo tratamento. 
O porquê dos interrogatórios é a tática de aterrorizar para oprimir melhor e sempre.
As "sessões" de interrogatórios, sobretudo dos jovens, visam "quebrar" o interrogado e forçá-lo com chantagem ou alguma magra vantagem à traição, a espionar os compatriotas para o Shin Bet.
(Médicos israelenses denunciaram há alguns meses outro tipo de chantagem que Israel faz com as famílias gazauís para que traiam a Palestina. A chantagem é simples. Quem precisar levar para fora um familiar com doença grave que necessita tratamento inacessível na Faixa, tem de transformar-se em espião do Shin Bet/ Shabak. A escolha draconiana é inclemente: trair, espionar, ser responsável pela morte de um compatriota e colaborar com o ocupante ou deixar morrer pai, mãe, irmão, filha ou filho.)
Voltando aos pescadores, o bloqueio tem um impácto negativíssimo não só na vida dos 3.700 pescadores oficiais da Faixa como também na de70 mil pessoas que dependem deles.
Para completar a arbitrariedade, os israelensem impuseram restrição à potência dos motores a menos de 25 cavalos. Portanto, o trabalho no mar fica ainda mais perigoso devido à fragilidade da embarcação.
Trabalho de pescador já é difícil. Dos pescadores gazauís é uma via crucis a cada saída do barco.
Os israelenses usam esta tática porque peixes, crustáceos, são a fonte principal de alimentação na Faixa desde a Idade do Ferro. Hoje, para alimentar-se de maneira conveniente, os que podem têm de comprar peixe "importado" do Egito através dos túneis, como os demais alimentos e produtos de primeira necessidade - inclusive papel-higiênico, que também faz parte dos produtos "perigosos" proibidos de entrada na Faixa.
A subnutrição na Faixa é impressionante. Além das doenças causadas por água insalubre, tem a carência de gêneros alimentícios de base importantes para os adultos e mais ainda para as crianças.
Com o bloqueio inclemente, sem os túneis os gazauís estariam(rão) exangues e moribundos. É esta a meta dos governos de Israel e dos Estados Unidos?

"We Wake up [in Gaza Strip] to terrifying sonic booms and try to sleep while the Israeli navy is shelling. Simple things like daily running water and a full day of electricity have now become luxuries. Nearly four weeks ago the sole power generator in Gaza stopped working due to lack of fuel. We had become used to the eight hours of electricity we were allotted but now we are down to four to six hours at a time and lengthy 12-14 hour blackouts.
At any given moment at least one-third of Gaza will be in the dark. During the long days of summer it is much easier to cope but now the days are much shorter and it seems most of our time is spent in the dark. Students study by candlelight and women cook by flashlight. Men gather on the balconies to smoke and talk politics – the only light that can be seen are the small red dots of their glowing cigarettes.
Some families are able to afford a converter than runs on a car battery and can power a few small items. The cost for the unit is about 700 shekels (£120) and the batteries cost another 700 shekels. This might not seem like much but even that is out of reach for a majority of families especially now the unemployment rate is nearly 40 per cent. Stores, restaurants and larger apartment buildings often use gas generators. These days, however, it is nearly impossible to get fuel and queues are very long with some people waiting 24 hours just for a few litres.
Drivers are feeling the shortage and finding a taxi is impossible at times. Yet everyone knows how hard it is and we try to help each other as much as possible. People pile as many in as can fit in a car, sometimes sitting on laps, just to make sure others can get to their homes. It is not uncommon to see three or even four people squeezed into the front seat of a taxi going from Gaza City to the refugee camps in the middle of Gaza. Some cars are now running on a mixture of cooking oils and the smell of falafel and French fries trails after them. Cooking gas supply runs low every winter but this year it is the worst shortage in a long time. An average family goes through one 12kg gas cylinder a month and it costs 65 shekels. It takes more than a month to get a refill. Neighbours are helping each other and women rotate cooking duties to save gas-cooking large meals for multiple families at one time.
Others less fortunate are resorting to cooking over open fires outside, burning paper and cardboard as fuel. I am constantly worried what will happen when the cold and wet weather arrives next month.  Rubbish collection has nearly stopped in the densely populated city. Swarms of flies, wild cats and dogs hover around the rubbish piles. In an attempt to help alleviate the situation, donkey carts have now been deployed to collect what they can. So far it is not making a dent. 
Two weeks ago the sewage pumping stations stopped working in many areas – they simply did not have the fuel to work. Raw sewage leaks into the streets. Fathers carry their children to get to school and most cars won’t venture into it. The sludge reeks and brings mosquitoes in swarms.
There is fear it will end up in the water supply as well. The Al-Shati refugee camp, also known as Beach camp, has reported foul smelling and discoloured water this week and many have fallen ill with stomach maladies already. My area has been lucky so far, no sewage in the streets but unfortunately we don’t have any water at all.
As I write this we are beginning the fourth day with dry taps. With the erratic electricity schedule the water pumping station is rarely working when my building has electricity so even when there is water in the lines there is no way to get it up to the flats. Before the fuel crisis we only received water from the municipal lines three or four times a week, now it is half of that if we are lucky. We fill old bottles when we do have water.
This is life in Gaza now: a constant struggle to find the bare necessities. Gaza life is about always being prepared for the worst case scenario because normally that is what happens. It has been a year since the last major Israeli aggression here and we are trying to pick up the pieces. Constructions materials are now refused entry so repairs have ground to a halt.
Our life lines – the tunnels from Egypt – have been severed. Without them we don’t have a consistent flow of food, medicine and fuel. The border with Israel is often closed and only half of the needed trucks of aid are allowed in when it is open. The items on the market shelves are withering away and prices are getting higher and higher.
Sometimes I think someone has hit the pause button on life but then I see all that we have survived and realise we continue on just as before: couples get married, babies are born and children go to school. We laugh with our friends, we love each other and, most importantly, we live."
Sally Idwedar, residente de Gaza 

Documentário Doors to the Sea: Gaza's Fishers Under Siege (23')

Gaza Fishermen under siege (6')

Gaza Fishermen, testimonies from the siege (13')



 


domingo, 17 de novembro de 2013

Israel vs Palestina: História de um conflito XLIV (07-2004)



