domingo, 10 de fevereiro de 2013

Israel vs Palestina: História de um conflito - XXVIII (06 2002)


O mês de junho de 2002 foi cheio de explosões de cá e de lá da Linha Verde.
O dia primeiro chegou com o estardalhaço de bastões de dinamite em um santuário.
Desta vez, o alvo da IDF foi a antiga igreja cristã ortodoxa Santa Bárbara. Após ter acolhido fiéis durante séculos, foi reduzida a um monte de pedras esmigalhadas.
A igreja jamais seria restaurada, mas o pedregulho esparramado viraria fonte de pedras miúdas que abasteceriam jovens cristãos e emuçulmanos durante a Intifada.
No dia 03, em sinal de boa vontade, a Autoridade Palestina anunciou que Ahmad Saadat, chefe da FPLP (Frente Popular de Libertação da Palestina), seria mantido preso em Jericó, sob tutela internacional. Embora dois dias antes o Supremo Tribunal local tivesse autorizado sua liberdade.
Este esforço impopular de Yasser Arafat não serviu para nada.
No dia 04, a IDF resolveu terrorizar os hebronitas com repressão debroda. O objetivo era pressionar ainda mais o líder palestino.
O centro autônomo da maior cidade do sul da Cisjordânia foi re-tomado por dezenas de soldados que impuseram toque de recolher e foram de loja em loja fechando comércio e forçando os habitantes a trancar-se em casa ou esvaziá-la para que a IDF a ocupasse à vontade.
Hebron não foi a única a sofrer com a nova onda de assaltos do início de junho.
Jenin e Nablus, re-invadidas uns dias antes, continuavam sob toque de recolher e com as ruas dominadas por veículos militares.
No dia 05, a resposta das forças de resistência foi contundente. Um carro-bomba explodiu contra um ônibus militar perto do presídio de Meggido - cidade israelense próxima da Linha Verde, e de Jenin. Dezessete pessoas morreram, na maioria soldados, e cerca de trinta civis e militares foram feridos.
No dia seguinte, a IDF pegou pesado para vingar-se.
Durante a noite, suas tropas invadiram Ramallah com cerca de 50 tanques e caterpillars armados enquanto Apaches voltavam a torpedear a Mukata'a, assistidos pelos veículos de solo.
A equipe de segurança do líder palestino estava reduzida, sem munição suficiente para defender-se e no final do ataque surpresa, sete pessoas tinham sido atingidas em cheio e dois guarda-costas de Arafat jaziam sem vida.
O líder palestino saiu desta fisicamente ileso. Mas partes da Mukata'a, cuja restauração mal começara, mas já progredira bastante, vieram de novo abaixo e o prejuízo foi grande.
Ariel Sharon queria infligir pena humana. Mas concomitantemente à humilhação e sofrimento, queria causar danos materiais e aniquilar o moral do presidente da Autoridade Palestina e dos seus concidadãos.

