domingo, 15 de abril de 2012

Israel vs Palestina: História de um conflito IX (1996-1997)



O assassinato do chefe da Brigada al-Qassan na Cisjordânia, Yahya Ayyash, emsombrara em janeiro o pleito que elegera Yasser Arafat à presidência da Autoridade Palestina com maioria de dois terços no Conselho Legislativo de 88 deputados, mas estes se puseram logo ao trabalho. Em abril aprovaram a eliminação na Carta constituinte da frase que negava a existência de Israel.
Do outro lado da Linha Verde, a eleição de Binyanim Netanyahu no fim de maio fora um balde de água gelada na paz orquestrada pelo ex-primeiro ministro Yitzhak Rabin, mas apesar deste porém, na Cisjordânia e na Faixa de Gaza o vento que soprava em 1996 ainda era de esperança de liberdade.
Em Israel, os simpatizantes das negociações iniciadas por Rabin eram minoria no Knesset (Congresso israelense), mas a maioria do Likud, partido de direita que elegera Binyamin Netanyahu, era curta demais para que ele tivesse margem de impor aleatoriamente a política dos sionistas radicais.
Pelo menos era o que os israelenses liberais acreditavam.
Apesar do respaldo limitado, em junho, logo depois de empossado, Netanyahu acenou para seu eleitorado confirmando que não dividiria Jerusalém com os palestinos nem desistiria de terras ocupadas para que os autóctones constituissem seu Estado.
Arafat pôs panos quentes e o Hamas propôs cessar-fogo contanto que Israel parasse os ataques, libertasse prisioneiros políticos e abrisse a Cisjordânia e a Faixa de Gaza.
A proposta caiu em ouvidos moucos.
Diante do impasse da incomunicabilidade, cada um foi buscar apoio de um lado.
Netanyahu foi a Washington pedir para Bill Clinton aumento de fundos e de armas apelando para a lenga lenga do direito de defesa sem limite e Arafat conversou com o ministro das Relações Exteriores de Israel David Levy e foi a Damasco pedir apoio a Hafez el-Assad, tão insatisfeito com Netanyahu quanto ele pela recusa deste de devolver o Golan à Síria.
Vendo que todas as conquistas estavam ameaçadas, Arafat resolveu apelar para Washington para que Bill Clinton convencesse o afilhado a encontrá-lo, o Presidente dos Estados Unidos fez o necessário e no dia 04 de setembro Netanyahu e Arafat se reuniram em volta de uma mesa em terra palestina, mas no no man's land do checkpoint de Erez na entrada principal da Faixa de Gaza.
A conversa foi mediada pela ONU e a Noruega no intuito dos adversários concordarem em prosseguir as negociações e no final do Encontro os dois homens definiram de comum acordo que as questões pendentes seriam resolvidas em comitês conjuntos. Dentre estas, a evacuação de Hebron, a abertura da Cisjordânia e da Faixa de Gaza e o aeroporto palestino. Decisões devidamente lavradas com a firma de ambos.
Contudo, em vez de aproveitar a oportunidade de tomar a via pacífica, o Primeiro Ministro israelense anunciou quase no mesmo fôlego que cancelaria a proibição de novas invasões israelenses na Cisjordânia impostas por Rabin, autorizaria a instalação de mais duas mil famílias em colônias existentes e construiria um túnel embaixo da mesquita Al-Aqsa, em Jerusalém.
Foi como se tivesse posto fogo em um pavio de dinamite.
Em vez de recuar como prometera, avançava.
Passeatas eclodiram nas cidades dos Territórios Ocupados e os cristãos palestinos se juntaram aos muçulmanos para condenar a vigilância subterrânea do lugar sagrado.
Israel declarou estado de emergência nos Territórios Ocupados, a repressão da IDF foi geral e irrestrita, os palestinos logo começaram a recolher feridos e mais de 70 mortos foram enterrados, o Conselho de Segurança da ONU reuniu-se às pressas e solicitou no dia 27 de setembro (no dia que Israel começou a caval o túnel fatídico) cessação imediata de todos os atos que agravassem a situação e o restabelecimento do status quo anterior à revolta popular.