No dia 01 de julho de 2004 as Forças israelenses de ocupação invadiram Jericó e Nablus e impuseram em ambas cidades cisjordanianas toque de recolher e estado de sítio.
Na Faixa de Gaza o sítio de Beit Hanun continuava agoniando as famílias. As condições de vida da população se agravava dia a dia. Os caterpillars armados da IDF "desapropriavam" - ou seja, esmagavam residências, oliveirais, lavouras - em um perímetro de cinco quilômetros de "security zone" no qual deixavam famílias desabrigadas e agricultores despojados da fonte de sustento familiar.
Nesse ínterim, outros soldados da IDF matavam um menino de 9 anos em Rafah, aumentando para três o número de assassinados nas últimas 24 horas.
No dia 02 a IDF retirou-se de Rafah pondo um fim passageiro a dois dias de ataques à cidade.
O pretexto para invadir Rafah, agredir e humilhar adultos e crianças era sempre o mesmo, a procura de resistentes e armas. Só que 95 por cento das vezes as tropas israelenses saíam de mãos vazias e o sangue que derramavam era de civis, pais de família, meninos que estavam no lugar errado, que na Palestina é brincando na rua, indo para a escola, quando os soldados investiam o bairro em que moravam ou estudavam.
Os dias seguintes foram repetitivos para a IDF e para suas vítimas.
Os soldados investiam uma ou outra cidade nos territórios ocupados e impunham o terror quotidiano para o qual foram treinados.
O professor de engenharia elétrica da Universidade Al Najah, Dr. Khaled Salah de 52 anos e o filho Mohammed de 16 foram dois dos assassinados em Nablus nesse período.
Enquanto seu Exército agia nos territórios ocupados, Ariel Sharon começava no dia 8 conversas com o Partido Trabalhista para convencê-lo a aderir a um governo de união, o que não tardaria. Shimon Peres estava prontinho para virar a casaca, esquecer os ideais de Yitzak Rabin e trocar de vez por todas a perspectiva de paz pela expansão territorial.

No dia 09 a Corte Internacional de Justiça (CIJ), a mais alta instância jurídica das Nações Unidas, deu seu veredito sobre o muro que Israel estava construindo apressadamente além da Linha Verde surrupiando teras palestinas: É ilegal e tem de ser interditado imediatamente.
Nos termos do Órgão, Israel must cease construction of the wall and dismantle sections located in the occupied territories forthwith; repeal or render ineffective all related legislative and regulatory acts; compensate for damage caused; and return Palestinian property or provide compensation if restitution is not possible.
A CIJ recomendou também que os países membros da ONU "should neither recognize the wall nor provide aid or assistance to maintain the circumstances created by its construction; prevent any impediment, created by the wall’s construction, to the exercise of the right of the Palestinian people to self-determination; and, ensure Israel’s compliance with international humanitarian law. It called on the UN to consider what further action was needed to end the illegal situation caused by the wall’s construction."

A condenação do Tribunal da Háguia à barreira expansionista não podia ser mais clara.
Lembro que a primeira página do jornal israelense Haaretz, (progressista no limite possível em Tel Aviv) saiu com duas manchetes nesse dia.
Uma delas era sobre o veredito da Háguia. A outra era sobre o aniversário de cem anos da morte do judeu austro-húngaro Theodor Herzl, inventor do movimento sionista moderno.
Lembro também de ter ficado meio desentendida com a ligação, apesar de conhecer bem a teoria sionista de Herzl. Aliás, li seu livro Der Judenstaat (O Estado Judeu) no mesmo período que li Mein Kampf (Minha Luta) de Adolf Hitler a fim de confirmar a semelhança incrível dos dois panfletos políticos; antagônicos, em princípio - o segundo livro de Herzl, Altneuland (A Antiga Nova Terra) é um romance "inspirado" no Utopia, do grande Thomas More, e romanceia um Grande Israel que coopta em vez de excluir a população nativa palestina.
Aí como sempre acontece quando uma atitude judeo-israelense me deixa perdida, apelei para a sapiência do jornalista Uri Avnery que esclareceu o ponto de vista do Haaretz com sua conhecida maestria.

"This coincidence may seem fortuitous. What connection could there possibly be between a historical anniversary and the latest topical event?
But there is a connection. It is expressed in one sentence written by Herzl in Der Judenstaat, the book that became the cornerstone of Zionism.
This is what it said: “There (in Palestine ) we shall be a sector of the wall of Europe against Asia , we shall serve as the outpost of civilization against barbarism.”
This sentence could easily be written today. American thinkers propound the “clash of civilizations”, with Western “Judeo-Christian” culture battling “Islamic barbarism”. American leaders declare that Israel is the outpost of Western civilization in the fight against Arab -Muslim “international terrorism”. The Sharon government is building a wall for the purpose, or so it says, of protecting Israel against Palestinian-Arab terrorism. It declares at every opportunity that the fight against “Palestinian terrorism” is a part of the struggle against “international terrorism”. The Americans support the Israeli wall with all their heart and their wallet.
Even the semi-official name of the barrier – the “Separation Fence” – emphasizes this tendency. It is intended to “separate” between nations, between civilizations, and indeed to separate culture (us) from barbarism (them).
These are profoundly ideological reasons...
This is also true for another aspect of the wall. In Herzl’s day a phrase was coined that became the slogan of the Zionist movement in its early years: “A land without a people for a people without a land.” That is to say, Palestine is an empty country.
Anyone who tours the length of the planned path of the wall is struck by one aspect that leaps to the eye: it has been determined without the slightest consideration for the life of the Palestinian human beings living there. The wall crushes them as a man steps on an ant. Farmers are cut off from their fields, workers from the workplaces, pupils from their schools, sick people from their hospitals, the bereaved from the graves of their beloved ones.
It is easy to imagine the officers and settlers bent over the map and planning the path – as though through an empty space, with nothing there except settlements, army bases and roads. They argue about topography, tactical considerations and strategic objectives. Palestinians? What Palestinians?...
Now comes the International Court of Justice and announces principles that are much closer to those supported by the Israeli peace forces that have demonstrated against the wall. It says that the wall itself is illegal, except where it follows the Green Line. All the sectors built inside the occupied territories violate international law as well as conventions and agreements signed by Israel.
...Will this have any impact on Israeli public opinion? I am afraid not. During the last few months, the official propaganda machine has been preparing the public for this day. The judges of the International Court , it was said, are anti-Semites. It is well known that all the nations, with the possible exception of the United States , want to destroy the Jewish State. Some years ago a jolly song was very popular: “All the world is against us / But we don’t give a damn…” So, to hell with them!"