O general israelense estava à vontade para agir porque sabia que contava com o apoio dos Estados Unidos - no dia 08, George W. Bush, ao receber o presidente do Egito Hosni Mubarak, declarou não estar pronto para estabelecer nenhum calendário para a criação do Estado da Palestina, com o qual seu embaixador na ONU concordara previamente. Para completar, insistiu na necessidade de reformas institucionais que "devolvessem esperança ao povo palestino e declarassem ao mundo a possibilidade de vencer o terror e viver em paz."
No mesmo dia, houve uma passeata em Genebra condenando o retrocesso inclusive no discurso. Centenas de pessoas foram às ruas manifestar solidariedade com o povo palestino e tentar mostrar ao presidente dos Estados Unidos que além de condenar os atos violentos da resistência, tinha de condenar também o terror de Estado que os resistentes palestinos combatiam através de seus atentados suicidas artesanais.
Em Ramallah, pressionado por Bush, Yasser Arafat remanejou seu governo no dia 10. Foi a primeira etapa de um projeto de reformas destinadas a demonstrar aos aliados de Israel que ele estava pronto a tudo para seu povo viver livre e em paz.
Diminuiu o número de ministros de 31 a 21. O que não era mal. Mas no processo de conciliação forçada, teve de engolir dois sapos. Um passável e outro intragável.
Entregou o Ministério do Interior ao general Abdelrazak Yahiya, ex-negociador com Israel. E o da Economia a Salam Fayad, então diretor do banco da Palestina e ex-representante local do Fundo Monetário Internacional.
Dobrou-se à exigência de moderar seu governo nomeando candidatos "sugeridos" pelos mediadores ocidentais que não satisfaziam nem o Fatah inteiro. Quem dirá a FPLP, o Jihad islamita e o Hamas. Estes três grupos declararam logo sua insatisfação e o prosseguimento da luta armada.
Quanto a W. Bush, ao receber pela sexta vez Ariel Sharon na Casa Branca, declarou que ninguém confiava no governo palestino recém-nomeado... Pois, o que ambos queriam mesmo era livrar-se de Yasser Arafat.
Trocando em miúdos, Arafat se indispôs com seus aliados nacionais para nada.
Para nada, não. Este passo claudicado tornaria mais fácil a manobra de W. Bush e Sharon para isolá-lo.
No dia seguinte, Sharon não cedia em nada. Ramallah continuava sitiada, sob toque de recolher ainda mais restrito e a Mukata'a estava cercada de tanques enquanto caterpillars armados demoliam estruturas vizinhas para facilitar suas operações militares.
No campo de refugiados de Am'ari, nos arredores da cidade, a investida da IDF terminou com uma morte e vários feridos. E suas incursões intimidativas não se limitavam a Ramallah, Hebron, Jenin e Nablus, recentemente reocupadas. Em Turkarm, os tanques entraram pelo norte da cidade impondo toque de recolher aos cem mil habitantes e como sempre, causando grandes estragos materiais.

