domingo, 25 de outubro de 2015

Israel vs Palestina: Operações Militares VII (Wrath of God/Bayonet)

Palestina, existência destruída
1972-92...:
Operation Wrath of God ou Bayonet.
Operação-campanha conjunta IDF-Mossad de intimidações e assassinato com o objetivo de executar um a um os palestinos eminentes internacionalmente. A desculpa da ogra Golda Meir, imigrante ucraniana Primeira-Ministra de Israel de 1969 a 1974, foi a caça aos supostos organizadores do sequestro dos atletas israelenses nas Olimpíadas de Munique de 1972.
A parte de violência psicológica da operação consistiu do envio de correio-bomba a intelectuais, artistas, diplomatas e universitários palestinos em países árabes e também em Bonn, Copenhagen e até a um funcionário do Crescente Vermelho em Estocolmo.
Foi perdendo o fôlego porque o Black September, autor do atentado de Munique (Blog 01/01/12), tinha meios de retaliar da mesma maneira e retaliou. Mandou o mesmo tipo de correio a agentes israelenses no exterior e acabou matando um deles. E como Israel só respeita a violência, as cartas-bombas acabaram diminuindo até pararem por não terem como proteger-se de arma fácil de manipular até para guerrilheiros.
A intimidação não se reduzia ao correio. O telefone também era usado para ameaça e tortura psicológica não apenas contra os palestinos da diáspora como também contra ativistas europeus simpatizantes da causa do povo desapropriado. "Pare de apoiar a OLP ou sua vida está acabada!" Dizia a voz que ligava de madrugada.
A parte de violência armada, de fato, duraria anos com o nome Wrath of GodBayonet. (Com outros nomes, dura até hoje.)
O primeiro ato da Wrath of God foi o bombardeio das bases da OLP na Síria e no Líbano citados acima na Crate 3. Depois começaram as execuções sumárias sob uma pretensa "ira divina" como se Deus só se preocupasse com o bem-estar dos israelitas.
Goldar Meir aproveitou a comoção internacional causada pelo atentado nas Olimpíadas para fazer nova "limpeza" na Resistência palestina de maneira sanguinária e aleatória. Ou melhor, os assassinatos não foram indiscriminados, foram calculados; Tel Aviv queria amputar a Palestina de seus ativistas militares e também de seus intelectuais que tinham influência internacional. Talvez destes ainda mais.
A operation Bayonet foi longa e perversa. Além de balear ou bombardear suas vítimas, no mesmo dia o Em O Mossad enviava aos familiares de seu alvo flores com um cartão de condolências que dizia: "A reminder we do not forget or forgive". Depois, transmitiam um comunicado de imprensa com detalhes da vítima à mídia árabe. Tudo "anonimamente", é claro, para os palestinos não poderem exigir investigação precisa nos países em que os crimes eram praticados.
Acho que Hillary Clinton é a única mulher com cargo político proeminente que possa ser comparada a Golda Meir. Nem Margareth Thatcher foi tão obtusa e inclemente. Golda Meir foi mais um "bom" exemplo de maudade para Ehud Barack, Ariel Sharon, Binyamin Netanyahu, Evigdor Lieberman e os cupinchas destes homens implacáveis.
O suposto chefe de operações do Black September, Ali Hassan Salameh, kunya* Abu Hassan, que os israelenses apelidaram "Red Prince", encabeçava a lista da Primeira Ministra que encarregou os generais Zwi Zamir e Aharon Yariv de formar um Esquadrão da Morte para levar a cabo os homicídios.
O Esquadrão era composto de 15 agentes do Mossad divididos em 5 grupos. Cada um recebeu o nome de uma letra do alfabeto hebraico. Aleph (a primeira) consistiria de 5 assassinos; Beth (segunda) consistiria de dois guardas do grupo Aleph para proteção em fuga e em apoio eventual. Heth (8a) cuidaria da logística - passaportes, alojamento, transporte. Ayin (16a letra) consistiria de seis a oito assassinos que caçariam a vítima e montariam a armadilha para Aleph agir, e depois, apoiariam a fuga. Qoph (19a) teria dois agentes de comunicação. O sistema funcionou bem. Sobretudo por não haver preocupação com erros, perdas colaterais nem proteção de inocentes. E sobretudo, pela certeza de impunidade para os crimes.