Uri tinha razão do começo ao fim.
Os israelense reagiram do jeitinho que seu compatriota pacifista previra.
Como já disse, os dois governos mais "competentes" em contra-informação, em transformar mentiras e fabulações em notícias "irrefutáveis" são Israel e os Estados Unidos. E na disputa entre os dois, Israel tem vitória garantida.
Quanto a Ariel Sharon, bem, Ariel Sharon estava tranquilo, e como seu parceiro George W. Bush, todo sorrisos e sem nenhuma preocupação com a Justiça Internacional a que ambos deviam, por definição onusiana, estar submetidos como todos os outros membros das Nações Unidas.
Mas não. Israel e Estados Unidos formam uma união própria, de afilhado e padrinho, em que uma mão lava a outra desde 1948 e os papeis de protetor e protegido se invertem conforme o autor do delito.
As declarações colhidas em Washington foram conformes ao dito acima.
O porta-voz da Casa Branca Schott McClellan, a bordo do Air Force One, ousou declarar aos jornalistas que "We do not believe that that's the appropriate forum [a Corte Internacional de Justiça] to resolve what is a political issue. This is an issue that should be resolved through the process that has been put in place, specifically the road map... We certainly recognize the need for Israel to defend itself and protect the people of Israel. It's also important that they allow the Palestinian people to move freely within that region."
Os senadores Democratas Hillary Clinton e Charles Schumer foram mais longe ainda. Apressaram-se a anunciar que se pronunciariam contra a decisão da CIJ diante do prédio das Nações Unidas em Nova York, a fim de obter maior impacto. Queriam deixar claro que a ala sionista do Partido Democrata também achava que Israel era intocável.
Dito e feito. Nem vale a pena transcrever o que os dois disseram. Hillary Clinton sustentaria a mesma posição como Secretary of State de Barack Obama e pioraria bastante a situação.
Eli Hurani demonstrou em um parágrafo no site da Eletronic Intifada o absurdo da reação destes políticos estadunidenses. "The ICJ [Corte Internacional de Justiça] advisory opinion, one of the most important legal opinions on the question of Palestine and international peace and security in the region since the United Nations assumed responsibility for the future of the country in 1947, presents a clear alternative to the status quo of the Oslo process, the international Road Map, the Sharon disengagement plan, and, the April 2004 US letter of assurance to Israel. International law provides the foundation for this alternative."
Pois é, mas...

Na véspera do dia em que o Mundo civilizado ouvia o veredito da CIJ, agentes israelenses à paisana invadiram uma casa em Beit Hanun e assassinaram sete resistentes com apoio aéreo de dois Apaches e terrestre de snipers bem localizados.
Um deles era uma moça, Jamila Hamad encarregada de vigiar a porta. Quatro deles pertenciam à Brigada al-Aqsa, um era do Hamas e outro do Jihad.
No dia 11 de julho uma bomba das Brigadas al-Aqsa, do Fatah, feriu vinte israelenses e matou um soldado em um ponto de ônibus em Tel Aviv. A intenção era provar que a barreira não garantia a Israel nenhuma segurança ao contrário do que a propaganda de Ariel Sharon induzia a pensar.
Dois dias depois a IDF assassinou o líder em Jenin do Jihad, Numan Tahayna e um colono judeu atropelou de propósito um senhor palestino perto de Belém. Nem parou para ver o morto que deixou para trás.
Aliás, o atropelamento de velhos e meninos palestinos por colonos é comum. Quando a família dá queixa aos tribunais israelenses, a pena imposta ao motorista é mínima ou nenhuma. A mesma imposta para a morte de um animal.

Os colonos israelenses vivem aprontando. Queimam oliveiras, furam e poluem caixas d'água para os palestinos ficarem sem água potável, destroem lavouras, incendeiam oliveiras e carros, depredam propriedades, atacam crianças, enfim, fazem o diabo a quatro para infernizar o quotidiano dos nativos com o propósito de forçá-los ao êxodo.
É um terrorismo notório quotidiano. Mas no dia 14 de julho o nível baixou mais ainda.
Envenenaram uma cisterna em Hebron e 110 crianças foram salvas da morte in extremis. A cisterna em questão fornecia água para o sul inteiro da cidade palestina. Com este gesto horrendo os colonos contavam "esvaziar" os bairros para ocupar as casas dos hebronitas.
As substâncias químicas foram jogadas no poço por quatro colonos para-militares armados. A sorte foi que foram vistos nas paragens e o prefeito local, Saber Alhareeny, logo isolou a área. Os adultos também sofreram efeitos nocivos da arma química, mas com menos gravidade.
A notícia da hospitalização dos meninos logo espalhou-se pela Cisjordânia, pela Faixa de Gaza e o choque foi grande com a tentativa de assassinato em massa.
Porém, nenhuma providência jurídica seria tomada.
O colonos judeus continuam a poluir a água dos palestinos até hoje, por meios cada vez mais perversos e produtos químicos que provocam danos à saúde sem ser fatal, quando a vítima é socorrida a tempo. Uma arma de nuância sofisticada que chama menos atenção que a arma química letal com a mesma eficácia da limpeza étnica direta.

No dia 17 a IDF executou um membro do Hamas, Basil Abu Sha'b, e um do Fatah, Sahir Aja in Saida.
E nas instâncias oficiais, Ahmed Qorei, cansado de dar murro em ponta de faca, demitiu-se provisoriamente do cargo de Primeiro Ministro por causa da" impossibilidade de fazer as reformas necessárias na Autoridade Palestina".
O problema era o mesmo. Yasser Arafat governava com autoridade absoluta e deixava a corrupção gangrenar o Fatah, provocando indignação geral.
Mas a amizade falou mais alto e dez dias mais tarde Qorei atenderia aos pedidos de Abu Ammar e voltaria atrás.

