domingo, 21 de junho de 2015

Israel vs Palestina: Operações Militares V (1967-68)

Israel, "created from Sin"

Desde 2011 venho contando a histórica do conflito mais simples de resolver do mundo, Israel vs Palestina. Comecei nos primórdios e citando uma vez e outra as operações militares israelenses nos territórios palestinos ocupados. Operações mais ou menos sanguinárias, mas sempre destrutivas de patrimônio, vidas humanas e da humanidade dos soldados que participam.
Israel dá nome a tais operações não por serem exceções a uma regra de respeito ao povo ocupado e sim por indicarem premeditação que extrapola a opressão, repressão, espoliação de recursos naturais, terras e residências, aleijamentos e execuções aleatórias quotidianas de adultos e crianças.
Como sei que deixei muitas fora da minha história - que, repito, é contada pela ótica do ocupado e não do ocupante; do oprimido e não do opressor; do fraco em meios de defesa e não do forte em meios financeiros, bélicos e tecnológicos - resolvi no ano passado começar a recapitular uma a uma tais operações desde o início da Naqba em 1948.
Aos que perguntam porque os nomes das operações estão em inglês respondo que é por razões de precisão, e também de distância emocional. O uso de minha lingua materna para relatar horrores sempre me atinge mais. 
Até o capítulo IV abordei a primeira etapa de desapropriação e limpeza étnica como uma trajetória velada de ocupação. Hoje começamos a segunda etapa. A pós-1967 (Blog 18/12/11). A consequência e a sequência da Guerra dos Seis Dias em que a França, a Inglaterra e os Estados Unidos ajudaram Israel a derrotar os árabes e abocanhar a Palestina. Foi então que a Cisjordânia e a Faixa de Gaza viraram oficialmente "Palestinian Occupied Territories" POT, Territórios palestinos Ocupados.
Daí em diante as operações militares israelenses pararam de acobertar-se e justificar-se com desculpas esfarrrapadas. A IDF assumiu plenamente seu "direito adquirido" pelo apoio de seus aliados ocidentais de peso para upgrade sua estratégia e seus meios de realizar paulatinamente o projeto sionista do Grande Israel sem nenhum freio.
O problema de Israel é que desde o início jamais pensou em conviver com os palestinos e com os vizinhos árabes em harmonia. Sempre procurou dominar pela força em vez de conviver com os nativos e compartilhar a terra que lhes fora presenteada. Jamais buscaram a paz e sim guerra interminável. As operações que seguem são exemplo disso.

1967
Operation Moked / Focus. Bombardeio surpresa de 18 bases aéreas egípcias, jordanianas e sírias com a destruição de cerca de 450 aviões de combate - o que para a época era quase toda a frota desses países.
Esta operação aérea que contou com o apoio logístico dos Estados Unidos e força aérea de França e Inglaterra permitiu que Israel derrotasse os países vizinhos em tempo recorde no que ficou conhecido como a Guerra dos Seis Dias.
Operation Moked (2x12')