1972
Julho: No dia 25, Bassam Abu Sharif, membro do FPLP - Frente Popular para Libertação da Palestina - recebeu um pacote pelo correio em Beirute e o abriu. Era o livro de Memórias do Che Guevara. Ao abri-lo, a bomba do Esquadrão da Morte do Mossad explodiu. Ele perdeu um olho, quatro dedos e ficou surdo de um ouvido, além de outros ferimentos graves. Foi deixado por morto, mas sobreviveu. Em 1987 passaria do FPLP para o Fatah, seria um dos conselhereiros de Yasser Arafat junto ao qual passou a advogar a solução de Resistência não-violenta e dos Dois Estados. 
Outubro: No dia 16 os assassinos israelitas crivaram 12 balas (11 mortos em Munique + 1) no corpo de Wael Zwaiter (foto ao lado) em Roma, embora a OLP negasse sua participação em operações militares. Wael tinha 40 anos e era primo de Yasser Arafat. Era formado em literatura e filosofia na Universidade de Bagdá, trabalhara na embaixada da Líbia como tradutor e era o representante da OLP na Itália. Quando foi assassinado estava traduzindo para o italiano o livro Mil e Uma Noites. Todos que o conheceram foram contundentes na descrição de um homem que abominava violência. Só queria poder retornar a Nablus, sua cidade natal e viver em paz em seu território nacional.
Dezembro: No dia 08 foi a vez de outro intelectual: Mahmoud Hamshari, representante da OLP na França. Um agente do Mossad se fez passar por um jornalista italiano para tirá-lo de casa e uma equipe de demolição instalar uma bomba debaixo de seu telefone. Hamshari ficou consciente o tempo suficiente de relatar o acontecido ao detetive que acorreu ao chamado à polícia. Morreu no hospital algumas semanas mais tarde. Ele também não tinha nenhuma conexão com Munique e seu crime "jamais foi solucionado".
A terceira execução do ano foi em Londres, onde um ativista palestino foi empurrado debaixo de um ônibus.
Sua sobrinha Rana Abdullah o homenagearia em 2010r, escrevia o este artigo em 2013 no seguinte artigo: http://www.palestinechronicle.com/i-knew-a-hero-once-my-uncle-mahmoud-in-my-memory-40-years-on/.
1973
Janeiro: Na noite do dia 24 Hussein al Bashir, representante do Fatah em Chipre, acendeu a luz de seu quarto no Hotel Olympic em Nicosia e alguns minutos depois a bomba posta embaixo de sua cama foi acionada por controle remoto o matando e destruindo todo o aposento. Israel suspeitava, sem certeza alguma, que ele fosse o líder do Black September em Chipre. Não havia prova disso. Há um boato que ele foi executado por causa de seus laços com o KGB soviético.
Abril: No dia 06 foi a vez de Basil al-Kubaissi, professor de Direito na American University of Beirut. Para justificar sua execução que revoltou o meio acadêmico inteiro, Israel disse que suspeitava que o intelectual palestino estivesse envolvido em "complôs", sem nem se dar ao trabalho de precisar quais ou de isentar-se do crime. Basil foi baleado em Paris quando voltava para casa após o jantar. Também foi baleado 12 vezes pelos dois assassinos do Aleph.
Mini Operation Spring of Youth:
Abril: Na noite do dia 09 os assassinos mataram três resistentes palestinos da pesada que viviam em Beirute em residências bem guardadas. Estes sim eram operadores preparados e não desprevenidos intelectuais vulneráveis, fáceis de ser executados.
Para estes três o Esquadrão da Morte apelou para a IDF que mandou três brigadas - Sayeret Matkal, Shayetet 13 e Sayeret Tzanhanim. Os soldados desembarcaram no litoral do Líbano em barcos, foram acolhidos pelos agentes do Mossad que os transportaram, em carros alugados, ao local em que seus "alvos" se encontravam.