Enquanto isso, o Embaixador da Jordânia na ONU solicitou uma sessão de emergência da Assembleia para votar uma Resolução que adotasse o veredito da CIJ sobre a ilegalidade do Apartheid Wall.
Foi atendido.
No dia 20 de julho de 2004 a maioria absoluta das Nações Unidas (150 a favor, 6 contra, 10 abstenções) sancionou uma Resolução exigindo que Israel derrubasse o muro na Cisjordânia.
Os Estados Unidos, além de votarem contra, condenaram os votos favoráveis usando o argumento que usam até hoje para evitar que a Justiça Internacional seja aplicada a Israel e que o penalize por seus pequenos e grandes crimes: This is not the right way to proceed.
Para acenar em seguida com a miragem de negociações de paz sem nenhuma pausa na colonização nem na extensão do muro além da Linha Verde.
Esta Resolução da ONU foi considerada a mais importante sobre a região desde a 181 adotada em 1947 (que dividia a Palestina para permitir a criação do Estado de Israel).
Os Estados Unidos e Israel só tiveram o apoio da Austrália e dos micro-Estados Maschall Islands, Micronesia e Palau. Os 25 países da União Europeia votaram em peso a favor a Resolução.
Que não daria em nada, como as anteriores que já haviam sido aprovadas.

Do dia 25 ao dia 31 de julho os ataques da IDF continuaram e o muro também, ambos aparentemente indestrutíveis em sua arbitraridade.
O mês terminou com a informação que Israel detinha 7.500 prisioneiros palestinos de 12 a 75 anos. Muitos deles sem julgamento nem acusação formal e 800 dos detentos, doentes, sem cuidados médicos adequados.
A notícia chocante foi seguida da do assassinato de um menino de 11 anos. Um de oito palestinos mortos durante operações costumeiras da IDF na Faixa de Gaza. Uma menina de 16 anos também levou um tiro na cabeça durante a operação de execução de três resistentes. Efeitos colaterais. Sem importância.
O mês de julho terminou com 58 mortos palestinos e 3 israelenses.

Documentário Journeyman: The Dividing Wall e as mentiras de sempre

"The situation in the Occupied Palestinian Territory (OPT) is characterized by serious violations of general international law, of human rights law and of international humanitarian law. It is not helpful to suggest that a solution can be found to the conflict in the region by ignoring norms of international law. A sustainable peace in the region must take place within the framework of international law and relevant resolutions of the United Nations."
John Dugard, investigador da ONU para questões de Direitos Humanos; 2004.


Reservistas da IDF, forças israelenses de ocupação,
Shovrim Shtika - Breaking the Silence 
I remember seeing those kids in Hebron and feeling proud that they’re afraid. These are kids I’m talking about, like, really. And who were they afraid of? The Jewish kids. They don’t do anything, but the Jewish kids throw rocks at them when they pass by. The Jewish parents don’t say a word. The parents stand around, and you see a little Jewish kid throwing stones and yelling something at the Arab kids, and it was just routine. You come to Tel Rumeida and you see it every day, and it’s okay, it’s acceptable. And the parents, I don’t know if they’re the parents, but adults walk around and they don’t say a word to the kids. 
It doesn’t seem strange to you that a kid throws a stone at another kid? 
Because one’s a Jew and the other’s a Palestinian, it’s as if it’s okay. 
Did you also see the opposite, a Palestinian throwing a stone at a Jew? 
I remember that I’d say that it was kind of okay, but to myself I’d think, come on, what is he, retarded? That guy didn’t do anything to him. I’d think, this is what causes the whole mess, these little fights, these things that the Jews start. I know their parents teach them to hate them, and so they legitimize throwing rocks and cursing at them. It’s the kind of thing you see on TV. So it’s clear there’ll be a mess afterward. And you don’t understand which side you’re on. In Hebron it’s  the  strangest thing, you don’t know which side you’re on. I’m a Jewish Israeli soldier, and I’m supposed to be against the Arabs because they’re my enemy, but I’m here, next to a settler’s house in the base, and I start thinking that I’m not on their side, that the Jews aren’t right. So wait, so no, I have to flip a switch in my brain so I can keep hating Arabs and justifying what the Jews do. But no, wait, I still can’t agree with the Jews, because they started it, it’s because of them that we’re here, and it’s because of them that all this is happening, because they disturb them and they’re afraid. It’s terrible, all of this . . . 
So why flip the switch? 
Because you have to be loyal to your side. 
How old are the kids you’re talking about? 
Young, like five or six. The ones who run around outside.
Sargento reservista da IDF 

When you're in this kind of place, ongoing warfare, uncertainty, you become indifferent to everything going on around you. In fact, eventually you don't care. You don't care about them, about what happens to them. You don't care. You pass your time because you know you have to and there's nothing you can do about it, whether it's a warning or something that is actually happening. You don't know. Something has to happen that really shocks you in order for you to change, and I guess it doesn't. The fact is such serious things did occur and so many people would not talk about them. Perhaps, too, they don't think it is so severe or serious – that it was natural, a part of what we called ongoing warfare.
Tenente reservista da IDF

Documentário da israelo-marroquino-francesa Simone Bitton, 2004
MUR
Parte IV - legendas em português, (10')

domingo, 10 de novembro de 2013

"Arafat foi envenenado." Cadê o culpado?



