domingo, 17 de julho de 2011

Pra não dizer que não falei das flores


Passeata de israelenses e palestinos anteontem em Jerusalém Oriental
em favor da criação do Estado da Palestina 
Caminhando e cantando e seguindo a canção, somos todos iguais, braços dados ou não...
Eu gosto muito de passeata. Desde a escola, quando a música que abre este blog era o hino da minha geração contra a ditadura que se impôs em nosso país por 20 anos. Caminhando... é a melodia que murmurro com meus botões quando vejo gente separada pelo meio em que gravita e por poucas horas unida pela vontade de melhorar o mundo em que vive. 
Geraldo Vandré (http://youtu.be/PDWuwh6edkY) faz parte daqueles compositores de carreira curta, em seu caso, podada drasticamente pelos torturadores que lhe extirparam a vontade e desonraram nossa pátria amada, salve, salve.
Vandré nunca foi Geraldo, mas foi íntimo de todos os brasileiros que têm mais de 40 anos. Como se fosse o irmão sacrificado em nosso nome. Compôs Disparada, Canção da Despedida e quantas mais maravilhas, mas imortalizou e foi imortalizado pela frase ao alto. O hino da liberdade entoado nas ruas e praças das capitais brasileiras contra o jugo do obscurantismo e pelas eleições diretas, até chegarmos, em 1984, à tahrir que buscávamos.
Passeata espontânea em Tel Aviv
contra a recente Lei Boicote
Até o ano passado, quando os reacionários engrossavam a voz e seus representantes no governo espoliavam e bombardeavam os vizinhos, os israelenses liberais, artistas, intelectuais, envergonhados, costumavam argumentar que apesar de tudo, tinham democracia e liberdade para rebelar-se e denunciar criminosos e crime. Hoje, com a aprovação do Knesset da Lei Boicote, nem isto têm para consolar-se.
Entre outras coisas, esta proíbe os cidadãos de boicotar os produtos oriundos da política de ocupação e do apartheid. O israelense que se recusar a consumir produto com etiqueta do Jordão (http://peacenow.org.il/eng/content/boycott-list-products-settlements
) será punido. E lá se vai a liberdade de ação e de expressão da qual tanto se orgulhavam. 
Gush Shalom foi a primeira organização a liderar o boicote na década de noventa e foi a primeira a contra-atacar com uma liminar junto à Corte Suprema. "Esta lei viola os princípios básicos democráticos. Com ela o Knesset procura silenciar críticas da política governamental em geral, de sua política nos Territórios Ocupados em particular e evitar um diálogo aberto e produtivo que constitui a base do funcionamento democrático. A política de silenciar só um lado é danosa para a Liberdade de Expressão e indica claramente a fragilização de um regime democrático. Além do mais, a nova lei (que também desobriga as empresas a etiquetar a origem do produto para evitar o boicote internacional, nda) prejudica empresas ao infringir sua Liberdade de Profissão, já que não permite que o consumidor diferencie os produtos de Israel e dos Territórios Ocupados." Concluindo, afirmou que o boicote é um instrumento de expressão pacífico e legítimo dos cidadãos. 
A Gush Shalom não está sozinha no desagravo. Está apoiada por outras 52 ONGs locais e por muitos compatriotas indignados.
Toda passeata por causas legítimas é bonita, mas bonita mesmo foi a da sexta-feira passada em Jerusalém. Oriental. Aqui, cidadãos de ambos os lados da Linha Verde e do muro que separa Israel e Cisjordânia se uniram e caminharam juntos pelo mesmo ideal.
Tinha mulheres, homens, crianças, judeus, cristãos, muçulmanos, unidos e provando mais uma vez ao Knesset, a Netanyahu e quem enxergasse, que têm a mesma crença na justiça que trará a paz.
O motivo da passeata era apoiar a criação do Estado da Palestina, que será decidida em setembro nas Nações Unidas.
Esta foi a primeira das passeatas que se se repetirão todas as sextas-feiras nas cidades abaixo. 
A colônia usurpadora. O SPA está longe dos olhares