O primeiro a ser executado foi Muhammad Youssef al-Najjar (de camisa branca na foto) de 43 anos, chefe de operações do Black September. Uma palavrinha sobre ele. Sua vida não tinha começado nem no exílio nem com violência. Abu Youssef nasceu em Yibna, na Palestina, em 1930. Yibna era um vilarejo de 5.420 habitantes que faz parte das dezenas de cidadezinhas palestinas "despopuladas" em junho de 1948. Muhammad tinha 18 anos quando presenciou o massacre de parentes, vizinhos, a destruição de seu lar e o espedaçar de sua família e as de seus amigos. Dois anos mais tarde, com 20 anos, aderiu à resistência na União Geral dos Estudantes Palestinos (como a UNE brasileira) - criada em 1920 e reativada pelos refugiados no Cairo em 1959. Foi neste ano de 1959 que Abu Youssef participou da fundação do FATAH, acrônimo reverso de Harakat al-Tahrir al-Watani al-Filastini, literalmente,  "Movimento de Libertação nacional da Palestina". Integrou a ala militar do partido, e em 1968, o comitê executivo da OLP. Em entrevista ao jornal libanês L'Orient Le Jour, explicou sua militância: "We plant the seeds, and the others will reap the harvest... Most probably we'll all die, killed because we are confronting a fierce enemy. But the youth will replace us."
A execução de Abu Youssef desmente, se fosse necessário, a 'humanidade' que Steven Spielberg atribuiu aos agentes-assassinos do Mossad em seu filme Munique. Ele e a esposa foram baleados na cama sem piedade. Dois policiais libaneses e um cidadão italiano também foram mortos durante o atentado. Efeitos colaterais, é o nome dado às vítimas deste tipo de barbaridade.
Depois de Abu Youssef a gangue Mossad/IDF passou para Kamal Adwan, membro do comitê central do Fatah e um dos chefes de operações da OLP. Kamal nasceu em 1925 no vilarejo de Barbara. Ao ser despossuída, sua família virou refugiada na Faixa de Gaza. Entrou na Resistência à ocupação israelense em 1956, estudou Engenharia no Cairo e foi um dos fundadores do Fatah e da OLP.
Em seguida, no mesmo dia 09 foi a vez do terceiro desta lista - Kamal Butros Nasser (à esquerda de Arafat), membro do comitê executivo e porta-voz da OLP. Era um intelectual e não um operador militar. Uma palavrinha sobre ele. Kamal Nasser era poeta e escritor. Em outras circunstâncias, se tivesse nascido em uma Palestina que continuasse autônoma e livre, seria chamado de humanista. Nasceu em uma bela cidadezinha antiga em 1925, Bir Zeit. Fica perto de Ramallah e a grande maioria de seus habitantes é cristã. Aliás, Kamal Nasser era cristão praticante. Formou-se em Ciências Políticas na American University of Beirut em 1945, foi professor durante seus estudos de Direito em Jerusalém, depois resolveu ser jornalista. Exercendo o ofício de repórter adquiriu consciência que o levou ao ativismo. Foi editor do jornal Al-Ba'ath de Ramallah e depois criou um jornal militante al-Jil al-Jadid (A Nova Era). Em 1956 foi eleito deputado pelo distrito de Ramallah, mas sua vida parlamentar foi curta; foi logo expulso. E em 1967, Israel o expulsou também da Cisjordânia. No exílio, continuou sua carrerira jornalística editando o jornal Filastin al-Thawra da Organização de Libertação da Palestina. Seu talento e seu potencial intectual já eram conhecidos e lhe valeram um assento de conselheiro no Comitê Executivo da OLP de 1969 a 1971 e a responsabilidade de ser porta-voz de Yasser Arafat. O auditório principal da Universidade Birzeit, uma das melhores da Palestina, tem seu nome. Um dos autores deste atentado que tirou a vida desse brilhante palestino foi um soldado que seria general e primeiro ministro de Israel - Ehud Barak - disfarçado de mulher.