A manchete internacional da semana passada foi a confirmação do envenenamento de Yasser Arafat. Notícia de primeira página de todos os jornais e sites europeus e minimizada nos do nosso continente americano, inclusive no nosso país ( por que cargas d'água?) era só no que se falava no dia 06 de novembro logo que a Al Jazeera publicou a íntegra do relatório de 108 páginas divulgado pela University Centre of Legal Medicine de Lausannena Suiça.
No documento os cientistas comunicam oficialmente o resultado da autópsia do líder palestino: o organismo de Abu Ammar (Yasser Arafat) continha quantidade de Polonium-210 18 vezes superior à quantidade normal, e isto, 9 anos depois do enterro.
A equipe russa também encarregada da mesma tarefa científico-investigativa, discordou do resultado da equipe franco-suíça em um relatório de 15 páginas.
Ambas equipes de exumação receberam 20 partes do cadáver para serem examinadas. 
A equipe de cientistas franceses e suiços recebeu os vinte e descobriu a alta dose do elemento radioativo no pélvis e costelas. 
A equipe de cientistas russos recebeu apenas quatro das vinte amostras transmitidas para análise - duas do crânio e duas de extremidades ósseas - que examinaram com profissionalismo, porém, parece que sem liberdade desde o início.
Talvez as mãos atadas expliquem a  escolha das partes a serem examinadas, incompreensível para outros cientistas que lidam com efeitos radioativos e para a equipe franco-suíça.
Para o professor François Bochud, que ensina Física Aplicada na Faculdade de Biologia e chefia a equipe franco-suiça, o crânio não é o lugar do corpo no qual se testa substância radioativa, "We thought that [the skull] would not be the best kind of bone sample to measure. It is not as vascularised as other bones and therefore not the bone that would collect the highest quantity of polonium."
O inglês Dave Barclay (ao lado), professor de investigação científica, veterano e respeitado no ramo de investigações desse tipo concorda com o professor François Bochud. E foi mais específico: "The choice of bone fragments that they've [the russians] chosen to use is very odd and the levels they've got appear to be 10 or 20 times less than you'd expect just from anyone else in the worldI think the [russian] results are meaningless.
O relatório russo vazado para a Al Jazeera diz que "only one of the four provided fragments [um ossinho do crânio] was found to have radioactive background". 
Off the record, uma fonte russa (até os russos andam vazando informação! dirse-ia que o mundo está ficando mais moral apesar das pressões aumentarem) disse que além dos cientistas russos terem recebido amostras incompletas e propositalmente selecionadas, teriam sido instruídos pelo Ministro das Relações Exteriores da Rússia sobre como apresentar o relatório final. 
"The laboratory personnel say they received clear instructions from the Foreign Ministry on how the final report should look like. It seemed suspicious to them that they were being asked to fill out a specific table and answer specific questions from the Foreign Ministry. Namely, to conduct an inferior studyRussia's goal was to fulfill the Palestinian Authority's request, not offend Israel by helping the PA, and not create a new hotbed in the Middle EastTherefore, the objective here [in Russia] was to make a conclusion without a conclusion.
Considerando o jeito de Moscou (e outros centros de poder pragmático...) funcionar, entende-se que a conclusão da equipe russa é política e a da equipe independente franco-suiça é científica.
Porém, o professor inglês Nicholas Priest, ex-chefe da unidade de pesquisa biomédica da Atomic Energy Authority  da Inglaterra, declarou por sua vez que embora o envenenamento por polonium “cannot be totally ruled out”, os sintomas manifestados pelo espião russo dissidente Alexander Litvinenko, morto em Londres em 2006 foram diferentes.
Priest participou da investigação da morte do espião russo e por isso emite dúvida, aberta, quanto a cereza a cem por cento. “Key indicators it was not polonium [that killed Arafat] were lack of hair loss in the face, and no damage to his bone marrow, both of which were found extensively in Litvinenko.
Priest não examinou Arafat vivo e nem participou da autópsia. Sua opinião é baseada em fotos, como a de acima.
Para o professor de investigação científica Dave Barclay os resultados apresentados pela equipe franco-suíça não deixam dúvida que o líder palestino foi assassinado. 
Yasser Arafat died of polonium poisoning. We found the smoking gun that caused his death. What we don’t know is who’s holding the gun at the time. The level of polonium in Yasser Arafat’s rib…is about 900 milibecquerels. That is either 18 or 36 times the average, depending on the literature.”

Após constatar o delito há de se descobrir o culpado. E como todas as investigações, o primeiro suspeito é quem ganha com o crime...
A título de lembrança, a saúde de Arafat deteriorou-se rapidamente em outubro de 2004 após dois anos e meio de confinamento compulsório na Muqata'a de Ramallah junto com 270 funcionários públicos - A Muqata'a é um centro administrativo que reúne a sede do governo, ministérios e delegacia de polícia.
Tropas e tanques israelenses sitiavam esta prisão domiciliar de Arafat e eram inflexíveis no controle de água, comida, produtos e pessoas que entravam e saíam.
Nada, nadinha, entrava na Muqata'a sem investigação e autorização de Israel.
Na época da morte súbita inexplicável, não faltou quem lembrasse das ameaças e da frase sibilina pronunciada por Ehud Olmert no ano anterior sobre o fim que pretendiam dar ao líder palestino: "Expulsion is certainly one of the options. Killing is also one of the options."
O envenamento era uma saída "segura" porque os muçulmanos não autorizam autópsia, e por isto não foi feita na época, apesar de suspeitas não faltarem.

Por enquanto, Suha, a viúva de Abu Ammar, recebeu cópia do relatório em Paris no dia 05 antes da Al Jazeera divulgá-lo em seu site e disse pesarosa que "Quando chegaram com os resultados eu voltei ao luto. É como se tiveseem acabado de anunciar sua morte."
Por enquanto ela está de luto e não aponta para nenhum culpado em particular. Mas pode usar da prerrogativa de acionar a Justiça francesa para que esta abra inquérito detalhado, pois além de Arafat ter morrido em hospital parisiense para onde foi levado já em estado crítico, Suha tem nacionalidade francesa. Pois, como se sabe, os palestinos são apátridas.
Por outro lado, Wasel Abu Yusef, um dos dirigentes da OLP (Organização de Libertação da Palestina que ainda funciona com vários partidos palestinos com dominação política do Fatah e sob a presidência de Abu Mazen - Mahmmud Abbas) fez uma demanda formal de queixa, que foi estudada por um Conselho e aprovada.
Os palestinos solicitam a formação de uma comissão de inquérito internacional nos moldes da que investigou o assassinato do primeiro ministro libanês Rafiq Hariri.