1968
MarçoOperations Tofet / Inferno e Asuta. Foram operações sucessivas com o mesmo objetivo. No dia 21 de março a IDF atacou os campos de refugiados palestinos de Karameh e Safi, na Jordânia. Um ataque surpresa previsto como massacre dissuasivo fácil, mas acabou se transformando em batalha acirrada no que ficou conhecido como a Batalha de Karameh.
Fazia meses que o Fatah instalara seu quartel-general na Jordânia e brigadas militares de defesa organizadas em vários campos na fronteira com a Cisjordânia. Sob pressão estadunidense, o rei Hussein da Jordânia concordou em "acalmar" os palestinos mandando uma tropa a Karameh, que era um campo que servia também de treinamento dos militantes do Fatah. Tropa esta que foi recebida por fedayin* palestinos que propuseram ao comandante jordaniano: You have three minutes to decise whether you leave or die. A escolha foi simples. Os soldados se foram sem nem reclamar.
O general Moshe Dayan, então ministro da defesa de Israel, ficou uma fera, seu chefe de inteligência Aharon Yariv disse que tinham de atacar o Fatah para desprestigiar a resistência palestina, e solicitaram autorização ao primeiro ministro Levi Eshkol para tirar o campo do mapa. O governo acabou achando que um bombardeio causaria a morte de muitos civis e prejudicaria a imagem de Israel junto a seus aliados ocidentais. Porém, a opção de ataque não foi descartada e a IDF começou uma atividade de espionagem na fronteira a fim de avaliar as forças da OLP e a melhor estratégia para aniquilá-las.
No dia 20 de março estavam prontos e se postaram nas pontes fronteiriças sobre o rio Jordão na cara dos jordanianos surpreendidos com o número e variedade de batalhões - 7th Armored Brigade60th Armored Brigade35th Paratroop Brigade, 80th Infantry Brigade, um batalhão de engenharia e mais cinco batalhões de artilharia com uma força militar de 105 tanques Patton e 88 peças pesadas de artilharia. O aparato militar era tão imponente que o rei Hussein interpretou a manobra errado. Pensou que o ataque fosse dirigido a Amman e ao Exército da Jordânia e não a um simples campo de refugiados. Com isso os israelenses não contavam.
A IDF dividiu seus soldados em quatro tropas. A maior estava na ponte Allenby (atualmente o único ponto de travessia entre a Jordânia e a Cisjordânia). As outras foram divididas entre as pontes Damiyah (destruída) para atingir Karameh pelo norte enquanto paraquedistas cairiam pelo alto; outra pela ponte Rei Abdullah (no sul de Jericó, desativada) para eventual manobra do Exército do país invadido. Pois sentindo que pisara na bola, na última hora a IDF jogou panfletos na Jordânia dizendo que o ataque não era contra eles e sim contra os palestinos e por isso eles não deveriam intervir.
Nesse ínterim, oficiais jordanianos simpatizantes da causa dos refugiados avisaram Abu Ammar (Yasser Arafat) do ataque iminente e Abu Jihad, Abu Iyad e os demais líderes militares da OLP começaram a posicionar os cerca de dois mil resistentes armados precariamente, mas prontos para não se deixar esmagar sem opor resistência ferrenha. Duzentos ficaram em Kamareh defendendo o campo e os outros foram postos de tocaia nas colinas a fim de recepcionar os soldados inimigos.
O ataque simultâneo pelas três pontes começou cedinho, às 5:30. Às 6:30 os helicópteros da IDF largaram os paraquedistas no campo e foram recebidos a bala pela resistência do Fatah, que causou várias perdas no batalhão invasor.
Quando as tropas da IDF que atacariam pelo sul se engajaram na estrada, deram com a infantaria jordaniana cujos oficiais não acreditavam na palavra, pouco fiável, das autoridades israelenses e se prepararam para combater a investida a seu ver ambígua. Os aviões da IDF entraram em ação, mas devido à proximidade dos dois exércitos, não tiveram como causar as mortes que pretendiam.
Em outro ponto, os jordanianos impediram o avanço do vizinho na ponte Abdullah - mais tarde o coronel Gronen, para não dar o braço a torcer, inventou que este batalhão só visava manter a atenção dos jordanianos para eles deixarem as portas abertas nos outros pontos de ataque, mas foi desmentido.
Um dos outros pontos de ataque era a ponte Allenby, de onde a 7th Brigade tomou três direções: um batalhão de infantaria e outro de tanque bloquearam a Estrada do Sal, outro batalhão de infantaria dirigiu-se ao sul para ajudar seus companheiros a atravessar a ponte Abdullah e as demais companhias foram para o norte atacar Karameh enquanto a Brigada de Engenharia construía outra ponte.
Eram quase 7 horas quando a IDF chegou a Karameh. Demorou uma hora para controlar o campo após batalha acirrada com os resistentes do Fatah. Em seguida, explodiram as 175 casas construídas com dificuldade - os palestinos são os únicos refugiados que não se conformam em morar em barracas; onde se instalam, constroem casas. O campo foi arrasado, como mostra a foto ao lado.
Porém, os israelenses estavam frustrados por não terem conseguido causar os danos humanos e morais que pretendiam e foi aí que começou a Operation Asuta contra bases menores de resistência ao sul do Mar Morto. Neste ataque desproporcional de aviões, tanques e morteiros contra resistentes armados de fusis e algumas K47, a IDF conseguiu inflingir as perdas humanas que buscava. No fim do assalto por volta das 11 horas, quando 34 helicópteros estavam evacuando as tropas israelenses, 20 soldados jordanianos estavam mortos, 20 resistentes palestinos, e os 27 sobreviventes foram presos. No total, do lado da OLP, cerca de 170 palestinos morreram, cerca de 140 foram capturados, e o Fatah perdeu dois campos de refugiados.
O historiador israelense Benny Morris diz que as Operations Inferno e Asuta terminaram com 33 soldados israelenses mortos e 161 feridos; a IDF perdeu 4 tanques, 3 tratores, dois veículos armados, 113 caças Dassault Ouragan e um Mirage. 84 soldados jordanianos perderam a vida e cerca de 250 foram feridos. A Jordânia perdeu 30 tanques e dois aviões.
As perdas e danos foram consideráveis, porém, no final das contas, ambas as partes cantaram vitória.
Israel por ter destruído Karameh: "The Karama operation exposed the vulnerability of PLO units deployed along the Jordan River and so they moved their concentrations up into the mountains. This imposed additional strains on them and made their operations into the West Bank even more involved and difficult than they had been hitherto." Embora as críticas chovessem inclusive dos Estados Unidos, cujo embaixador na ONU Arthur Goldberg declarou: "We believe that the military counteractions such as those which have just taken place, on a scale out of proportion to the acts of violence that preceded it, are greatly to be deplored." e o embaixador em Israel Walworth Barbour disse: in twenty years time, a historian will write that day down as the beginning of the destruction of Israel - Menachem Begin proibiu que esta observação do diplomata estadunidense fosse citada no conselho de ministros.
Apesar da destruíção de Karameh (fácil quando as forças armadas são disproporcionais) o Fatah pôde cantar vitória porque ganhou propaganda grátis. De repente, o mundo inteiro descobriu que os palestinos existiam (apesar da hasbara "de uma terra sem povo para um povo sem terra"), que estavam organizados e que se recusavam a abandonar sua pátria nas mãos dos invasores bárbaros sem opor resistência civil e armada.
O próprio Gideon Rapahel (imigrante alemão que co-criou o ministério das Relações Exteriores de Israel) admitiu mais tarde que "The operation gave an enormous lift to Yasser Arafat's Fatah organization and irrevocably implanted the Palestine problem onto the international agenda, no longer as a humanitarian issue of homeless refugees, but as a claim to Palestinian statehood"
De fato, Yasser Arafat, até então um  ilustre desconhecido internacionalmente, ganhou voz e a usou declarando à grande mídia ocidental que de repente descobriu que existia: "What we have done is to make the world... realize that the Palestinian is no longer refugee number so and so, but the member of a people who hold the reins of their own destiny and are in a position to determine their own future".
Foi a mensagem que os palestinos passaram ao mundo árabe e ao Ocidente que reconhecera Israel sem se preocupar com os destino do povo nativo da Palestina.
Após a derrota para a IDF (que palestinos e árabes em geral viram como uma vitória psicológica sobre a IDF tida como invencível após a Guerra dos Seis Dias) nos dias 22 e 23 cerca de 5.000 palestinos se apresentaram ao Fatah como voluntários intelectuais, estratégicos e militares. No fim de março, o número de fedayin* atingira 20.000. O crescimento da OLP parecia irrepressível.
O Iraque e a Síria ofereceram programas de treinamento para centenas de palestinos. Os países do golfo, liderados pelo Kuweit atenderam ao pedido dos milhares de refugiados palestinos de recolherem 5% de seus salários como imposto a ser transmitido à OLP para financiá-la. E só em Beirute os palestinos conseguiram levantar US$500.000 de simpatizantes de sua causa. A partir daí a OLP garantiu apoio às famílias de todos os resistentes mortos em combate. Um ano depois da Batalha de Kamareh o Fatah tinha escritórios devidamente constituídos e ativos em oitenta países.
O fortalecimento do Fatah e da OLP decorrente da Operação Inferno foi um dos catalizadores para os eventos dramáticos do Setembro Negro, em 1970.