Na verdade, como disse acima, Israel aproveitou esta operação de vingança para exterminar não apenas os resistentes militares como também as cabeças pensantes da OLP e os homens de confiança de Yasser Arafat.
Três outros assassinatos seguiram este grande aparato armado no Líbano.
No dia 11 o Esquadrão da Morte do Mossad executou Zaiad Muchasi - que substituíra Hussein al-Bashir em Chipre - com uma bomba em seu quarto em Atenas.
No mesmo dia, em Roma, Abdel Hamid Shibi e Abdel Hadi Nakaa escaparam da morte por um triz.
Junho: No dia 28, Mohammed Boudia foi executado em plena rua em Paris. O caso de Boudia foi à parte porque ele não era palestino. Era um argelino simpatizante da causa de libertação da Palestina. Era o representante da Frente Popular de Libertação da Palestina na Europa, por onde circulava livremente. Ele também entrou na militância pela consciência. Combateu os franceses durante a luta pela independência da Argélia e depois ficou quieto exercendo sua profissão de dramaturgo e chegando a diretor do Teatro Nacional da Argélia. Até o golpe de Estado de Houari Boumediène em junho de 1965 quando teve de fugir da Argélia por correr risco de vida. Exilou-se em Paris onde dirigia um teatro e fez amizade com o famoso ativista extremista venezuelano que ficou conhecido como Carlos, o chacal. Daí ofereceu seus préstimos às organizações palestinas para ajudá-las em sua luta por un Estado independente. Morreu com 41 anos. As execuções não pararam nele.
Julho: No dia 21, o Mossad cometeu um erro crasso no lugar errado. Programou uma de suas execuções na Noruega. Desta vez, pensaram que Ali Hassan Salameh tivesse se refugiado em Lillehammer, uma cidadezinha de lá, mas deram com os burros n'água. Como mostra os vídeos abaixo, no lugar de Abu Hassan, mataram o marroquino Ahmed Bouchiki, totalmente alheio à luta palestina. Ao contrário da Itália e da França que assistiram aos assassinatos de braços cruzados, a polícia da Noruega caçou os agentes do Mossad e dos 15, prendeu, julgou e condenou 7 deles. As penas variaram, mas tiveram de ser cumpridas. Daí a interrupção de cinco anos nos assassinatos.
Na época o fora virou um escândalo que ficou conhecido como Lillehammer Affair.
Mossad: Death in Lillehammer (17' os dois episódios)
1978
Janeiro: Golda Meir não era mais primeira ministra, o general Yitzak Rabin do Partido Trabalhista sucedera de 1974 a junho de 1977 período de pausa na Wrath of God. Seu substituto do Likud, general Menachen Begin, retomou a Bayonet no dia 04 de janeiro de 1978 aprovando o assassinato de um intelectual palestino, Said Hammami, representante da OLP em Londres. Said foi baleado em seu escritório e seus assassinos escaparam sem dificuldade. Uma palavrinha sobre ele.