No dia 08, em entrevista coletiva em Ramallah, membros da comissão de investigação declararam aceitar como definitiva a conclusão da equipe suiça.
E Tawfiq Tirawi, chefe da comissão, acrescentou: "We say that Israel is the one and only suspect in the case of Yasser Arafat's assassination, and we will continue to carry out a thorough investigation to find out and confirm all the details and all elements of the case. This is the crime of the 21st century. The fundamental (goal) is to find out who is behind the liquidation of Yasser Arafat."
Enquanto isso Yigal Palmor, porta-voz de Avigdor Lieberman (o sionista-extremista que é ministro das relações exteriores de Israel e que acabou de ser "absolvido" em um processo vergonhoso em Tel Aviv) declarou: "I will state this as simply and clearly as I can: Israel did not kill Arafat. Period. And that's all there is to it."
Será? 
O corpo de Yasser Arafat foi exumado em novembro de 2012. Oito anos após sua morte, graças a meses de trabalho de jornalistas investigativos da Al Jazeera. Cavaram, cavaram, até terem acesso a objetos pessoais do líder palestino, nos quais cientistas suiços encontraram altos níveis de polonium nas manchas de sangue e urina de suas roupas. Guardadas pela viúva, Suha.
Wasel Abu Yusef lembrou na semana passada que "The [test] results proved Arafat was poisoned by polonium, and this substance is owned by states, not people, meaning that the crime was committed by a state." 
Qais Abd al Karim, outro membro do comitê executivo da OLP, disse por sua vez que "Only Israelis have the means and the motives in order to commit this crime. This is a scandal and a crime that makes the Israeli's responsible for such atrocities and I think that it is necessary that they should be responsible in front of international justice and they should pay for their crime."
Yigal Palmor, por sua vez, na guerra de palavras, disse irritado que "The Palestinians should stop this nonsense and stop raising these baseless accusations without any shadow of proof."
Ao que Tawfiq Tirawi argumenta até bastante calmo: "It is not important that I say here that he [Abu Ammar] was killed by polonium. But I say, with all the details available about Yasser Arafat's death, that he was killed, and that Israel killed him. Israel is first, fundamental and only suspect in the assassination of Yasser Arafat".
Mas a contra-informação já está funcionando a cem por hora. "Alguém" já lançou inclusive o boato que Abu Ammar teria sido assassinado por ordem de Bashar el-Assad! Aquela estória de matar dois coelhos com uma única cajadada. O problema é que a Síria não faz parte do clube nuclear restrito que possui este tipo de arma química.
Quaisquer que sejam as vontades e as palavras trocadas, a investigação solicitada pela Autoridade Palestina, se for como a de Rafiq Hariri, durará meses ou anos. E posso estar enganada, mas no final o resultado oficial será vão. Quando e SE conseguirem provar que houve assassinato e que Israel está implicado, o governo israelense dará de ombros e ficará impune como sempre.
Resta saber como o povo palestino reagirá a curto e médio prazo. Será que esta descoberta acarretará uma terceira intifada?
O futuro próximo dirá, e talvez este dependa de como Marwan Barghuti, da prisão, reagirá.

"18 years after the muder of [Yitzak] Rabin, radioactive polonium was found on the remains of Arafat - the other signer of Oslo [Accords], who was able to bring about full peace.
Whoever poisoned him tried to leave no traces."
Publicado no jornal israelense Haaretz, 8-11-2013  

 "He [Arafat] made so many concessions to Israel – because he was growing old and wanted to go to “Palestine” before he died – that his political descendants are still paying for them. Arafat had never seen a Jewish colony on occupied land when he accepted the Oslo agreement. He trusted the Americans. He trusted the Israelis. He trusted anyone who appeared to say the right things. And it must have been exhausting to start his career as a super-“terrorist” in Beirut and then be greeted on the White House lawn as a super- “statesman” and then re-created by Israel as a super-“terrorist” again...
...I’m sceptical. Edward Said told me tha Arafat said to him in 1985 that “if there’s one thing I don’t want to be, it’s to be like Haj Amin. He was always right, and he got nothing and died in exile.” Hunted by the British, Haj Amin, the Grand Mufti of Jerusalem, went to Berlin during the Second World War in the hope that Hitler would help the Palestinians. It was the greatest blunder any Palestinian has made. Arafat followed that blunder by going to Baghdad and embracing Saddam Hussein after his invasion of Kuwait, believing Saddam would “liberate” the land he called Palestine. Arafat wanted to believe Saddam. Like he wanted to believe the Americans. And the Israelis. And his legacy of vain trust has destroyed any hope of a Palestinian state. That is the poison we should be studying.
Robert Fisk, no jornal inglês The Independent



PS Faixa de Gaza: O Hamas tem um novo porta-voz desde a semana passada: Isra al-Modallal, uma jovem de 23 anos.
Isra fala inglês (britânico) fluente e elegantemente. Foi criada em Gaza, foi à escola durante cinco anos na Inglaterra quando o pai estava expatriado, voltou para sua terra natal e formou-se em jornalismo na Universidade Islâmica de Gaza.
(A Universidade chama Islâmica, mas funciona como as PUCs brasileiras; ou seja, é antes de tudo, uma universidade).
Isra não é do Hamas, é divorciada, tem uma filhinha de 4 anos, não tem foto de Ismail Haniyeh (líder do Hamas na Faixa), e refere-se a "Israel" e não na "Zionist entity," como é de praxe no Hamas.
Ela conhece a História ocidental na ponta da língua - dos Estados Unidos à Europa passando pela nossa, e se define da seguinte forma: "I am not Hamas. I am a Palestinian activist who loves her country. Não sou do Hamas. Sou uma ativista palestina que ama seu país".
Como Isra morou fora, conhece de sobra a má reputação que Israel fabricou do Hamas e tenciona mudar essa imagem com fatos embasados e seu profissionalismo já demonstrado como âncora de jornal televisivo.
Isra não é uma marionete. É uma mulher jovem, mas bem preparada e além de simpática, tem uma personalidade forte o bastante para não se deixar manipular.
"Every day, women's footsteps can be seen advancing more in society. I know it's [job of Hamas' spokeperson] is a big responsibility and it's not easy to speak on behalf of a government in normal situations, whereas I am working in unique situations."
Pois é. Seja bem-vinda, Isra! E boa sorte aos esforços do Hamas de legitimar-se internacionalmente. 