Netanyahu fez-se de novo de surdo, dobrou o número de soldados em Jerusalém e avisou que ia reocupar as cidades que Rabin devolvera à administração da Autoridade Palestina.
Bill Clinton, sentind que seus esforços junto a Netanyahu foram vãos e que estava perdendo as rédeas, voltou entrar na dança do dito que virou não dito propondo reunião de cúpula para esclarecer o assunto.
Como até então em Tel Aviv os desejos de Washington eram ordens (hoje em dia é a APAIC que canta de galo) no dia 1° de outubro Netanyahu e Arafat foram a Washington ouvir o que o Presidente dos Estados Unidos tinha a declarar na presença de uma testemunha regional - o rei Hussein da Jordânia - que desde as escaramuchas com o a OLP e o Fatah na sua capital, pendia mais para Tel Aviv do que para Gaza.
Dois dias mais tarde, voltando para casa, nenhum dos dois protagonistas do drama político esbanjava otimismo e em Washington e os rumores que circulavam era que a reunião fora infrutífera devido à inflexibilidade de Netanyahu que invalidava uma a uma as vitórias mútuas que Arafat e Rabin haviam recentemente alcançado.
Temendo a escalada da violência, no dia 8 de outubro o presidente de Israel, Ezer Weizman, convidou Yasser Arafat para um bate-papo em sua casa a fim de acalmá-lo no encontro informal e propor novo encontro com Netanyahu para resolverem os problemas de maneira amigável. E para demonstrar boa vontade, o governo divulgou que pretendia retirar quase todos os soldados de Hebron.
O "pretendia" e o "quase" soaram mal no ouvido de Arafat. Macaco velho, ele solicitou que a União Europeia pressionasse Netanyahu para parar as invasões e cumprir o combinado, os Estados Unidos falaram em voz alta o que sussurravam nos bastidores, ou seja, que Netanyahu estava pondo o processo de paz em perigo com a expansão das colônias, e para oficiliazar o descontentamento que reinava nas capitais orientais e ocidentais, em Assembleia Geral, 126 membros da ONU exigiram que Israel pusesse um ponto final às colônias ilegais. 
A resposta de Netanyahu foi como se em vez de repreendido tivesse sido louvado. Em dezembro autorizou que novas famílias judias construíssem sobre os escombros das residências palestinas que os caterpillars derrubavam e que outras se instalassem no Vale do Jordão, definido pela ONU como propriedade palestina legítima além de ancestral. 
Mesmo após este gesto que o deixou de saia justa e sob pressão até dos companheiros do Fatah, Arafat prosseguiu as negociações periféricas e concordou com o encontro sugerido por Weizman no início do ano seguinte para resolver de uma vez por todas a questão espinhosa de Hebron.
O Encontro aconteceu e o Protocolo de Hebron foi assinado no dia 15 de janeiro de 1997.
Nele, Netanyahu e Arafat firmaram um Tratado de retirada da IDF de Hebron e de zonas rurais da Cisjordânia seguindo um calendário que ia de março de 1997 a agosto de 1998 e definiram a retomada das negociações sobre o estatuto permanente da Palestina.
Parecia que os dois líderes começavam a falar a mesma língua.
Entretanto, no dia 7 de março Netanyahu deu pra trás.
Anunciou que no final das contas só se retiraria de 9 dos 30% do território palestino combinado e  no dia 17, enquanto as tropas da IDF ensaiavam retirada lenta de Hebron, uma nova colônia estava sendo implantada nada mais nada menos do que na colina de Har Homa em Jerusalém Oriental, devorando um sítio florestal palestino há centenas de anos preservado.
Aí Arafat se deu conta que fora enganado e pediu audiência com Bill Clinton para reclamar.