No dia 12, um bomba-suicida explodiu levando consigo outro homem e deixando para trás quatroze feridos em Herzliya, perto de Tel Aviv. No fim da estadia de Ariel Sharon em Washington.
Yasser Arafat condenou o atentado em território israelense dizendo que "forneciam ao governo israelense pretexto para agredir nosso povo e prosseguir seus planos de ocupação".
Entretanto, não emitiu nenhuma reprovação aos atos militares da resistência dentro dos territórios ocupados...
No mesmo dia, mais cinco palestinos foram mortos - um deles tinha oito anos. E duas crianças foram feridas junto com vários adultos atingidos no mesmo bombardeio do bairro Mughraqa.
E cinco gazauís foram abatidos pela IDF perto da colônia Netzarim, no centro da Faixa de Gaza. "Antes que cometessem um atentado". O ataque retaliativo frustrado foi reivindicado por dois grupos resistentes ligados ao Fatah. A FDLP (Frente Democrática de Libertação da Palestina) e as Brigadas Al-Aqsa.
De Londres, Tony Blair pediu ao general Ariel sharon que relançasse "depressa o processo político"... 
Em resposta ao Primeiro Ministro britânico, a IDF sequestrou dois próximos de Arafat em minuciosas operações militares.
Abdelrahim Mallouh, vice-líder da FPLP e membro do comitê executivo da OLP, em plena Ramallah. Abdelbassat Chawabkeh, secretário geral do partido em El-Bireh, nesta cidade vizinha de Ramallah. 
Nesse mesmo dia tumultuado, o jornal árabo-ocidental Al-Hayat publicou uma entrevista com Colin Powell. Nesta, o Secretário de Estado dos EUA dizia que W. Bush seria favorável à criação de um "Estado Palestino temporário", como etapa transitória para o estabelecimento de um Estado de fato. Este eventual Estado, segundo Powell, "provisório" ou " interino", teria de comportar uma estrutura, insitutuições, algo que unisse o território mesmo sem este ser definitivamente definido".
A afirmação era mais do que ambigua e soou aos palestinos como mais uma armadilha.
Soou mal não apenas aos palestinos.
No dia 13, a Anistia Internacional entrou em cena. Mas não contra Israel diretamente. Contra a Autoridade Palestina. Exigia que esta libertasse o chefe da FPLP Ahmad Saadat e que Israel não o executasse sumariamente, em sua saída da prisão.
Pois estava preso também para sua proteção. Israel suspeitava que fosse o mandante do assassinato do ministro israelense do turismo Rehavam Zeevi; por isso, solto, sua vida não valia grande coisa, com os agentes israelenses à espreita para aplicar logo de cara a pena de morte.
Saëb Erakat, negociador de paz desde os Acordos de Oslo, aproveitou a deixa para pedir que a comunidade internacional inerviesse junto a Israel para que soltassem Abdelrahim Mallouh.
Mas seu apelo caiu em ouvidos moucos.
As autoridades estrangeiras continuavam quietas ou pressionando Arafat enquanto a IDF continuava a devastar as cidades palestinas com a desculpa de "procurar terroristas" e os danos humanos e materiais se acumulavam.
A impotência diplomática fez com que a resistência voltasse à carga. Mas dentro de seu território ocupado.
No dia 15, um bomba-suicida explodiu na colônia judia Dugit, na Faixa de Gaza, levando consigo duas pessoas.
No mesmo dia, os palestinos receberam mais uma má notícia.
Entre bombardeios dos Apaches e dos F16 e demolições dos caterpillars D9, a situação socio-econômica estava crítica. Mesmo assim, a União Europeia bloqueara a subvenção de 18.7 milhões de euros prometida. "Até a Autoridade Palestina explicar direitinho em que seria investida".
Enquanto os fundos palestinos tinham de ser conferidos até o último centavo para não serem "desviados" em armas que garantissem sua defesa, Israel recebia patrocínio ilimitado dos Estados Unidos para continuar suas campanhas de sítios e bombardeios.
O dia seguinte seria uma data fatídica. 
No Knesset, duas comissões parlamentares renovaram o Estado de Emergência em que Israel vivia desde sua criação unilateral 54 anos antes.
O Estado de Emergência é uma medida tática que permite ao governo prerrogativas de impor, nos Territórios Palestinos, quaisquer medidas institucionais que julgar "urgentes". Desde o toque de recolher a sequestros, detenções administrativas, sem nenhuma garantia judiciária. Do seu lado da Linha Verde, permite a requisição de grevistas nos setores julgados vitais e outorga aos governantes poderes absolutos.
Mas a renovação do Estado de Emergência não foi o pior desse dia.
Isto é, foi graças a ele que o pior aconteceu sem que ninguém reagisse.
Foi nesse dia, 16 de junho de 2002, que Israel começou a construir o muro da vergonha. Chamado em Israel de Muro de Defesa e na Palestina de muro de separação.
Qualquer que fosse o nome do muro, em princípio, deveria ser traçado em cima da Linha Verde, que separa Israel da Cisjordânia.
Só que a primeira etapa de 130 quilômetros já abocanhava grande extensão de terras do outro lado.
No mesmo dia, durante troca de tiros entre a resistência e soldados perto da colônia de Dugit, no norte da Faixa de Gaza, dois soldados morreram e quatro foram feridos.
No dia 17, a IDF abateu mais um expoente da OLP e Saëb Erekat, que era também ministro dos municípios, lamentou mais este assassinato "da campanha de eliminação dos ativistas palestinos".
Mas o acontecimento do dia foi o governo de Israel reconhecer nas entrelinhas que seu objetivo era "descartar" o presidente palestino Arafat eliminando todos os seus homens de confiança da OLP e do Fatah. Segundo Sharon, "para que novas lideranças emergissem".
O assassinato de Walid Sbeih - um dos líderes das Brigadas Al-Aqsa assassinado aos 39 anos por um sniper da IDF perto de Belém - foi "vingado" junto com os de outros dirigentes da OLP em uma onda de atentados sucessivos dos dias 18 ao 22 de junho.
A resistência agiu segundo a praxe nas organizações ligadas ao Fatah, que em suas ações militares visavam civis e soldados que ocupavam suas terras na Cisjordânia e na Faixa de Gaza.
Em 72 horas, levaram a cabo ataques coordenados em colônias judias de Jerusalém e próxima de Nablus cujos moradores azucrinavam os nabluenses noite e dia. Trinta e um israelenses perderam a vida.
No dia 19, enquanto cerca de cinquenta intelectuais palestinos, dentre eles a deputada Hanan Ashrawi (foto ao lado), próxima de Yasser Arafat, publicavam um Abaixo Assinado no jornal Al Quds, no qual solicitavam que as células de resistência parassem os ataques contra os civis israelenses.
Enquanto isso, Ariel Sharon anunciava outra Operação militar retumbante contra os palestinos.
Esta foi chamada de מבצע דרך נחושהDetermined Path. Que poderia ser traduzido como "Via Determinada".
A ODP deveria restringir-se ao norte da Cisjordânia, mas acabou descendo até Hebron, como se o quotidiano insuportável em que os hebronitas viviam e vivem não bastasse.
Mas a população israelense ainda ignorava o que acontecia em Hebron, não acreditava nas notícias da selvageria da IDF em Nablus, Jenin e outros lugares, e só se preocupava com os caixões dos compatriotas mortos que velavam.
Neste estado de choque pelas imagens dos atentados palestinos que a televisão mostrava sem parar, a popularidade de Sharon alcançou índices assustadores - 80% de aprovação a esta nova Operação de ataque.
O processo de convocação de reservistas foi relâmpago. A justificativa foi que após a ODS, a resistência tinha atacado 64 vezes provocando a morte de 83 israelenses.
Além deste argumento vingativo, o Hamas, o "monstro" que o próprio Israel criara, começava a preocupar bastante, e muita gente.
O Shin Bet (Serviço de Inteligência de Israel)disse que proeminentes ativistas do partido tinham "escapado" da Faixa de Gaza para a Cisjordânia e lá estavam fabricando explosivos - como se o Fatah não tivesse ninguém especializado nisso.
E com esta desculpa voltaram a investir Nablus e Jenin.
A estratégia da ODP foi a mesma da ODS, com uma variante mínima. À destruição invasiva foi dado um objetivo: "capturar dez bombas-suicidas potenciais".
Cento e cinquenta pessoas foram presas, quatorze "lugares suspeitos" foram demolidos e Belém, Jenin, Nablus, Qalqylia, Ramalhah, Tulkarm voltaram ao estado de sítio e à presença imponente de soldados e tanques por todos os lados.

