domingo, 15 de julho de 2012

Um passo pra frente na Líbia, um pulão pra trás no Paraguai


Depois do Egito, no dia 07 foi a vez dos líbios votarem no homem que vai estabelecer a democracia e governar o país...
Que país? A Cirenaica, a Tripolitana, Fezzan, as três regiões juntas ou nenhuma?
Governar o norte e o sul em uma democracia será (seria?) como governar espartanos e troianos na mitologia antiga contada nos versos de Homero e Virgílio, ou então governar a Grécia e a Turquia brandindo a mesma bandeira, hoje em dia.
O Conselho Nacional de Transição (CNT) que conduziu a Líbia a sucateando até e após a execução brutal de Gaddafi no dia 20 de outubro do ano passado, ao definir o futuro que o pleito daria aos compatriotas especificou que este ato simples de pôr tinta no dedão (para evitar fraude) e fazer uma cruz diante do nome de seu candidato na cédula eleitoral era o início do processo de criação de um sistema político novo e justo.
Para isto, estabeleceu uma representação proporcional com duzentos assentos na Assembleia em uma matemática que desagradou logo os cirenaicos - estes ficaram com 60 cadeiras, Fezzan com 40 e as outras 100 ficaram com a região Tripolitana, que para muitos cirenaicos foi derrotada junto com Gaddafi.
Talvez tivesse sido melhor dividir o país nesta oportunidade.

Vários intelectuais cirenaicos pediram o federalismo enquanto muitos das classes populares queriam mesmo era gritar basta de exclusão e de cidadania de segunda classe.
Durante os 42 anos de regime de Muammar Gaddafi a Cirenaica foi deixada para trás com a centralização do poder em Trípoli e as reservas petroleiras do leste foram sistematicamente exploradas em benefício da região tripolitana, da família e dos íntimos do "imperador da África".
Os cirenaicos se vangloriam de terem instigado a revolução anti-Gaddafi e estão frustrados por não terem colhido os louros que esperavam. Acham que os novos decretos beneficiam mais o oeste do país - com verbas para a educação e oportunidades de trabalho, como na época de Gaddafi.
Durante a "rebelião" eu disse e repeti que os líbios não são um povo uniforme e o Estado líbio - como a maioria dos países da África - é mais uma fabricação europeia decorrente das divisões aleatórias feitas no processo colonial nos séculos XIX até meados do século XX do que uma nação ligada por cultura e amor nacional.
O espaço territorial chamado Líbia reúne três povos  - desunidos e de culturas distintas - originários de três regiões que são Tripolitana, Cirenaica e Fezzan.
O bom senso deveria ter levado o CNT a aproveitar a "revolução" para dividir o país em três, com governos distintos, autônomos e soberanos para dar à população uma chance maior de conviver em paz como vizinhos, talvez até como amigos.
Viver em uma mesma nação unida e indivisível é pedir muito, talvez demais. Um pouco como a Iugoslávia pós-Tito quando em poucos anos a unidade que ele mantinha com autoridade e carisma desmoronou e virou um cada um por si em que bósnios, croatas, sérvios, kosovares pareceram acordar do sonho em que conviviam até como amigos para a realidade do que os separava ser mais forte do que o que os unia em Estado único.

No caso da Líbia, os três países potenciais que a compõem são separados por grandes espaços de terra e água. Sendo que a maior reserva subterrânea do "ouro azul" fica em Fezzan.
Embora os povos compartilhem a mesma religião - predominância muçulmana com 2% de cristãos e 1.3% de outras religiões - historicamente a Cirenaica tende a voltar-se para o Mashreq ou seja, o mundo islâmico oriental, enquanto que a Tripolitana tende a voltar-se para o Maghreb ou seja, o mundo islâmico ocidental.
Fezzan, que é maior do que as duas outras, mas se estende no deserto do Saara com sua areia indomável,  está mais voltada economicamente para os países da Africa ocidental do que para a Tripolitana ou Cirenaica.
O rei Idris Sanussi da Líbia, deposto no golpe militar de Gaddafi, governava apenas a Cirenaica. Foram os britânicos que lhe ofereceram de presente as duas outras regiões após a Segunda Guerra para que fosse Emir do conjunto pré-fabricado conhecido como a Líbia atual. Em reconhecimento ao seu apoio aos aliados.
Quando Gaddafi o destronou o povo inteiro seguiu o Coronel com menos ou mais boa vontade, porém nesses 42 anos a Cirenaica nunca esqueceu o rei deposto em 1969. Muitos lá acham que Gaddafi punia a região por causa do apoio desta a Sanussi. O que talvez não fosse tão errado. Além do ressentimento de Gadaffi pelos danos que o Emir também causara aos tripolitanos, naquela velha valsa de discórdias ancestrais.
O CNT e o presidente eleito que segue a mesma linha apostam em uma Líbia como a que Gaddafi mantinha. Continuam contra a ideia de Federalismo e com a a ilusão de uma grande Líbia. Muitos discordam e acham que só há duas saídas para a concórdia. Divisão pura e simples ou o Federalismo semi-autônomo. Menos como o Brasil e mais como os Estados Unidos em que os estados têm até leis próprias e razoável autonomia.
Em vez de escutar as ruas, o presidente do CNT Mustafá Abdel Jalil, ex-ministro da Justiça de Gaddafi, disse que usaria até a força para preservar a (sua ideia de) unidade.
A elite de Trípoli também rejeita a ideia de federalismo com o argumento que a partição da Líbia poderia ter consequências negativas, inclusive eventuais conflitos inter-regiões sérios - já que os "rebeldes" estão longe de deporem as armas que lhes foram dadas de mão beijada.
Mas as ruas parecem querer mesmo a separação ou no mínimo o federalismo.