Enquanto estava em Washington ouvindo promessas recebeu notícia que a IDF acabara de interditar escritórios de quatro organizações palestinas em Jerusalém Oriental e cético em relação ao compromisso dos Estados Unidos com ambos os lados, recorreu à ONU para que defendesse as próprias leis que aprovara.
Em desespero de causa Arafat convocou uma conferência de crise em Gaza no dia 15 de março e contou com a participação de representantes de vários países europeus e dos EUA, que demonstrava que as potências ocidentais queriam acertar o que deixaram ser entortado.
Entretanto, no dia 18 Netanyahu desafiou todo mundo começando a construção da colônia da discórdia em Har Homa.
Aí deu tudo errado. 
A ONU se reuniu em célula de crise para voltar a condenar as colônias e por se preocupar "com as medidas ilegais tomadas por Israel na Jerusalém Oriental ocupada e no resto do território palestino". Só em 1997 a ONU debateu sobre as irregularidades de Israel três vezes - em abril, julho e novembro - em Assembleia ou no Conselho de Segurança. Todas as vezes votou Resolução condenando o ocupante pela ilegalidade e pela violação persistente da Convenção de Genebra relativa à proteção dos civis em tempos de guerra, solicitando uma conferência para definir medidas para impor a Convenção nos Territórios Ocupados, inclusive Jerusalém.
Contudo, os Estados Unidos usaram seu direito de veto em todas as Resoluções, tirando toda e qualquer autoridade das Nações Unidas junto a Israel. 
A frustração com a incapacidade até da ONU de exercer sua autoridade fez com que o Hamas multiplicasse os atentados para ser ouvido da pior maneira imaginável.
No dia 27 de agosto, pressionado para interromper as bombas-suicidas, Bill Clinton enviou Dennis Ross ao Oriente Médio para encontrar Netanyahu e Arafat, cada um do seu lado, e Arafat depois reclamou do protecionismo exarcebado que Israel gozava nos Estados Unidos, que dava a Netanyahu vantagem e segurança para desafiar não apenas os palestinos como também as Nações Unidas.
Dennis Ross voltou para casa sem resolver grande coisa.
A despeito do assassinato de Ayyash as bombas do Hamas continuavam a explodir em Israel fazendo várias vítimas, a população vivia no mesmo pânico que os palestinos nos Territórios Ocupados, e o Partido Trabalhista resolveu parar Netanyahu escolhendo como líder Ehud Barak, outro ex-comandante da IDF. Esperando conquistar o eleitorado que havia debandado para o outro lado com a ilusão de garantia de seguridade.
Enquanto isto Arafat contra-atacava resistindo como podia e em agosto os palestinos começaram a boicotar produtos israelenses, e com isto, mais a assiduidade dos atentados, Bill Clinton decidiu enviar a Tel Aviv sua Secretária de Estado Madeleine Albright para que tentasse retomar o diálogo.
Madeleine Albright foi a Tel Aviv no dia 09 de setembro, conversou, e duas semanas depois, no dia 25, para ser precisa, Netanyahu com ou sem a bênção dos Estados Unidos, deu uma das maiores mancadas da carreira.
Ordenou o assassinato do líder político do Hamas, Khaled Meshaal, e o atentado foi um fiasco que lhe custaria caro.
O plano do Mossad (serviço secreto israelense) era banal e corriqueiro - uma mini-seringa contendo um veneno letal (que faria efeito oito horas mais tarde) seria injetado na vítima, de passagem, e o caso estaria encerrado no maior segredo, desconfiar-se-ia do Mossad, mas sem provas tudo terminaria em pizza. 
Os dois agentes israelenses entraram na Jordânia com passaporte canadense e abordaram Meshaal na porta de seu escritório em Amman como planejado. Só que ao picá-lo deram uma esbarrada mais forte do que o necessário, a presa deu o alarma, chamou a atenção do motorista que acorreu e deu uma jornalada em um dos agressores, os dois escaparam em um carro, o motorista anotou a placa e foi à caça até alcançá-los, interceptou-os com a ajuda de agentes jordanianos à paisana e ficando sabendo do fracasso, os quatro agentes de respaldo em vez de desaparecerem, como é a praxe, se refugiaram na embaixada de Israel atestando a cumplicidade.