As próximas cidades são Nabi Saleh, em que os colonos israelenses confiscaram a fonte que a alimentava em água para fazer um SPA;



Iraq Burin e ao fundo a colônia Har Bracha



Iraq Burin, cujas hortas são constantemente destruídas pelos colonos de Har Bracha;






Manifestação contra o muro em Budrus

 Budrus, à qual o muro havia tirado 300 hectares e 5.000 oliveiras;

O muro em Ni'lin





Ni’lin, da qual o muro cortou um terço do município para a expansão da colônia construída ao lado;





Em maio, protesto pacífico parou um buldozzer
 em Deir Qaddis




Deir Qaddis, confiscada por Israel em 1980;

Bi'lin



Protesto semanal reprimido com gás

Bi’lin, que o muro engoliu 60% da roça cultivada. Cidade precursora das passeatas semanais. Faz anos que isarelenses e palestinos manifestam e há algumas semanas um manifestante foi assassinado por um soldado;

Sheikh Jarrah, com Jerusalém ao fundo


Sheikh Jarrah, encostada em Jerusalém Oriental e que Israel quer ocupar alegando que era habitada por judeus antes de 1948 (embora não reconheça o direito dos refugiados palestinos de recuperarem suas casas cujas chaves são bem guardadas...);




Ma’sara, uma área a seis quilômetros de Belém que os israelenses querem confiscar para expandir a colônia Gush Etzion;



Beit Ummar, em que o muro separou as roças dos donos para uso dos colonos de Kamei Tsur.



Segundo ONGs israelenses, a passeata de anteontem contou com a presença de milhares de pessoas e a mobilização continua tanto do lado israelense quanto do palestino. Se a violência não esmagar a não-violência, a tendência é que o número de participantes aumente sem parar.
A obstrução de embarque de membros da Flytilha na França, por exemplo, ou da deportação expeditiva de vários participantes direto do aeroporto Ben Gurion – dos quais, 31 britânicos, “Israel ultrapassou outra linha vermelha”, disse o professor escocês de 64 anos Mick Napier, “fomos detidos e algemados no aeroporto sem nenhuma explicação e sem ter infringido nenhuma lei local ou internacional; não permitiram que telefonássemos durante todo o período de detenção. Foi uma situação fora-da-lei, ilegal.”
Depois deste depoimento, tenho de dizer em que pé está o processo para a sonhada justiça e liberdade para a qual estes ativistas e boicotadores cidadãos normais agem.
Salam Fayyad, o primeiro ministro encarregado do processo de reconhecimento do estado palestino, afirma que no dia 26 de agosto, prazo dado pela Autoridade Palestina dois anos atrás, estarão prontos para ser um Estado. Duas semanas mais tarde apresentarão a moção de reconhecimento na 66ª assembléia da ONU que decidirá seu destino. A AP já conta com 130 dos 193 países que votam. Precisam de maioria de dois terços para o reconhecimento do Estado.
Os Estados Unidos estão pressionando os outros 63 que votarão contra ou se absterão, e continuam na política do Deixa pra lá e do Deixa comigo que não faço nada, porque se vocês conseguirem algo sem meu apadrinhamento, vão acabar não conseguindo nada porque tudo que conseguirem será vetado.
Repreendem os palestinos de um lado e do outro os convocam para negociar. E a cada investida a AP repete que senta à mesa com Israel a convite dos EUA contanto que estes garantam a fronteira pré-1967 prometida por Barack Obama em discurso público, antes de recuar sob pressão da APAIC (lobby israelense), cujo dinheiro e voto o presidente-canditato cobiça para reeleger-se em 2012.
A esperança dos cidadãos que agitam Tel-Aviv e gritam “Não em meu nome!” contra o oportunismo de Obama e o sectarismo de Netanyahu, é que o movimento internacional de boicote e a mobilização das forças democráticas pacíficas israelenses e palestinas consigam derrubar o muro que os esmaga, conseguir que justiça e dormir sossegado.
Contam com os cidadãos do mundo que teriam combatido a política de limpeza étnica nazista, o massacre dos armenianos, outras atrocidades do mesmo calibre e que se levantaram, ou se tivessem idade ter-se-iam levantado, contra a África do Sul do apartheid.
Tem momentos na vida em que tomar partido não é partidarismo, é ser humano e responsável.
Vendo de um lado a diligência da ONU e dos Aliados em reconhecer o Sudão do Sul (que já obteve inclusive Forças de Paz da ONU para a proteção que Yasser Arafat pediu três décadas atrás) e outros combatentes nacionalistas, e do outro os 63 anos em que os palestinos vivem em suas terras sob ocupação e apátridas, as gerações futuras perguntarão onde estávamos, o que fizemos, e nos julgarão como julgamos os que colaboraram com injustiças passadas ou simplesmente ficaram calados.