Atual divisão distrital da Líbia
Contra a opinião contrária de líderes das regiões por temerem ser deixados de lado, outros por ignorarem o clamor das massas e a maioria por pavos dos trinta e três líderes tribais aproveitarem a deixa para impor leis unilaterias e ficarem com o poder real em detrimento dos partidos políticos.
Segundo o historiador Ronald Bruce St John, na antiguidade, o povo de Cartago na região tripolitana ocidental e o povo da Cirenaica do outro lado "concordaram em traçar uma fronteira entre suas esferas de influência onde corredores de ambos os lados se encontrariam" justamente no meio do caminho no Golfo de Sirte. Perto de onde as passeatas contra o CNT brotaram por ocasião do anúncio da divisão de cadeiras na Assembleia.
É onde os "separatistas" acham que a fronteira deveria ser estabelecida.  
Para evitar que tais ideias criem asas o CNT colocou barragens nas estradas litorâneas que conectam o leste e o oeste impedindo a passagem de veículos militares e tráfico comercial até o presidente eleito conseguir controlar todo o território.
O homem no poder agora é o doutor em Ciências Políticas (Universidades de Princeton e Pittsburgh nos EUA) Mahmud Jibril, membro do CNT e fundador do National Forces Alliance, NFA, o partido que o levou ao poder. Ele nasceu há 60 anos em El-Beida - terceira cidade líbia, segunda da Cirenaica e a com a maior reserva hídrica natural (400 a 600m pluviais de precipitações anuais - grande vantagem em um país em que o deserto ocupa mais de 90% da superfície).
Jibril foi o presidente do serviço de Desenvolvimento Nacional no governo de Muammar Gaddafi. Ele quer a Líbia una e indivisível. É ocidentalizado e pragmático, como toda a elite local que formou-se fora.
Tomara que consiga desenvolver uma Líbia majoritária à sua imagem.
Por enquanto a atividade das tribos e as armas espalhadas por todo lado em mãos de pessoas incontroláveis levam a pensar que sua tarefa será árdua.
"Fazemos um apelo honesto a um diálogo nacional para que juntos formemos uma coalição governamental com uma bandeira única... a fim de encontrar um compromisso, um consenso em que a Constituição seja escrita e um novo governo possa ser formado. Nestas eleições não houve nem perdedor nem vencedor.  A Líbia é a única vitoriosa," disse o presidente eleito.
Inch'Allah!


No nosso continente, logo que Fernando Lugo foi eleito para a presidência do Paraguai ouviu-se fortes rumores de insatisfação em Washington.
Porém, como estamos no século XXI e o Paraguai está na esfera de domínio latino-americano, e do Brasil, os contra-rumores de um eventual apoio ou incentivo a um golpe para derrubá-lo foram descartados de maneira até irônica: Foi-se o tempo em que os países latino-americanos eram repúblicas bananeiras à mercê dos gringos!
Ironia à parte, aconteceu o inacreditável.
Não há nenhuma prova que os Estados Unidos estejam por trás do golpe-disfarçado que derrubou o presidente paraguaio eleito democraticamente, mas os criminologistas repetem sem parar que para encontrar o culpado de um crime há de se procurar primeiro quem leva vantagem no delito.
No caso, um nome aflora a todos os lábios: os gringos são os únicos que têm algo a ganhar ou pelo menos, algo a não perder, além do amor próprio ferido.
As revelações do WikiLeaks que funcionários estadunidenses estavam contrafeitos com o distanciamento do presidente paraguaio do "comando sulista dos EUA" também bota a pulga atrás da orelha.
Primeiro foi o discurso "socialista" de Fernando Lugo que desagradou os Estados Unidos e ofendeu sua convicção do seu sistema ter de prevalescer no mundo.
Segundo porque antes do padre Lugo assumir o poder, Washington ofereceu "ajuda humanitária" ao "pobre Paraguai" em troca de apoio contra Hugo Chavez e uma ameaça velada de que se Assunção não aceitasse tropas dos EUA em solo paraguaio, perderia os milhões da ajuda "humanitária".
Quem diz humanitária, diz desinteressada. Ou a semântica anda errada?
Tais tratados pareciam desnecessários, já que por incrível que pareça o Senado paraguaio aprovou em maio de 2005 a entrada de tais tropas estrangeiras (com alguma "compensação" privada?) e quatrocentos marines foram transferidos para solo paraguaio em rodízio de semanas ou meses dos batalhões lá estacionados.
Este programa de "cooperação" chamado New Horizons consiste, no papel, de exercícios de treinamento médico. 
O ativista de Direitos Humanos Orlando Castillo diz que o treinamento médico é na verdade uma simples operação de observação dos líderes rurais considerados perigosos na ótica do Pentágono.
Aliás, "no State Department não parece haver nenhuma menção de fundos para trabalho médico no Paraguai. Há menção de fundos, dobrados, mas para contra-terrorismo."
Terroristas no Paraguai?!
Calminha... Em linguagem gringa, terrorista é todo aquele que não diz Amém ao seu Way of Life. Podemos dormir tranquilos. Não tem ninguém querendo explodir os nossos vizinhos.  
Enfim, podíamos dormir tranquilos até o golpe-impeachment de Fernando Lugo. Por que mesmo ele foi destituído? Nem vale a pena mencionar.
Agora temos os marines US à nossa porta. Em nosso quintal Paraguaio. De lá para o Mato Grosso e o Paraná é um pulo.  
Dilma, cuidado! Você sabe que a Operação Condor começou assim. Primeiro em um país e depois se alastrou pelo Cone Sul inteiro! (É brincadeira, sem graça; já estamos emancipados e os EUA nos devem dinheiro demais para nos atacarem com as armas que os nossos empréstimos certamente ajudam a financiar - a não ser que queiram livrar-se da dívida com um calote golpista ... Um a mais ou a menos, para eles tanto faz.)   
Barack Obama não se conforma com a decadência vertiginosa em que seu império se encontra e anda fazendo uma bobagem geopolítica atrás da outra. O Brasil está ao abrigo, pois a Casa Branca é míope mas não é destemida. Não ao ponto de cutucar onça com varetinha. O Paraguai é outra história, outro tamanho e outra medida.
Quando o teólogo e bispo católico Fernando Lugo foi eleito (em abril de 2008) deu fim à hegemonia do Partido Colorado que só não governou o Paraguai entre 1904 e 1946. O ditador Alfredo Stroessner (1954-89) reforçou ainda mais esta hegemonia.
Até perderem o governo para Fernando Lugo que prometeu realizar reforma agrária dentro dos marcos constitucionais, ampliar o sistema de seguridade social e lutar pela soberania energética do país.
Enfim, programa perigosíssimo para as elites dominantes e a corrupção reinante.
Ao ser eleito Lugo logo mostrou a que vinha respondendo mal a um possível Acordo de Forças Militares com os EUA e a outras investidas político-militares da Casa Branca via Embaixada.
Aí os EUA ficaram "extremamente desapontados" com a defecção paraguaia.
A estratégia EUA no Cone Sul não é segredo para ninguém que segue a Política Internacional, a paranóia de Washington (porque em vez de amigos só faz inimizades ou amizades pontuais interessadas) e sua obsessão em controlar tudo e todos em benefício próprio.
A decadência não os impede de continuar dando murro em ponta de faca. Aliás, é uma das razões da bancarrota, mas os gastos bélicos continuam aumentando como se desse para conseguirem comida e água pela força das armas.
Suas reservas naturais, sobretudo de água, foram tão mal exploradas na indústria selvagem que na região dos grandes lagos na fronteira com o Canadá já precisam fazer malabarismo para conseguir água potável. Daí a caça às reservas alheias que há anos assediam.
 