Os agentes foram facilmente desmascarados com o depoimento de funcionários da embaixada do Canadá e vendo que não conseguiria safar-se dessa sem estrago, para limitá-lo, Netanyahu ligou para o rei Hussein para avisar da mancada e despachou para Amman o próprio chefe do Mossad para tentar limpar a barra - Dany Yaton gozava de ótimas relações com o rei Hussein desde que fora secretário militar de Yitzhak Rabin. Tanto que três semanas antes fora convidado com a família para um regata no iate do rei da Jordânia.
O rei recebeu-o escandalizado com a "traição", o choque aumentou quando lhe foi dito que Meshaal morreria em poucas horas e ficou ainda mais revoltado quando ao perguntar a Yaton como o apunhalara desta forma, recebeu uma resposta clara: "Sou um soldado. Executo ordens."
A emenda de mandar o amigo foi pior que o soneto do crime, o rei deu a conversa por encerrada e Yaton, antes de retornar a Tel Aviv entregou ao chefe do serviço secreto jordaniano o antídoto que salvaria a vida de Meshaal.
Mesmo assim o rei Hussein não se acalmava e Netanyahu despachou para lá Ariel Sharon, que tinha com  o rei da Jordânia a antipatia comum por Yasser Arafat.
No fim da conversa de três horas Israel recuperou os dois agentes desastrados, mas mediante a libertação de 37 prisioneiros políticos palestinos. Dentre eles, o sheik Ahmed Yassine, fundador e líder espiritual do Hamas.
A contrapartida exigida por Netanyahu foi uma quimera. Que Yassine dissuadisse seus concidadãos de continuar os atentados...
O bode espiatório de Netanyahu foi Dany Yaton, mas diz-se que a falha tem razões mais profundas. A arrogância desmesurada do serviço de espionagem israelense, a certeza de impunidade, e a rivalidade entre o Mossad e o Aman, serviço de espionagem da IDF.
O resultado foi a libertação de Yassine, com 61 anos, no dia 01 de outubro. Teve acolhida de herói na chegada em Gaza, e foi acolhido com respeito inclusive por Yasser Arafat.
Netanyahu logo entendeu que sua pisada de bola era brava e com Yassine de volta à arena, tentando acalmar o jogo de golpes da IDF e do Hamas, voltou a encontrar Yasser Arafat no dia 8 de outubro. Os dois homens não se viam desde fevereiro e a conversa foi aparentemente bastante civilizada. 
O Primeiro Ministro foi tão cordato que Yasser Arafat até começou um recenceamento, a fim de saber exatamente o número de cidadãos palestinos da Cisjordânia, da Faixa de Gaza e de suas necessidades.
Começou em Jerusalém, com dados simples, e o recenseamento parou lá mesmo.
Netanyahu apresentou uma lei urgente no Knesset para bloquear o processo iniciado desentendendo gregos e troianos.
Como se o simples fato dessas famílias existirem fosse menos importante do que os nomes e os dados que comprovavam que eram homens, mulheres, crianças, pessoas normais que davam duro, viviam em propriedades herdadas de seus ancestrais, possuíam bens que eram fruto de muito trabalho, embora os soldados da IDF os usassem e abusassem como se não valessem nada.

"We are frequently told that we must sympathize with Israel because of the suffering of the Jews in Europe at the hands of the Nazis.
I see in this suggestion no reason to perpetuate any suffering.
What Israel is doing today cannot be condoned, and to invoke the horrors of the past to justify those of the present is gross hypocrisy."
Bertrand Russel


Documentário Al Jazeera: Kill him softly
conta a tentativa de assassinato de Khaled Meshaal



Reservista da IDF, forças israelenses de ocupação,
 Shovrim Shtika - Breaking the Silence
Global BdS Movement: http://www.bdsmovement.net/;
Lista de produtos das colônias a serem boicotados:



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