Said nasceu em Jaffa em 1941. Durante a Naqba sua família conseguiu escapar para o Egito antes de instalar-se no Líbano e depois na Jordânia, quando compreenderam que não poderiam voltar à pátria nem ao lar ancestral. Seu pai abriu uma mercearia e deu duro para os filhos terem bons estudos. Said fez universidade em Damasco onde afiliou-se ao partido Ba'th. Foi aí que começou a interessar-se por política. Formou-se em inglês e em literatura e começou a trabalhar como jornalista. Depois foi ser professor na Arábia Saudita, onde ficou pouco porque sua devoção à causa palestina o levou de volta a Beirute. Entrou na OLP em 1964 e galgou os escalões depressa. Entrou no Conselho Nacional aos 30 anos. Era um intelectual brilhante; por isso Yasser Arafat o enviou a Londres como primeiro embaixdor da OLP em 1973. Ele foi o primeiro membro da OLP a manifestar publicamente a resignação da OLP à solução dos dois Estados em entrevistas em 1974 e 1975. Em Israel sua declaração caiu como uma bomba, já que Golda Meir e seus cúmplices locais e internacionais haviam inventado uma teoria mirabolante que os  "Palestinians are not a distinct entity with a legitimate identity". Tel Aviv tinha mais medo dos palestinos quando emitiam ideias coerentes e convincentes em capitais ocidentais do que de seus atentados. Ora, os atentados chocam e passam. Ideias convencem a médio, a longo prazo e proliferam. Este foi o crime de Said Hammami. Pensar e falar bem no lugar certo a pessoas que o escutavam. Devido ao seu temperamento aberto e à sua vasta cultura, fez amizades e relacionava-se com facilidade com jornalsitas, políticos, diplomatas e com ativistas de Direitos Humanos, inclusive israelenses. Uri Avnery, ex-deputado trabalhista e jornalista do Haaretz chegou a escrever um livro em sua homenagem: "My friend the Enemy". Bela declaração de respeito e amizade entre dois intelectuais humanistas. Infelizmente, foi justamente por causa dessas qualidades que Said foi assassinado. Era claro que seu nome não tinha porquê estar na lista negra do Esquadrão da Morte, mas foi executado assim mesmo. Não por ter aderido à luta armada e sim pelo contrário, por seu discurso justo, bem articulado. Foi executado covardemente em seu escritório, certamente sem ter tido a chance de usar a única arma que possuía, a palavra, à qual de qualquer jeito seus assassinos deviam ser impermeáveis.
Agosto: No dia 03, foi a vez de seus colegas Ezzedine Kalak e Hamad Adnan serem executados do mesmo jeito, em Paris. Eles eram respectivamente chefe e vice da representação diplomática palestina em Paris. Eles usavam escritórios no prédio da Liga Árabe e seus assassinos feriram também um funcionário palestino e três de doutros países.

Quanto a Abu Hassan, continuava solto e levando uma vida social agitada, ao ponto de casar-se em segundas núpcias  1978  com a única Miss Universo que o Líbano teve, a cristã Georgina Rizk com quem morou uns tempos na Califórnia até ela engravidar e retornarem a Beirute. Talvez nos EUA perdera o costume precaver-se ao extremo, talvez contasse com a proteção da CIA, sabe-se lá porque acabou ficando imprudente e circulava à vontade sem grandes preocupações de segurança básica como mudança de horário, itinerário, residência. Talvez fosse por estar cansado de viver em sobressalto, e quem sabe, por ser (supostamente) o intermediário entre Arafat e a CIA (com o compromisso de não praticar nenhum atentado contra cidadãos estadunidenses) e achar que por isso era menos vulnerável. O fato é que com o tempo baixaria a guarda.
The Office (apelido interno do Mossad) chamou a caça de Abu Hassan The Chase for the Red Prince. Chase que duraria oito anos.
Uma palavrinha sobre Abu Hassan antes de ele ser executado. Nasceu Ali, na Palestina em 1940. Em Qula, perto de Jaffa. Era filho de pais abastados. Seu pai, o sheik Hassan Salameh, foi assassinado por uma bomba do Hagannah durante a Naqba, em 1948. Ali tinha apenas 8 anos quando os sobreviventes de sua família engrossaram a diáspora. Foram parar na Alemanha, onde foi criado. Depois aderiu à OLP e foi treinado no Cairo e em Moscou, daí o Mossad apelidá-lo Príncipe Vermelho. Por ser rico, bem articulado, e de tendência socialista, apesar de bon vivant milionário. Diz a velha guarda que Yasser Arafat gostava dele como de um filho brilhante, mimado. Na intimidade do Fatah brincavam que ele era o playboy cop de Abu Ammar (Yasser Arafat) que era o ídolo de Ali Hassan desde a infância devido à perda do pai. 