O nosso Brasil possui tudo o que eles gostariam de ter eternamente e estão desfalcados. Os olhos dos tecnocratas estadunidenses brilham quando falam nas doze bacias hidrográficas que constituem nosso patrimônio de 13% da reserva hídrica de água doce do planeta. Mas nisto ninguém tasca!
O crescimento do Brasil e a soberania demonstrada pela Dilma convenceram o Pentágono a nem tentar tocar diretamente na nossa bacia do Tietê-Paraná. Imagino que o Planalto ou o Itamaraty já tenham deixado claro que não tomaram o que é nosso de direito e de fato nem ocupando o Paraguai, nem com a cumplicidade do governo de Santiago.   
Digo Santiago porque o embaixador dos EUA no Chile sugeriu a Washington que estreitasse relações com líderes regionais que "compartilhassem suas preocupações em relação a Hugo Chavez."
Pois, como se sabe, os EUA morrem de medo de Hugo Chavez.
Com Fidel Castro com os anos contados, o novo bicho papão latino-americano é o venezuelano abusado que não perde a oportunidade de ridicularizar a Casa Branca e às vezes até de dizer em voz alta o que o mundo inteiro cochicha com sarcasmo.
O Pentágono quis por tudo instalar uma base militar na região do Chaco argentino, que faz parte do Grande Chaco que engloba terras argentinas, bolivianas, paraguaias e brasileiras - ao sul do Pantanal. A negativa peremptória de Cristina Kirchner fez com que Barack Obama procurasse outra saída e foi aí que o Paraguai foi cortejado com agressividade. Por ser o mais fraco do território e nosso vizinho íntimo em um trânsito fronteiriço carregado.
Washington queria esta base porque com a mudança de presidente do Equador, o novo, Raphael Correa, botou os militares gringos para fora de Manta, sua cidade costeira que os uniformes dos marines tingiam de cores estrangeiras.
O único cúmplice que os Estados Unidos tem no Cone Sul é o Chile, que abriu... os braços, e autorizou mais uma base estrangeira em casa. Aliás a amizade entre os dois países data da era negra de Pinochet e dos Chicago Boys. A democracia não inverteu o processo de submissão e dependência que marcava a ditadura militar que a Operação Condor instalara e apadrinhara até não poder mais.
Não sou especialista em Chile e só conheço este belo país como turista, mas dói-me a alma vê-lo prestar-se ao papel de vassalo dos Estados Unidos. É pena que suas elites não tenham mudado nem aprendido as lições do passado.

Falando em bases militares. Os Estados Unidos têm 800 espalhadas pelo planeta Terra em lugares estratégicos.
A América Latina abriga vinte e duas delas. Todas subordinadas a um departamento do Pentágono chamado Southern Comamnd - como se os nossos países fossem uma extensão do deles.
O Southern Command faz parte dos cinco comandos militares mais importantes dos Estados Unidos. É encarregado de nos vigiar, espionar e controlar noite e dia.
Seu Quartel General foi no Panamá de 1903 até 1999, depois foi transferido para Miami em 2000 com um plano militar de controle "sub-regional" que usa operações tecnológicas de ponta chamadas FOL (Forward Operation Location) - centros de "mobilidade estratégica" e "usos de força decisiva" com bases, rápido transporte aéreo e mobilização de tropas.   
Na América do Sul estamos cercados por todos os lados, mas os dois países mais EUAmilitarizados são a Colômbia e o Chile.
Aliás no dia 05 de abril deste ano os chilenos acolheram outro batalhão norte-americano em Concón, na base naval de Aguayo.
Os Estados Unidos forneceram U$460.000 para a construção e o treinamento consiste da doutrina dita Military Operations on Urbanized Terrain (MOUT). Uma daquelas doutrinas às quais Golbery do Couto e Silva era chegado.

Falando na eminência parda dos generais que nos governaram durante os 20 anos ditatoriais, a Escola das Américas (School of the Americas - SOA), criada no Panamá em 1946 e atuando hoje no Forte Benning, na Georgia, até 2004 formara 61.000 latino-americanos em técnicas de combate, tática militar, inteligência e técnica de tortura.
Muitos deles sujaram o Cone Sul de sangue durante as ditaduras orquestradas pela Operação Condor.
O agora chamado Institute of Hemispheric Cooperation continua formando cerca de mil para-militares latino-americanos por ano.