No dia 20, a sede da FDLP (Frente Democrática de Libertação da Palestina) em Jenin foi posta abaixo.
No dia 21, a Autoridade Palestina voltou a insistir com os Estados Unidos e os países ocidentais que agissem junto a Israel para que se retirasse de seus territórios ocupados. E o negociador palestino Saëb Erakat voltou a solicitar observadores internacionais na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. A fim de testemunharem os fatos reais, que as bombas que caíam do alto e os caterpillars armados causavam muito dano, de fato. Em vez de aterem-se apenas aos atentados, mortíferos mas artesanais, que as televisões veiculavam com estardalhaço.
No dia deste apelo a IDF matou mais cinco adultos e cinco crianças em Jenin. E na cidadezinha de Huwara, perto de Nablus, uma moça de 22 anos foi assassinada de maneira bárbara - segundo os colonos judeus que a deixaram desfigurada, o linchamento da jovem palestina era para vingar a morte de cinco moradores da colônia judia de Itamar, na Cisjordânia, por um membro das Brigadas Abu Ali Mustafá.
As Brigadas em questão haviam organizado a operação em resposta à decisão da IDF de considerar as 150 colônias judias na Cisjordânia "zonas militares" de acesso exclusivo aos israelenses. Inclusive nas imediações. Só os palestinos com passes especiais poderiam circular nas estradas limítrofes ou aceder às suas lavouras adjacentes às terras invadidas. Após horas de espera nos checkpoints.
Yasser Arafat voltou ao palco para condenar os ataques aos civis israelenses e para acusar "forças estrangeiras" de explorar o desespero de seus compatriotas. Sua denúncia fazia sentido, mas no ocidente, foi uma prova a mais que ele tinha de ser calado.