Falando em Sudão do Sul, a independência chegou no dia 9, a festa durou, acabou e agora vem a realidade dos fatos.
O novo país está longe dos sonhos dos que lutaram nos últimos cinquenta anos para viabilizá-lo. A violência inter-tribal já começou durante as celebrações da qual o mundo participou através das imagens.
Nos bastidores visíveis, em nove das dez tribos, o vizinho virou o oponente atual (como será na Líbia?).
No início todos estavam unidos na busca da independência, mas agora chegou a hora da desunião e de cair na real, que o Norte não era responsável por todas as mazelas que viviam.
O Sudão do Sul é uma das regiões mais ricas da África (daí a presença dos EUA e muito maior da China). Porém durante o movimento independentista ninguém se preocupou com estratégica econômica nem administrativa. Agora a capital Juba está à mercê da enfermidade continental endêmica, a corrupção, e a luta pelo poder começou a fazer vítimas.
No Norte, o problema é o mesmo dos outros países da Liga Árabe. A miséria, a fome e o desemprego dos recém-diplomados. O povo está cansado de mudanças políticas infrutíferas. Omar al-Bashir já está sendo chamado de “o homem que perdeu o Sul” e está tão desesperado para conservar a presidência que dizem que está disposto até a estabelecer leis draconianas de adesão à Sharia, só para contar com o apoio das autoridades religiosas. Lá, a verdadeira campanha eleitoral está acontecendo nas mesquitas.
Sem dar uma de pessimista, sente-se no ar logo logo Norte e Sul estarão atolados em problemas maiores ainda do que os que ultrapassaram.
E o pior é que tanto no Norte quanto no Sul os políticos interesseiros sabem muito bem o que fazer para unir os cidadãos atrás de si. Um inimigo comum. E quando as coisas apertarem, é o que um e outro vai buscar o mais perto possível.
O inimigo poderá ser Abyei (uma área controvertida no meio dos dois países), o sul do Cordofão (província instável localizada no centro do Sudão), de novo o Darfur, ou qualquer outro oponente plausível.
Teme-se que cedo ou tarde os políticos politiqueiros de Cartum e Juba, interessados em si-mesmos e não no interesse público, arrumem um bode espiatório para não perderem o trono. Aí a arruaça vai recomeçar. Que a população de um e de outro aproveite a bonança precária, pois, a não ser que apareça nos dois lados um salvador da pátria com ideais incorruptíveis, pode não durar.

Para os jovens, imagens da nossa ditadura da qual foram poupados 



Lista de produtos das colônias a serem boicotados: http://peacenow.org.il/eng/content/boycott-list-products-settlements;
FLOTILHA DA LIBERDADE STAY HUMAN: http://www.freedomflotilla.eu/;
Free Gaza Movement: http://www.freegaza.org/;
Lowkey: http://youtu.be/ET6U54OYxGw;http://youtu.be/kmBnvajSfWU; http://youtu.be/GO5Cay6GUkM;
Global BDS Movement: http://www.bdsmovement.net/; http://www.bigcampaign.org/


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