1979
Janeiro: No dia 23, o Mossad e a IDF alcançaram Ali Hassan Salameh em Beirute. Seu carrro explodiu na rua. A bomba era tão potente que matou também quatro passantes incluindo um adolescente e uma inglesa de 34 anos. Feriu mais 16, inclusive uma freira que se encontrava na vizinhança. Abu Hassan tinha 36 anos.
A bomba explodiu às 15:35, hora de pico no setor oeste de Beirute. Seu carro estava na rua Itani, saindo de sua casa quando passou devagar, por causa do trânsito, por um volks estacionado e carregado de 100 quilos de TNT. Quando os dois carros ficaram a lado a lado o assassino apertou o botão acionando o mecanismo de explosão à distância. O veículo de Hassan saltou pelos ares, alguns metros para trás. Um pedaço de metal perfurou seu cérebro, outro um olho, além de outros ferimentos. Seus três guarda-costas também não tiveram nenhuma chance de escapar. A explosão rebentou todos os vidros da rua e o pavimento. Hassan foi carregado para o hospital consciente com dores horríveis dos ferimentos. Foi carregado para o American Hospital de Beirute onde morreu na mesa de operação às 16:03.
Ao ouvir e sentir o efeito material da explosão, vários guardas saíram de seu apartamento ao lado dando tiros para o alto e os militantes que estavam no escritório do Fatah na quadra abaixo também acorreram armados, fechando o perímetro do atentado. Porém, os assassinos já haviam escapado.
O volks usado para o assassinato foi alugado no nome do cidadão britânico Peter Hugh Scriver. O carro já fora usado em outro atentado em 1973 a cem metros desse. Suspeitou-se que Scriver fosse o agente do Aleph de codinome Jonathan Ingleby que sempre usava identidade britânica. Seu passaporte foi registrado no aeroporto de Beirute vindo da Suíça no dia 17, mas nenhum registro de saída foi encontrado. O outro suspeito identificado como Erica Maria Chambers alugara um apartamento na rua, de onde certamente acionou a bomba, ou então, seu colega hospedado no Royal Hotel, na mesma rua, com o nome de Ronald Kolberg.
Os serviços de inteligência libanês e do Fatah logo identificaram outros suspeitos e reconstituíram a trama. A primeira do Esquadrão da Morte a chegar em Beirute foi a denominada Erica Maria Chambers que alugou um apartamento perto do de Abu Hassan a fim de vigiar seus movimentos. O tal Scriver foi encarregado do carro e dos explosivos. Depois foi só esperar o momento propício e Chambers ou Kolberg acionar a bomba. Logo depois da explosão a tal Erica Chambers desceu correndo com sua maleta e encontrando o porteiro disse-lhe, simulando medo: "I can't stand it any longer. This area is no longer safe to live in". Quando os guardas chegaram ela já desaparecera por mar ou pelo sul do Líbano com outra identidade.
Yasser Arafat e outros líderes palestinos estavam em Damasco em uma reunião parlamentar da OLP no exílio. Logo que souberam da notícia acusaram Israel e puseram suas forças militares em Beirute em estado de alerta antes de voltarem.
Em Israel: "No comment", era a palavra de ordem, embora todos soubessem que o modus operandis era o do Mossad, cujos agentes usaram passaportes estrangeiros roubados.
Abu Hassan foi enterrado em Beirute no dia 24 de janeiro em um funeral com mais de vinte mil pessoas. Recebeu homenagem dos líderes da OLP em peso. Yasser Arafat foi um dos que carregaram o caixão aos prantos, profundamente abalado com a morte do jovem camarada que considerava "one of my dearest children". No enterro, Hassan, filho de Ali de 13 anos, de khefieh na cabeça, apoiado no "avô" Abu Ammar, jurou, de lágrimas nos olhos, que continuaria a luta do pai.  
Ali Hassan Salameh para a mídia, Abu Hassan para os amigos, Red Prince para seus inimigos, virou mito ainda vivo.
Mito vivo e morto em Israel, em que foi um dos homens mais detestados, procurados e talvez até admirado, já que foi até apelidado. O nome Red Prince passaria de boba em boca, a vários livros, e à posteridade.