A base militar estadunidense mais famosa é a de Guantánamo, em Cuba, localizada só a 64 quilômetros de Santiago, segunda cidade do país e a 920 km de Havana. Como se sabe, foi apoderada pelos EUA em 1903 e há anos funciona como centro de tortura e prisão sem julgamento. Obama prometera fechá-la, mas ela continua. 
A base militar em Manta, que o Equador está fechando, abriga o centro eletrônico de espionagem de satélites do Pentágono. De lá saíam diariamente aviões espiões Orion C-130 armados em controle de rotina de terras e ares. É crucial na estratégia de missões de inteligência estadunidense.
Dizem que é esta que Washington quer transferir para o Paraguai, já que falhou Chaco.
A base de Comalapa em El Salvador é pequena. É usada para monitorar satélites e como apoio à Manta que está sendo desativada.
As demais bases da América Central - em Honduras e Costa Rica - são centros operacionais de radar e de apoio de missões aéreas.
É a partir da Colômbia que o sapato aperta. Nos últimos 12 anos recebeu cerca de U$5 bilhões de dólares em ajuda militar. Por isto autoriza sete bases militares estadunidenses pesadas (conhecidas) que operam em seu território colombiano e abrem as asas sobre nós e os venezuelanos. Além destas, compartilha com o Pentágono pelo menos as cinco ao lado.
A Arauca é oficialmente destinada ao combate do tráfico de drogas, mas é de fato um ponto estratégico para monitorar a região petrolífera na Colômbia, na Venezuela e a reserva amazônica.
A base de Larandia serve aos helicópteros. Suas pistas acolhem operações de bombardeiros B-52 com alcance além do território colombiano. Cobre o espaço aéreo de quase todo o nosso continente.     
A base Three Corners também na Colômbia serve para operações de terra, ar e água e virou um ponto estratégico contra as guerrilhas, base permanente de armas, logística de estratégia militar e tropas de combate.
Dizem as más línguas que na Colômbia tem até armas nucleares gringas. Apontadas para onde, os vizinhos?
Há poucos meses a Colômbia recebeu a visita do chefe da CIA David Petraeus, do secretário da defesa dos EUA Leon Panetta.
O ex-primeiro ministro e atual ministro da defesa de Israel Ehud Barak também esteve por lá para "estreitar a cooperação militar" com um interesse particular na base de Tolemaida, pertinho de Bogotá. Vira e mexe recebe a visita de ativistas que querem ver os marines e os israelenses pelas costas e longe de lá.
A relação militar entre a Colômbia e Israel começou a ser estreitada na década de 80. A Indumil colombiana produz inclusive uma versão do fusil Galil israelense - que é "inspirado" na famosa AK47, criada pelo engenheiro russo Mikhail Kalashnikov durante a Segunda Guerra Mundial e desde então copiada e traficada em todos pelos mascates da morte onde tiver conflito. 

O Peru (soldados ao lado armados do Galil) autorizou duas bases estrangeiras em Iquitos e em Nanay. Pertencem às Forças Armadas peruanas, mas foram construídas pelos Estados Unidos e são usadas pelos marines que operam na Amazônia peruana. Isto porque no final das contas, os Estados Unidos cobiçam mesmo são os nossos recursos naturais. Sobretudo o petróleo e a água.
Pois embora os brasileiros estejam fascinados com a China, suas práticas escravas e seus meios de enriquecimento ilícito mundo afora, só dois países dos BRICs têm futuro assegurado.
Apenas Rússia e Brasil têm fôlego para manter hegemonia a médio e longo prazo porque são os únicos em que os recursos naturais que a China (Tibete) e a Índia (Kashimir) têm de predar além de suas fronteiras legais abundam.
Nossos recursos naturais, os tesouros que o pulmão amazônico abriga, o petróleo que jorra e a ainda mais preciosa reserva hídrica (bacias à direita) são invejados e cobiçados pelo resto do mundo de maneira mais ou menos agressiva.
Mas a ABIM - Agência Brasileira de Inteligência, o serviço secreto tupiniquim que parece ser eficiente, sabe de tudo isto melhor do que eu e deve estar tomando as devidas providências para os marines, seus aviões espiões e seus piratas ficarem fora das nossas fronteiras.


domingo, 8 de julho de 2012

Israel vs Palestina: História de um conflito XIV (09/10 2000)


Janeiro de 2000 começou com perspectivas de diálogo, interrompido com a provocação premeditada de Ariel Sharon na Esplanada da mesquita Al-Aqsa no fim de setembro.
A repressão desastrada e desastrosa contra as passeatas dos universitários incendiou a Cisjordânia e a Faixa de Gaza como uma faísca incendeia a palha.

Imagens de gases, tanques, cassetadas e balas correram o planeta como fogo em palha. Porém, a que emocionou o mundo no dia 30 de setembro e na Palestina caiu no incêndio como uma chuva de álcool, foi a de Jamal al-Dura e o filho Mohammed. Quem, com mais de 25 anos, não se lembra do pai palestino que protegia desesperademente o filho de 12 anos das balas dos soldados israelenses em Gaza?
O crime aconteceu às duas horas da tarde. 
Pai e filho estavam voltando para casa ao serem colhidos de surpresa em fogo cruzado entre a IDF e resistentes gazauís no cruzamento de Netzarim, em Gaza.
Jamal e o filho se agacharam atrás de uma barreira de concreto achando que estavam fora da linha de mira das posições da IDF. Gritaram por socorro, mas no alvoroço da troca de fogo, o que chegou foi uma bala que matou o menino como se tivesse virado um alvo. Os esforços do pai para esconder o filho aterrorizado foram vãos. Mohammed morreu no ato. O pai saiu gravemente ferido e foi hospitalizado.  Este acontecimento vale uma digressão de apoio ao competente colega francês Charles Enderlin, cuja vida virou nos últimos doze anos uma via-crucis inaceitável.