A resposta de George W. Bush chegou no dia 24. Foi mais longe do que Collin Powel. Em um discurso na Casa Branca, o presidente dos Estados Unidos condicionou a criação do Estado da Palestina a várias reformas obrigatórias. Começando por uma "direção palestina nova e diferente" - leia-se, sem Yasser Arafat.
Exigiu "verdadeiras reformas que necessitarão instituições políticas e econômicas inteiramente renovadas, fundadas na democracia, economia de mercado e de ações corretas contra o terrorismo".
Para bom entendedor, Bush condiciou claramente a viabilidade do Estado da Palestina ao afastamento de Yasser Arafat.

Enquanto W. Bush dava lição de moral, os apaches israelenses bombardeavam Rafah, no sul da Faixa de Gaza, causando uma hecatombe de feridos e queimados graves.
E os caterpillars armados continuavam a demolir casa atrás de casa, apesar das tentativas de obstrução dos ativistas estrangeiros do ISM (International Solidarity Movement).
No dia 25, Yasser Arafat rejeitou a "sugestão" do presidente dos Estados Unidos, e enquanto falava, a IDF reocupava Hebron com espalhafato.
Das oito grandes cidades às quais os Acordos de Oslo assegurava autonomia, Hebron foi a sétima a ser retomada na mesma semana. As casas foram invadidas, reviradas, e cerca de 180 hebronitas foram levados aos trancos e barrancos para trás das grades.
Em Gaza, um ativista do Jihad reagiu jogando uma granada em um posto militar israelense e foi metralhado.
No dia 26, a Autoridade Palestina anunciou eleições legistativas e presidenciais entre os dias 10 e 20 de janeiro do ano seguinte. E na mesma leva de anúncio, apresentou um plano de reformas nas áreas exigidas pela Casa Branca - economia, justiça e segurança.
Mas não era bem isso que W. Bush queria. Queria mesmo era que Arafat cedesse o lugar a alguém menos influente e mais maleável e por isto continuou a pressionar.
Quase na hora em que o discurso do líder palestino estava sendo divulgado, soldados da IDF, brincando de tiro ao alvo, mataram um menino e feriram outro grave.
E os ânimos voltaram a exaltar-se.