Documentário Al Jazeera: Killing Arafat

domingo, 3 de novembro de 2013

Israel vs Palestina: História de um conflito XLIII (06-2004)


No mês de junho de 2004 os palestinos receberiam um novo choque.
Desta vez não seria um crime nem um ataque ao Hamas. Seria um golpe baixo no Fatah. Aliás, considerando a importância da personagem, abalaria a Palestina em toda a sua extensão descontínua.
Antes deste acontecimento marcante da Intifada, no dia 02, soldados da IDF balearam dois palestinos perto do Karni crossing, uma barragem/fronteira comercial entre Israel e a Faixa de Gaza.
O Karni é um dos quatro postos de entrada na Faixa, a partir do território de Israel, abertos em 1994 após os Acordos de Oslo.
Os palestinos só podiam (o verbo está no imperfeito porque o posto foi desativado em 2011) usar esta passagem para importar e exportar produtos.
Este posto de fronteira é localizado no nordeste da Faixa. Uma estrada homônima o ligava à colônia judia Netzarim. Israel nomeou posto e estrada com este nome em homenagem ao negociante judeu Joseph Karni, que construiu um armazém na Faixa perto do terminal logo depois da invasão de 1967.
O nome palestino tinha raízes mais profundas, na terra; Al-Montar, era como chamavam o mesmo lugar por causa da colina vizinha de Ali Montar.
Ao contrário do Erez Crossing, que é administrado pela IDF, embora seja bastante policiado, o Karni era administrado pela Alfândega de Israel por causa de seu caráter comercial. É por ele os caminhões de carga transitavam e dentro deles todos os produtos - de trigo a cimento - transportados à Faixa, e sobretudo, os mantimentos doados pela Cruz Vermelha e as demais ONGs humanitárias.
A IDF estava obcecada com a segurança no Al-Montar porque o ShinBet descobrira que os dois bombas-suicidas que haviam explodido no Porto de Ashdod haviam atravessado por lá.
Só que os dois rapazes de 18 anos, saíram de Jabalya, campo de refugiados em que moravam, escondidos dentro de um caminhão de carga com seus coletes explosivos. Não estavam atravessando o posto publicamente para transportar mercadoria como os dois homens que foram assassinados.
Mas Tarek Subhi Temraz e Hussam Ahmed Hamad, de 22 anos, ao ver dos israelenses, cometeram sim um crime. O de pisar na estrada Karni que os colonos usavam.
Os palestinos são proibidos de circular em estradas usadas por israelenses até hoje, na Cisjordânia.

No dia 06, em Israel, o plano de evacuação das colônias ilegais da Faixa de Gaza foi aprovado pelo governo de Ariel Sharon.
No mesmo dia o Judiciário jogou a bomba que deixou os palestinos nocauteados. Condenou Marwan Barghuthi à prisão perpétua multiplicada por cinco (165 anos). As sentenças de prisão consecutivas correspondiam à acusação da morte de cinco isralenses ocorridas em ações militares da resistência.
Marwan nasceu em junho de 1959 em Kafr Kubr, perto de Ramallah, na Samaria bíblica localizada na Cisjordânia. Aderiu ao Fatah com 15 anos e adquiriu proeminência nacional em 1987 como líder da Intifada. Foi eleito deputado em 1996 e apesar de sua intimidade com Yasser Arafat, fez campanha independente contra os abusos e corrupção de funcionários públicos próximos do Presidente.
Nem por isso perdeu a confiança de Abu Ammar. Era o líder do Tanzim, ala armada do Fatah, e por isso foi um dos primeiros alvos da campanha de assassinatos de Ehud Barak e Ariel Sharon.
Em 2001 escapou da morte por um triz e em 2002 a IDF o prendeu com grande estardalhaço.
Já falei sobre Marwan neste blog em várias oportunidades. Porém, tenho de relembrar sua trajetória política e humana porque ele é uma pessoa à parte. Desde a morte de Yasser Arafat é ele a personagem pública mais popular da Palestina. Uma pesquisa de 2012 inclusive revelou que, embora esteja preso, 60% dos palestinos votariam nele para a Presidência, em detrimento de Mahmoud Abbas (Fatah) e de Ismail Haniyeh (Hamas). É o único homem que conseguiria reconciliar o Fatah, o Hamas e criar uma ponte de harmonia entre a Cisjordânia e a Faixa de Gaza. É considerado o "Nelson Mandela" palestino. É por isso que continua preso. Tel Aviv o considera um perigo, pois com Marwan na jogada nem o ShinBet conseguiria manter a divisão que vem fomentando nos últimos vinte e cinco anos.
O nome completo deste denominador comum é Marwan Hasib Husayn al-Barghuthi, mas é conhecido como Marwan Barghouti, ou simplesmente Marwan.
Apoiou a fundo o processo de negociações que levariam aos Acordos de Oslo mas logo viu que  só as negociações não bastariam para acabar com a ocupação israelense. Ouvia o discurso ambíguo, as promessas de retirada e a colonização que galopava, e no fim da década de 90 investiu-se no comando do Tanzim e seu braço armado, as Brigadas al-Aqsa.
Marwan nasceu em uma família tradicional da área de Ramallah e politicamente ativa. (O médico Mustafa Barghuti, co-fundador da Palestinian National Initiative (al-Mubadara al-Wataniyya al-Filistiniyya) e famoso ativista pacifista é primo de Marwan).
Aos 15 anos, Marwan co-fundou a ala jovem do Fatah (shabiba) na Cisjordânia. Aos 18 foi preso em Israel por atividade política durante 4 anos. A acusação era por  “membership of a banned organisation”. Aproveitou para aprender hebraico, que fala fluentemente sem sotaque.
Ao ser solto em 1983 entrou na Birzeit University (BZU) de Ramallah, onde se formou em História e Ciências Políticas e obteve em seguida um mestrado em Relações Internacionais.
Durante a faculdade participou ativamente da política universitária no Fatah, foi presidente do Diretório dos Estudantes, e apaixonou-se por uma colega, Fadwa Ibrahim, com quem casou-se. Fadwa formou-se em Direito e virou uma eminente advogada de prisioneiros políticos. O casal tem uma filha, Ruba, e três filhos, Qassam, Sharaf e Arab. O mais velho nasceu em 1986 e o mais novo em 1991.
Marwan foi um dos maiores críticos da centralização do poder em torno de Yasser Arafat e virou líder da corrente reformista do partido. Da prisão, criou um movimento chamado al-Mustaqbal (O Futuro) e pretende candidatar-se à Presidência nas próximas eleições, contra Abbas e Haniyeh.