Desde esta reportagem fatídica vem sendo ameaçado, perseguido, agredido, caluniado, difamado profissionalmente, embora seu currículo seja sem falha.
O lobby pro-sionista extremista tem orquestrado campanhas sistemáticas de destruição de Charles  e até sua família tem padecido desta caça inexorável, inclusive com ameaças físicas.
Tudo isto porque o jornalista - um dos correspondentes estrangeiros mais bem informados sobre o conflito, há 20 anos baseado na região, hoje 30 - e seu cinegrafista palestino Ralal Abu Ramah, estavam em Gaza fazendo uma reportagem e flagraram o assassinato.
As imagens, que pertencem ao canal France 2, foram mostradas nas televisões do mundo inteiro e sua sentença foi assinada junto com a de Mohammed e de Jamal.
Eis a cronologia do que aconteceu depois do maior "furo" jornalístico da história do conflito.
Sob pressão internacional a IDF procede à investigação imediata e no dia 03 de outubro o comandante do batalhão do sul, Yom Tov Samya, confirma que o crime "parece ter sido cometido por um soldado que tinha visão reduzida e viu alguém escondido atrás de um bloco de cimento na direção de onde estava sendo atacado e atirou nessa direção."
E acertou no alvo.
O comunicado chega seco, protegendo a identidade do soldado, e sem desculpas pelo crime "acidental".
Apertados com a publicidade negativa, o governo de Israel apela então para a contra-informação costumeira esperando sair dessa com uma das estórias inverossímeis que serve à imprensa na bandeja.
No dia 27 de novembro a IDF resolve contradizer a própria investigação declarando que Mohammed poderia muito bem ter sido morto por um compatriota, semeando a dúvida onde para Charles Enderlin, presente no local, não havia nenhuma: o menino de 12 anos foi assassinado friamente por um soldado.
No dia 22 de novembro de 2004, um certo Philippe Karsenty, que se apresenta como "agente de notação da mídia", afirma que a reportagem foi trucada e evoca inclusive a "falsa morte" de Mohammed, semeando indignação e raiva no Sindicato de Jornalistas e na ultrajada família do menino.
No dia 19 de outubro de 2006 o Tribunal de Paris condena o tal Philippe Karsenty por calúnia e difamação.
No dia 02 de outubro de 2007 é de Tel Aviv diretamente que os israelenses atacam.
Daniel Seaman, chefe de imprensa do governo, acusa France 2 de ter feito uma montagem da cena, Charles Enderlin e Jamal al-Dura naturalmente desmentem, mas a campanha mediática do lobby na mídia tenta semear dúvida no terreno em que só há certeza contundente.

No dia 12 de maio de 2008 advogados ultra-sionistas israelenses exigem a cabeça de Charles Enderlin e no dia 21, Philippe Karsenty é surpreendentemente exonerado de culpa em Paris - sem se pronunciar sobre o conteúdo da reportagem, a Corte estima, por não se sabe que cargas d'água, que ele "exerceu de boa-fé seu direito de crítica e não ultrapassou os limites da liberdade de expressão" - France 2 e o Sindicato dos Jornalistas reagem.
No dia 01 de julho de 2008, a Corte israelense rejeita o descrendeciamento de Charles Enderlin que advogados locais solicitaram em maio.
No dia 08 de fevereiro de 2001 Jamal al-Dura dá queixa da revista "Acuatlités juives" (Atualidade judia) na qual o cirurgião israelense Yehuda David que o operara em 1994 alega que seus ferimentos eram anteriores aos tiros filmados. Ganha a causa. O cirurgião caluniador e o jornalista Clément Weill-Raynal são condenados no Tribunal de Paris, mas por incrível que pareça, o cirurgião recorre e no dia 15 de fevereiro de 2012 é inocentado. O jornalista é condenado a pagar 6.000€ por falta de "medida".
Porém, no dia 28 de fevereiro deste mesmo ano o Tribunal de Paris anula a exoneração de Karsenty e volta a condená-lo, para a satisfação do Sindicato dos Jornalistas e da liberdade de imprensa que é sempre chacoalhada quando a má conduta de Israel é posta em causa.  
O lobby israelense é tão eficiente junto à imprensa que convenceu até o célebre programa jornalístico da TV CBS estadunidense a apresentar a versão fictícia.
No Knesset poucas vozes se levantaram contra a manigância. Dentre estas, a do deputado Ophir Pines-Paz que afirmou que "parece que em vez de realmente encarar este incidente a IDF escolheu encenar uma ficção do fato para acobertá-lo através de uma investigação que visa unicamente inocentá-la do assassinato".
Todas as investigações independentes concluíram que foram soldados da IDF que atiraram no pai e no filho. Sem nenhuma dúvida. 
(Antes de fechar os parênteses deste crime a sangue frio, a título de informação, os egípcios batizaram uma rua do Cairo em homenagem a Mohammed al-Dura. Onde a embaixada de Israel é localizada.
Uma ideia ao prefeito de Brasília, São Paulo, Rio, enfim, todas as cidades brasileiras em que Israel tem representação diplomática.
Yitzhak Rabin tem bosque em Campinas, praça em São Paulo, talvez por ter ganho o prêmio Nobel de Paz que lhe deu destaque internacional. Para o bem do equilíbrio e da justiça pelo menos em terra tupiniquim, Yasser Arafat - co-recipiente do mesmo prêmio na mesma data - merecia se não um parque, pelo menos uma praça. Nem que seja para o Brasil parecer não estar privilegiando o ocupante em vez do ocupado.)  

No mesmo dia 30 de setembro em que Mohammed foi assassinado, mais 16 palestinos perderam a vida e os feridos se amontoavam nos hospitais e postos de saúde dos Territórios Ocupados. No dia 01 de outubro mais 14 jovens foram mortos, vários soldados da IDF estavam feridos e os helicópteros de combate retaliaram, metralhando os gazauís como em Apocalipse Now.
Em Nazaré os confrontos aumentaram e tanques se dirigiram a Nablus e atiraram como se estivessem em uma verdadeira guerra de forças armadas iguais.
Do outro lado voavam pedras, coquetéis molotov e estilingadas.