Virou mito também no Ocidente, onde vários livros foram escritos sobre sua personagem que fascinava por sua alegria, inteligência e leviandade em um mundo de cara-fechada onde o perigo rondava. Até Steven Spielberg parece admirá-lo através das lentes dos fusis dos assassinos do Mossad que o perseguem em seu filme Munich.
Na Palestina, ele foi e é um dos resistentes mais elogiados e admirados da OLP.
Eis abaixo um tributo que lhe foi prestado em um vídeo mixto de cenas de filme e reais de atualidade. 

Julho: Após Abu Hassan, no dia 27 de julho de 1979 o Esquadrão da Morte assassinou Zuheir Mohsen (ao lado) em Cannes, no sul da França. Zuheir era um dos chefes das operações militares da OLP. Nasceu em Tulkarm na Palestina em 1936. Seu pai era prefeito da cidade e durante a Naqba a família refugiou-se na Jordânia. Ele começou a envolver-se em política aos 17 anos, formou-se em pedagogia e começou a lecionar. Foi preso por "atividades subversivas", depois mudou-se para o Qatar e de lá foi deportado para Damasco onde entrou no Fatah como secretário geral local. Estava em Cannes a passeio, despreocupado. Quando viu a morte chegar, era tarde.
Dezembro: No dia 15 de dezembro foi a vez de Ali Salem Ahmed e Ibrahim Abdul Aziz. Foram assassinados em uma rua de Chipre, baleados à queima-roupa, como outros antes e como outros que veremos no próximo capítulo desta operação israelense de assassinatos.
Operation Wrath of God 
1973
Voo 114 da Lybian Arab Airlines. Para fechar a década de setenta sem perturbar a ordem da Operação Wrath of God - que durou 16 anos com este nome e prosseguiria nos anos seguintes com outro nome e modus operandis - deixei este "incidente" aeronáutico para o fim da página.
O 114 era um voo regular de Tripoli (Líbia) para o Cairo via Benghazi. O avião perdeu-se por causa do mau tempo e falha técnica e foi parar na Península do Sinai, então sob controle israelense.
A IDF enviou dois F-4 à sua caça com ordem de derrubá-lo sem aviso prévio e as ordens de Tel Aviv foram cumpridas ao pé da letra.
Dos 113 passageiros a bordo, apenas cinco sobreviveram. Dentre estes, o co-piloto que pôde prestar depoimento do erro de pilotagem e da falta de sorte que valeram a execução sumária de 108 pessoas. Todas mortas por causa da paranóia de segurança e as prerrogativas de vida e de morte de estrangeiros que apenas Israel e os Unidos têm direito.
Documentário BBC: Operation Bayonet
Notas
Kunya - Teknímico comum na Jordânia, Síria, Líbano, Palestina, para referir-se aos pais pelo nome do filho primogênito. No caso Abu (pai) ou Umm (mãe) de....  Como por exemplo, Abu Ammar (Yasser Arafat); Abu Mazen (Mahmoud Abbas); Umm Jihad (Inssitar al-Wazir); etc. São usados sempre na vida social e profissional. Como o patronímico é a referência nominal na Rússia, como por exemplo, Mikhail Sergueievitch (filho de Serguei; para Gorbatchev) e Vladimir Vladimirovitch (filho de Vladimir; para Putin).
** Fedayin (singular, feda'i - quem arrisca a vida voluntariamente / aquele que se sacrifica). Termo que os Ismaelitas adeptos do 'Velho da Montanha' fundador do Estado Alamût  usavam na Idade Média.

Aliás este dissenssor xiita indiano criou, sem querer, um adjetivo que se proliferaria nas línguas greco-romanas: assassino, proveniente da palavra árabe asâs, base/fundamento. Este senhor Hassan ibn al-Sabbah chamava seus seguidores de assassiyun - literalmente, 'quem é fiel a assas', ou seja, à base ou ao fundamento da fé. Palavra mal-entendida pelos ocidentais durante as cruzadas que a interpretaram à sua maneira, já que designava os combatentes que os matavam.
 

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