Dezembro Operation Gift. No dia 28 Forças especiais Sayeret Matkal da IDF investiram o Aeroporto internacional de Beirute destruindo 13 aviões. Oito da Middle East Airlines (MEA - libanesa) e 4 de outras companhias. Causando uma perda material de US$43.8 milhões.
A organização foi minuciosa e contou com participação das três forças da IDF: Exército, Marinha e Aeronática (fotos da IDF).
Às 20:37 uma esquadra de seis helicópteros Super Frelon carregados de soldados das tropas especiais escortados por sete helicópteros decolaram do campo aéreo Ramat David no sudeste de Haifa em direção ao norte. Horas antes dois navios torpedos e quatro navios Saar class missile tinham se dirigido às costas do Líbano mantendo uma distância de 25km do litoral a fim de proceder à evacuação dos soldados. No norte de Israel, no aeroporto de Betzet, a IDF montara uma base de reabastecimento dos helicópteros.
A Força Especial Uzi, composta de 22 soldados, aterrizou no canto oeste do aeroporto de Beirute, onde havia três grupos de aeronaves estacionadas. Uma com cinco aviões, e as duas outras com três cada. Os terroristas treinados especialmente para a operação logo instalaram os explosivos em volta de cada aeronave e esperaram as luzes da parte militar do aeroporto se apagarem para detonarem e escaparem sem ter de se confrontar com os guardas libaneses. A foto ao lado mostra o estado do aeroporto no dia seguinte ao atentado. 
Esta operação foi justificada como retaliação ao ataque da Frente Popular de Libertação da Palestina (Popular Front for the Liberation of Palestine - PFLP) dois dias antes de uma aeronave da companhia israelense El Al em Atenas.
Neste ataque da PLFP, os palestinos Naheb H. Suleiman, de 19 anos, e Mahmoud Mohammad Issa Mohammad, de 23, refugiadas no Líbano, furaram a segurança do aeroporto durante a decolagem do avião da El Al, o metralharam e lançaram duas granadas. Mataram um passageiro, feriram dois outros e danificaram o aparelho. Foram presos em seguida.
Os participantes da Operation Gift não sofreram nenhuma punição e Israel não desembolçou um centavo de compensação às companhias aéreas prejudicadas em sua operação olho por olho, dente por dente. Nem ao Líbano.