No dia 01 de outubro a Galileia primeiro parou em greve geral e depois pegou fogo com os nativos árabes nas ruas em passeatas que durante uma semana aumentaram em repressão e número de participantes.   Os soldados esqueceram que estavam lidando com cidadãos israelenses com direitos constitucionais e aplicaram o mesmo remédio que utilizavam nos Territórios Ocupados.   Com o mesmo resultado de mortos e feridos para todos os lados - mas estes árabes tinham direito a defesa, a dar queixa com advogado e este parêntese da Intifada seria o único que teria consequências jurídicas, embora limitadas. 
Enquanto Nazaré se solidarizava com os primos nos Territórios Ocupados, no dia 04 de outubro a secretária de estado dos EUA Madeleine Albright, na capital da França para uma reunião prevista há meses com a Comunidade Europeia, aproveitou para convidar Ehud Barak e Yasser Arafat para um encontro em Paris.
O intuito explicitado era tentar fazê-los voltar atrás no relógio e à "psicologia de fazer as pazes".
Ambos aceitaram o convite sem pré-requisitos. Talvez por saberem que cada um tinha um aliado e desta vez talvez pudesse haver em vez de monólogo, diálogo.
Inclusive a ordem das conversas particulares respeitou a simpatia dos mediadores com a causa dos mediados.
De manhã, o presidente Jacques Chirac encontrou Arafat no Palais de l'Elysée enquanto Albright passava uma hora e meia com Barak na embaixada dos EUA, que fica do lado.   Na dança das cadeiras, os adversários depois trocaram de lugar sabendo de antemão que com o interlocutor seguinte não ganhariam nenhum ponto a mais.   A França, então na presidência da Europa, acabara de declarar Ariel Sharon responsável pela explosão de violência e Albright, bem, Albright não queria ver Arafat nem folheado a ouro brandindo a bandeira de Israel enrolado na dos EUA. Tal era sua aversão pelo líder palestino indomável.
Estava previsto que após as conversas matutinas com Chirac e Albright, Barak e Arafat se encontrassem junto com a Secretária de Bill Clinton na Embaixada.
Porém, ao sair da reunião com Chirac, Barak logo recorreu à arma da contra-informação para defender-se com um ataque. Fez de conta que Sharon não fizera nada e declarou à imprensa que "a Autoridade Palestina é responsável pela explosão de violência. Estamos prontos para terminar com ela assim que os palestinos cessarem fogo."
A inversão descarada dos papeis atingiu Arafat como um golpe baixo e a reunião tripartite prevista para as 15 horas acabou virando mesmo foi outro bate-papo entre Albright e Barak.
Para não entrar de gaiato, Arafat ficou no seu canto e declarou que só encontraria Barak se este concordasse com uma comissão de inquérito internacional reunindo representantes dos dois lados, dos EUA e também da Comunidade Europeia, para investigar os massacres cometidos pela IDF contra seus concidadãos.
"Rejeitamos categoricamente o apelo a uma investigação internacional sobre os incidentes nos Territórios Ocupados", respondeu o porta-voz israelense trancando o colóquio anunciado.
As duas outras reivindicações de Arafat foram igualmente rejeitadas - cessar fogo israelense e retirada das tropas "das cidades autônomas sitiadas e da esplanada da mesquita Al-Aqsa."
Ehud Barak limitou-se a propor uma concertação entre responsáveis de segurança israelenses e palestinos... monitoradas exclusivamente por enviados dos Estados Unidos.
Arafat saiu de mãos vazias, mas sensibilizado com o apoio de Jacques Chirac. 
Quando o encontro de três dias em Paris terminou, mais de 60 palestinos já tinham sido ou estavam sendo enterrados. Desde o dia 30 os combates não tinham parado.

No dia 06, "Dia da cólera", as passeatas lideradas pelos universitários foram seguidas em massa. E os enterros pareciam procissões em que todos haviam sido atingidos na carne.   Em Nablus, na Samaria, uma das cidades mais visadas pela IDF, os manifestantes conseguiram fazer os soldados israelenses baterem em retirada pela primeira vez desde 1948.
Deixaram para trás mortos, feridos e uma multidão ressentida e descontrolada que invadiu um monumento judeu que abrigava o túmulo do patriarca Joseph com sua yeshiva que os soldados há anos protegiam azucrinando a vida dos cidadãos locais.
Puseram tudo abaixo.
O erro estratégico da retirada ordenada pelo general primeiro-ministro Ehud Barak foi alardeado por seus oponentes e este jogou a culpa na Autoridade Palestina sob cuja proteção deixara o sítio como "estipula os Acordos de Oslo."
Do lado da Autoridade Palestina nem se deram ao trabalho de sublinhar a ambiguidade oportunista dos israelenses manterem soldados contra os Acordos de Oslo quando lhes aprazia e passar o bastão quando a situação periclitava.
A polícia palestina, msmo que quisesse - mas não queria - não tinha nenhuma capacidade de manter a ordem.
A multidão usou dos mesmos meios do ocupante. Pegou um dos bulldozers usados na destruição de suas casas e não deixou pedra sobre pedra no monumento.
No dia 08 milhares de judeus israelenses foram à caça de árabes em Tel Aviv destruindo propriedades gritando "Morte aos árabes". Muitos reagiram, a IDF interveio em defesa dos atacantes como em Nazaré e com as mesmas consequências jurídicas na Comissão Or, que em 2003 culparia Ehud Barak e seu ministro de segurança pública Shlomo Ben-Ami - sem punição grave para nenhum dos dois.
No dia 12, dois reservistas israelenses supostos agentes infiltrados para semear desordem, foram capturados em Ramallah, os boatos logo se espalharam e uma multidão rendeu os policiais palestinos que os protegiam e o lincharam. As imagens foram filmadas por um cinegrafista italiano e mostradas nas televisões israelenses sem parar, provocando comoção geral.
Ehud Barak pôs então toda sua força bélica em marcha e a represália foi de uma violência tão bárbara quanto à dos linchadores. E em proporções desmesuradas. A IDF bombardeou Gaza, Ramallah, Nablus, Hebron, Jericó e sitiou todas as cidades palestinas, que ficaram ilhadas, com paredes esburacadas e crivadas de balas. Uma das cidades mais visadas pelos mísseis era Beit-Jala. Cidade de população cristã majoritária em cuja vizinhança os israelenses construíram a controvertida colônia judia Gilo - que há pouco foi aumentada. Esta colônia pregada em Jerusalém Oriental virou alvo da intifada porque os palestinos queriam mandar a mensagem clara que não aceitariam mais as invasões estrangeiras de braços cruzados. E a IDF descontava nos beit-jalenses - desde 2001 a situação só tem piorado e até as igrejas correm perigo de serem postas abaixo.   
Um dos mísseis desta leva caiu "por acaso" a 50 metros da Muqata'a, centro administrativo da Autoridade Palestina em Ramallah, com Yasser Arafat no recinto.
(Al-Muqata'a significa A Separada em árabe. São Fortes Tegart - nome do inglês que os arquitetou - construídos para abrigar complexos administrativos - continham às vezes até delegacias e prisões- em várias cidades palestinas durante o Mandato Britânico. Foram passados à Autoridade Palestina após os Acordos de Oslo para que instalasse o poder executivo e outros órgãos administrativos nacionais.  A Mukataa de Hebron foi logo destruída pela IDF. A de Gaza e de Ramallah passaram a ser usadas como sede da Autoridade Palestina e de residência do líder yasser Arafat.)
O ataque pessoal ao líder palestino foi tomado como uma afronta ao povo inteiro e a revolta aumentou por todos os lados.
A mídia internacional redescobriu a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, a Palestina virou notícia, atraindo a atenção da opinião pública internacional e dos governantes dos países ocidentais.
Aí os grandes deste mundo resolveram tomar uma providência. O secretário das Nações Unidas Kofi Annan, o representante da União européia Javier Solana, o rei Abdallah da Jordânia, o presidente do Egito Hosni Mubarak e Bill Clinton conseguiram reunir Ehud Barak e Yasser Arafat em Charm el-sheikh nos dias 16 e 17 para os dois homens dialogarem.
A tensão era palpável e o clima de desconfiança era tão pesado que talvez nem Bill Clinton acreditasse que algo positivo pudesse ser alcançado.