No dia 27, a IDF invadiu e saqueou o escritório da Autoridade Palestina em Hebron, e enquanto estava com a mão na massa, W. Bush empurrava Arafat para que cedesse o cargo - sem saber ou sem se preocupar que no campo de refugiados de Balata um tanque israelense metralhava um jovem de 17 anos e na vizinha Nablus, a IDF ocupava o quartel da Força 17, guarda presidencial de Yasser Arafat.
Os vinte guardas presentes foram evacuados do prédio de mãos amarradas, olhos vendados e todas as armas foram confiscadas.
A intenção era deixar Yasser Arafat desprotegido e humilhado.
Ministros de 57 países membros da OCI (Organização da Conferência Islamita) se reuniram no Sudão, e de Khartum, exprimiram apoio a Arafat, figura emblemática que o presidente dos EUA queria apagar da cena política palestina e internacional.
No mesmo dia, a Assembleia parlamentar do Conselho da Europa apelou para que israelenses e palestinos parassem com a violência e as hostilidade. Sem mencionar em nenhuma linha do comunicado a ocupação geradora de todos os males.
Em vez disso, quase todas as recriminações da Assembleia foram dirigidas aos palestinos. E no final, rejeitaram o pedido de Arafat de uma investigação internacional no terreno. Os deputados ocidentais se contentaram em pedir a Tel Aviv que investigasse seus próprios crimes.
As únicas exigências que fizeram a Israel foi que contivesse a expansão das invasões judias e que parasse de destruir sistematicamente as delegacias de polícia palestinas.
Não é que estivessem dando uma colher de chá a Arafat. É que entendiam a incoerência óbvia de exigirem que Arafat mantivesse a ordem e evitasse os atentados sem policiamento adequado. No mais, não pareciam não incomodar Sharon em nada.
Tanto que no fim da reunião de cúpula do G8 no Canadá, o Primeiro Ministro israelense parecia um pavão cinzento. Sua satisfação era visível quando disse que tinha certeza que sua "causa" fora ouvida e que o afastamento de Arafat estava garantido.
Por ouvida ele se referia aos Estados Unidos.
A Rússia, o Canadá e a Comunidade Europeia não apoiavam o afastamento de Arafat, cuja autoridade era a única incontestada por todas as facções palestinas. Era ele quem "dava a liga" entre todos os partidos e sua presença era fundamental à coesão nacional.
Mas era isso mesmo que os Estados Unidos e Israel não queriam. Queriam era ver a Palestina dividida... Divide ut Regnes, como haviam patrocinado na Faixa de Gaza.

Na madrugada do dia 27, Ariel Sharon demonstrou à Europa e ao Canadá que pouco ou nada se preocupava com a opinião dos países que o protegiam. Contanto que o país que o armava continuasse lhe dando corda, corda, cada vez mais grossa e sem parar. 
A prova disso foi a ordem que deu de explodir a Mukata'a de Hebron como se fosse descartável.  Usada anteriormente pelos ingleses durante o Mandato Britânico, ela acolhia inclusive uma prisão, além dos escritórios onde os funcionários públicos trabalhavam.
A IDF se vangloriou de ter precisado usar duas toneladas de explosivos para destruir o imenso complexo administrativo.
Até os jornalistas ficaram chocados com a notícia de mais esta perda histórica e material que custaria caro para ser reconstruída e com a ousadia de Sharon.
Ele realmente se achava intocável. Não via nenhum obstáculo às suas investidas. Sabia contar com o apoio de Washington e com sua pesada artilharia.