Nota
* Fedayin (singular, feda'i - quem arrisca a vida voluntariamente / aquele que se sacrifica). Termo que os Ismaelitas adeptos do 'Velho da Montanha' fundador do Estado Alamût  usavam na Idade Média.
Aliás este dissenssor xiita indiano criou, sem querer, outro adjetivo que se proliferaria nas línguas greco-romanas: assassino, proveniente da palavra árabe asâs, base/fundamento. Este senhor Hassan ibn al-Sabbah chamava seus seguidores de assassiyun - literalmente, 'quem é fiel a assas', ou seja, à base ou ao fundamento da fé. Palavra mal-entendida pelos ocidentais durante as cruzadas e assimilada como um denominativo a ser usado para os combatentes que os matavam. Por isso a palavra acabou sendo importada para o Ocidente para designar quem tira vida alheia de maneira fria e premeditada.

Documentário Al Jazeera: História da OLP 
History of the PLO -  Masters of their own Destiny I  (24')
 
NEWS
Ilan Pappe23 June 2015. 
New “shoot and cry” documentary Censored Voices brings once-censored interviews with Israeli soldiers to light.
To watch the full documentary Censored Voices:  :http://bit.ly/1fpAWPm  or   http://j.mp/1M0BSXL 
The 1967 'Six-Day' war ended with Israel's decisive victory; conquering Jerusalem, Gaza, Sinai and the West Bank. It is a war portrayed, to this day, as a righteous undertaking - a radiant emblem of Jewish pride. One week after the war, a group of young kibbutzniks, led by renowned author Amos Oz, recorded intimate conversations with soldiers returning from the front.

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