O presidente dos Estados Unidos quase implorou aos dois homens que parassem de jogar a culpa no outro e olhar além da culpa do passado, mas Ehud Barak só focava na revolta "inadmissível" e Yasser Arafat nos cem mortos que já estavam sendo enterrados e nas centenas de feridos e detentos que temia que estivssem sendo torturados.  
O interessante é que todos os presentes culpavam Israel pela violência, mas ninguém fez nenhuma declaração pública, deixando espaço para a contra-informação circular à vontade.
No final da conversa forçada os dois homens concordaram primeiro que apelariam publicamente par ao fim da violência mútua e para manter a calma - o que do lado de Barak era uma questão de hierarquia militar simples e do lado de Arafat uma complicada campanha de convencimento de seus compatriotas que chegariam a algum lugar depois disso.
Isso era colaboração securitária e reabertura do aeroporto de Gaza, com a promessa dos Estados Unidos de facilitarem a cooperação recíproca, caso fosse preciso.
O segundo parágrafo do memorandum estabelecia que os EUA desenvolveriam com israelenses e palestinos, em consulta com o secretário geral da ONU, um comitê que estabeleceria os fatos das últimas semanas a fim de prevenir que se repetissem. Tal relatório seria apresentado à ONU para apreciação e seria publicado pelo presidente dos Estados Unidos.
O terceiro parágrafo determinava que ter-se-ia de retomar as negociações no intuito de um Estatuto Permanente baseado nas Resoluções 242 e 338 do Conselho de Segurança das Nações Unidas daí a duas semanas.  
No dia 20 de outubro a ONU aprovou a Resolução 1322 condenando o excesso de força israelense contra os civis palestinos solicitando que Israel se conformasse escrupulosamente a suas obrigações jurídicas estipuladas na Convenção de Genebra, e instou as partes a retomarem o diálogo.
Ehud Barak, em seguida, cancelou com uma frase o que acabara de combinar dois dias antes no Egito. Anunciou uma pausa no processo de paz enquanto "as violências durassem". 
No dia seguinte a Liga Árabe iniciou uma reunião de cúpula de dois dias sobre o assunto. Não tinham como continuar omissos por causa da pressão das passeatas em todas as capitais árabes.
A reunião dos magnatas do petróleo foi pro forma. Acusaram Israel de "estar em guerra contra o povo palestino", mas não adotaram nenhuma medida drástica contrária.   
O comitê para o exercício dos direitos inalienáveis ao povo palestino reuniu-se para examinar a situação e reafirmou sua posição, que a ONU tinha de continuar a assumir sua responsabilidade inerente no tocante a todos os aspectos da questão palestina até que os palestinos pudessem exercer seus direitos soberanos.
Bill Clinton voltou para casa e como estava apressado nomeou logo o presidente da comissão de investigação que relançaria as perspectivas de paz. Desta vez resolveu chamar um peso pesado. Uma pessoa fiável, experiente e sem agenda própria ou partidária. O senador George Mitchell que merece uma palavrinha pelo quanto vale. É de descendência líbano-irlandesa, mas mais importante do que sua origem arabo-europeia, era a reputação adquirida durante os seis anos de mediador na Irlanda do Norte. Lá foi o arquiteto de dois acordos importantes no conflito que opunha  Irlanda vs Irlanda do Norte e Grã-Bretanha. Primeiro estabeleceu regras importantes em 1996, chamadas "Princípios Mitchell" e em 1998 mediou o "Acordo da Sexta-feira da Paixão" que foi um grande passo para o fim do conflito que durava décadas, ou séculos. 
Não havia nos Estados Unidos homem com melhores credenciais. Se tivesse tido poder de resolver o problema além de apenas relatá-lo, Israel não teria vandalizado tanto a Palestina moral e materialmente, e a Intifada e a repressão correlata não teriam causado tantas mortes de ambos os lados.


Entrevista com Charles Enderlin em francês

The bottom line is this: Peace will come to Israel and the Middle East only when the Israeli government is willing to comply with international law, with the Roadmap for Peace, with official American policy, with the wishes of a majority of its own citizens--and honor its own previous commitments--by accepting its legal borders. All Arab neighbors must pledge to honor Israel's right to live in peace under these conditions. The United States is squandering international prestige and goodwill and intensifying global anti-American terrorism by unofficially condoning or abetting the Israeli confiscation and colonization of Palestinian territories.”
Jimmy Carter, Palestine: Peace Not Apartheid

Reservista da IDF, Forças israelenses de ocupação,
Shovrim Shtika - Breaking the Silence 1
Global BdS Movement: http://www.bdsmovement.net/

quarta-feira, 4 de julho de 2012

O que matou Yasser Arafat?