Os dois anos de processo de Marwan Barghuti foram um verdadeiro circo pseudo-jurídico. Longe de um julgamento sério e fiável. Nas oportunidades em que pôde exprimir-se, Marwan, então com 45 anos,  aproveitou para pôr pingos nos iis.
"We have been suffering under your sinister military occupation for over 36 years during which you killed us, tortured us, destroyed our homes and usurped our land. You made our life an enduring hell. We have an inherent moral and legal right to resist your occupation of our country. If you were in our shoes, you most certainly would do the same as we are doing. You would resist.
Palestinians are now experiencing. Like President Arafat, I have become a scapegoat – my trial simply a public relations event by a morally bankrupt and visionless Israeli leadership desperate to cover up its own inadequacies. And I pity the Israeli people, lied to and misled by a Prime Minister promising peace and security and who has failed miserably in delivering either.
My show trial says more about the sorry state of Israeli morality than it does about me. I pity the state of Israel – the Middle East’s “only democracy” stooping to fabricating charges in a show trial aimed not at truth and justice but rather to appease the Israeli masses who refuse to see any connection between their own brutal policies and the cycle of violence Israelis and  I categorically reject the authority of this criminal court of occupation and I will not dignify the ludicrous claims against me by responding to them. If my trial were truly a search for truth and justice, it would be Sharon and the Israeli army behind bars – it would be the criminals of occupation who have perpetrated war crimes against the men, women and children of Palestine over decades, who continue to violate UN Resolutions and the 4th Geneva Convention with impunity."
O julgamento foi tão cinematográfico que, apesar de não deixar de demonstrar solidariedade ao sofrimento dos israelenses com os atentados e deixar de salientar o direito de defesa dos ocupados, a comunidade internacional não teve como levar a sério a farsa jurídica que testemunhara.
"The Israeli authorities are right to point out that their country is up against blind terrorism posing serious security problems that they have to address. This report is not the right place to discuss the origins of this terrorism, or ways of putting an end to it, but it does illustrate that the methods chosen to deal with it have been inconsistent with the rule of law, and sight has been lost of such equally essential principles as the absolute priority that must under all circumstances be given to respect for the physical integrity of prisoners.
The numerous breaches of international law recalled in this report make it impossible to conclude that Mr. Barghouti was given a fair trial.Most of the persons contacted are convinced that Mr. Barghouti will receive a severe sentence, but all are equally convinced that the verdict will have no legitimacy because it will have been dictated far more by intense media pressure and political interests than by any rigorous application of procedures respecting the integrity of the defendant and his right of defence.The Barghouti case has very clearly demonstrated that, far from bringing security, the breaches of international law have, above all, undermined the authority of Israeli justice by casting discredit on its conduct of investigations and the procedures used." Escreveu Simon Foreman em seu relatório para a Inter-Paliamentary Union em 2004, The trial of Mr. Marwan Barghouti.
Acontece que naquela estória dos dois pesos e duas medidas, dois terços do povo israelense odiava Marwan Barghouti quase tanto ou mais do que Yasser Arafat. Pois raros eram os que viam que se assassinos houvessem, eram de ambos os lados. "Guerra é guerra," disse então um "observador ocidental" off the record. "Ocupar um país desarmado, aterrorizar uma população todo dia/noite e dia fora e dentro de casa, matar com metralhadoras e mísseis, tudo isso é terrorismo maior do que umas bombas aqui e acolá."
Pois é, mas on the record, ninguém ousava, ousa, repetir esta frase. Nenhum funcionário internacional ousa declarar publicamente que Israel é um Estado terrorista intocável, enquanto os Estados Unidos e os lobbies sionistas cantarem de galo nas capitais ocidentais.

Tão intocável e tão marginal que no dia 07 de junho mataram mais dois palestinos e feriram mais cinco em lugares diferentes dos territórios ocupados. Quatro menores de 17 anos.
No dia 14 a IDF disparou um míssil no carro de Khalil Marshud, chefe das Brigadas al-Aqsa no campo de refugiados de Balata o matando junto com outro ocupante do veículo.
No dia 16 foi a vez de outro resistente das Brigadas al-Aqsa, Majid al-Sa'di e um passante serem aniquilados.
No dia 23 foram mais três gazauís que não tinham nenhuma ligação com a resistência na Faixa. Na mesma agressão da IDF, três outros foram hospitalizadas no hospital Al-Shifa de Gaza.
No dia seguinte a IDF voltou ao ataque em Nablus e Hebron espalhando pânico e invadindo casas.
No dia 26 a IDF matou mais oito resistentes das Brigadas al-Aqsa, inclusive o chefe militar do Fatah em Nablus Hayif Abu Sharq. O chefe do Jihad na Cisjordânia Fadi alBahati também perdeu a vida nesse dia junto com o chefe local do Hamas Ja'fat al-Masri e Nisal Wawi do Fatah.
No dia 28 o Hamas lançou uns foguetes em Israel. Mataram duas pessoas (surpreendendo até quem jogou) e um grupo da resistência explodiu um posto militar da IDF na Faixa causando a morte de um soldado israelense.
Foi a primeira vez que foguetes Qassan lançados da Faixa atingiram gente com sérias consequências. Foi um choque até para os gazauís e sabiam que a vingança da IDF seria iminente e inclemente.
Foi. No mesmo dia três gazauís jaziam sem vida e dois outros estavam em estado crítico em Khan Yunis. Mas não eram suficiente. A vida de um israelense vale no mínimo dez vezes mais do que a de um palestino.
O mês terminou com 47 mortes palestinas e 5 israelenses.

Entrevista com o professor do M.I.T. Noam Chomsky
Part I (7')
Part II (8')


Documentário da israelo-marroquino-francesa Simone Bitton, 2004
MUR
Parte III - legendas em português, (10')