No último dia do mês de junho, Yasser Arafat botou a boca no trombone. Denunciou que vários atentados além da Linha Verde, não reivindicados, não tinham sido realizados por nenhum grupo de resistência palestino e sim por forças e grupos desconhecidos, baseados fora da Palestina. E reiterou sua vontade de encontrar George W. Bush para conversarem.
Mas o presidente dos EUA não queria conversa. Só queria atender o pedido de Ariel Sharon de livrar-se do único líder respeitado na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Queria ver o Fatah e o Hamas se engalfinharem em todas as cidades.
Ou W. Bush ignorava que o plano de Ariel Sharon era dividir para reinar?
Por ignorância ou por maldade, W. Bush deu o golpe fatal em Arafat quando declarou ter cortado todo contato com o líder palestino. No fim deste discurso bem ensaiado rasgou o verbo: exigia a demissão de Arafat no ato.
Enquanto isso, a IDF assassinava Muhammad Taher, chefe das Brigadas Ezzsedine al-Qassan no norte da Cisjordânia.
O ministro da defesa israelense Ben Eliezer, justificou a execução dizendo que o rapaz de 26 anos estava diretamente implicado no atentado de Netanya, no dia 27 de março, que custara a vida de 29 israelenses.
Nesse dia, lembro-me de ter conjeturado com um colega se nas cidades ocidentais, nos bares e nos jantares em que humanistas e humanitários consertam o mundo com frases, se alguém levantava a questão de como um rapaz inteligente, de classe média, simpático, de 26 anos - idade em que os jovens de nossas nações devidamente legalizadas estão engatinhando no mundo do trabalho, após o diploma universitário - já  era chefe de uma brigada de resistência militar. Será que se perguntavam quantos anos tinham os jovens que ele liderava? Com que idade a vida dele/s tinha virado de cabeça para baixo, dado uma virada de 360°, parado? Foi quando a casa foi demolida? Quando um familiar foi assassinado? Quando soldados da IDF ocuparam sua moradia e trancaram a família em um quarto enquanto desfrutavam dos demais cômodos, da comida e dos bens que os pais haviam adquirido com dificuldade sofrendo a humilhação diária em checkpoints a caminho do trabalho? Foi a gota d'água de um ultraje a mais do ocupante civil ou militar que fizera o copo da resistência pacífica transbordar? Vira e mexe um destes jovens palestinos sem perspectiva, de futuros amputados, me leva a questionar o quanto a vida é aleatória e quanto depende da sorte de nascimento. Podia ser eu, lá. Se tivesse nascido em Gaza ou Ramallah. Em vez de ser jornalista, brasileira, desfrutar de independência e liberdade de ir, vir, ser e fazer o que tivesse vontade e coragem, estaria lá, em linhas demarcadas, sendo humilhada todos os dias por estrangeiros que chamam e tratam de e como animal; tolhida em atos, passos, com os dias contados.
Lá, na Palestina, em junho de 2002 (fevereiro de 2013 não muda nada), o futuro de todos os recém nascidos estava traçado. Nacionalidade: apátrida. Origem: cidade ocupada.
E por isto o mês terminou com as Brigadas que Taher dirigia ameaçando Israel de novos atentados.
Yasser Arafat estava apertado. Dentro e fora de casa. Seu tempo estava contado. 

Documentário Journeyman: Women in Black 
Israeli women taking a stand over Palestine 

Reservista da IDF, Forças israelenses de ocupação
Shovrim Shtika - Breaking the Silence - Hebron

"They want us to enact a constitution? No problem!
I shall ask Israel to send me a copy of theirs and copy it word for word!" disse Yasser Arafat com seu sentido de humor sagaz. Israel não tem constituição.
"There will be no Palestinian Hamid Karzai," disse ele, aludindo ao presidente fantoche que os estadunidenses haviam posto no Afeganistão.
"The PLO stands above the Palestinian Authority, and I am the head of the PLO [OLP- Organização de Libertação da Palestina]. The PLO represents all the parts of the Palestinian people, while the PA was elected only by the inhabitants of the West Bank (including East Jerusalem) and the Gaza Strip."

Reservista da IDF, Forças israelenses de ocupação
Shovrim Shtika - Breaking the Silence
"The first time we were involved in serious fighting, I think, was in Operation Defensive Shield. Our whole crew there got into the thick of things
Where were you?
In Defensive Shield, we began at Tul Karm.
And what did you do there?
There was this new procedure at the time there, of passing through walls. First we tried hammers, but that didn't work. I mean, pretty soon you realize it's no good because as soon as you enter the older areas, the houses are built of stone and a hammer doesn't do it. So you place a 5-kg explosive charge, even twice, and only then do you get a small hole in the wall and pass on to the next house. That's it. Essentially destruction there was going on at an insane level, huge. I think it spared a lot of lives, perhaps soldiers' too, because we had no contact with the enemy, you know. We saw all kinds of explosive charges through the windows and we were going through the walls, but it was sad on a personal level to see that each house you entered would be totally destroyed from the blast, nothing would remain intact. You only saw the street you searched, but you knew that it was the same throughout the town."  
Global BdS Movement: http://www.bdsmovement.net/

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