Colegas da TV Al-Jazeera, sem dúvida alguma a melhor televisão informativa do planeta, passaram nove meses investigando a morte de Yasser Arafat junto a médicos suiços em Lausanne e acabaram de soltar uma bomba.   É por isto que estou quebrando meu jejum semanal e publicando outro artigo antes do domingueiro tradiconal.   Desde a morte suspeita de Yasser Arafat em 2004, muitos jornalistas e todos os palestinos questionam como um homem ativo como o líder palestino começou a definhar sem razão aparente até sucumbir rapidmente a uma doença indefinida.
Suspeitava-se de um assassinato perfeito, indetectável, sobretudo porque os médicos franceses que o trataram no final não divulgaram a causa e porque, segundo o costume muçulmano, nenhuma autópsia foi feita.
Ficou esta pulga atrás da orelha de muitos jornalistas sem meios de ir além da suspeita.
Mas para o bem do público a Al-Jazeera tem meios e tem hoje a melhor equipe de tele-jornalismo internacional do planeta, rivalizando, e em algumas áreas até ultrapassando, a BBC inglesa.
Os meios financeiros são incomparáveis e a liberdade de investigação é maior do que de qualquer outro canal. Com exceção de alguns pouquíssimos países caros ao Qatar...
Vamos aos fatos. 

Primeiro o general Ariel Sharon, então primeiro ministro de Israel, sediou Yasser Arafat durante semanas em sua residência em Ramallah. Enquanto isto o líder palestino adoecia e definhava até ser transportado a um hospital militar na França para ser examinado.   A suspeita de envenenamento foi imediata, pois adoeceu subitamente no dia 12 de outubro de 2004 de uma doença fatal indetectável - mas na época os testes não revelaram nenhum traço suspeito, ou pelo menos, não reveleram nada publicamente.
Pois bem, após uma investigação de nove meses e exame de roupas e objetos que Arafat usou nos dias que antecederam sua morte - roupa, escova de dente e até seu icônico kefiyeh que não tirava da cabeça - revelaram uma quantidade anormal de polonium. Um elemento radioativo raro ao qual poucos países têm acesso. Apenas os do restrito clube atômico.
Os cientistas suiços examinaram sangue, suor, saliva e urina e encontraram alto dose radioativa.
O Dr. François Bochud, diretor do Instituto de Radiofísica de Lausanne declarou com firmeza "Eu posso confirmar que medimos uma quantidade elevada inexplicável de polonium-210 nos pertences do Sr. Arafat que continham manchas de fluidos biológicos."
A análise dos pertences de Yasser Arafat foi feita no Centro Hospitalar Universitário de Lausanne, no Centro de Medicina Legal que é considerado um dos melhores laboratórios criminologistas do mundo - usado inclusive em investigações da ONU  e de mortes de personalidades como o da princesa Diana da Inglaterra.
O polonium foi descoberto m 1898 por Marie Curie, cuja filha Irene foi a primeira vítima deste elemento altamente radioativo usado em várias atividades nucleares, dentre elas foguetes espaciais.
A vítima contemporânea mais famosa é o espião russo dissidente Alexander Litvinenko que morreu em Londres em 2006 definhando desta "doença" incurável. A investigação britância que sucedeu sua morte provou que foi envenenado com polonium posto no chá em um restaurante japonês.
Litvinenko sofreu dos mesmos sintomas que afligiram Yasser Arafat quando adoeceu: diarreia severa, vômito e perda de peso.  

Os pertences de Arafat revelaram doses quatro a dez vezes mais elevadas do que as usadas nos testes feitos em cobaias animais. O polonium está na atmosfera, mas em nível quase indetectável. A escova de dentes de Arafat acusou 57mbq, a urina 180mbq (a de outra pessoa continha 6.7) o que prova que a origem do elemento não era natural. 
Faz anos que Suha vem investigando a morte do marido. Já pedira exame mais detalhado das amostras recolhidas no hospital Percy na França e recebera a resposta que estas haviam sido destruídas, o que a deixara desconfiada. "Eu não fiquei satisfeita com a resposta. Normalmente, guardariam traços da passagem de uma pessoa importante como Yasser - talvez eles não quisessem e não queiram ser envolvidos nisso." 
Vários médicos estrangeiros que trataram de Arafat lhe responderam que não tinham permissão de comentar o caso porque era considerado "segredo militar". Inclusive os médicos tunisianos e egípcios que o examinaram em Tunis e no Cairo recusaram entrar em detalhes com os jornalistas e com Suha.
Qualquer que seja o fim desta história, Suha Arafat e a filha Zahwa de 17 anos esperam encontrar a explicação que procuram sobre a razão da morte do líder palestino que para elas é também o ente querido brutalmente perdido.
É por isto que Suha solicitou e conseguiu o apoio da Autoridade Palestina para exumar o corpo do marido enterrado na Mubaqaa em Ramallah e está pedindo apoio internacional para que Israel e os Estados Unidos não impeçam o trabalho dos cientistas suiços e outras sumidades internacionais especializadas neste campo de análise.
Saeb Erekat, o chefe de negociações da Palestina, além de confirmar a autorização de exumação dada por Abu Mazen (conhecido internacionalmente como Mahmoud Abbas) solicitou à ONU a criação de um comitê internacional para investigar a morte de Yasser Arafat. Como o que investigou o assassinato do primeiro ministro libanês Rafik Hariri em 2005.
"Vamos acionar o Conselho de Segurança das Nações Unidas e esperamos que todos cooperem conosco, pois buscamos a verdade, nada mais do que a verdade", disse Erekat.
Caso os testes mostrem altas doses de polonium nos ossos de Arafat, a conclusão de assassinato por envenenamento será incontestável.
Restará determinar oficialmente quem passou da vontade de vê-lo morto ao ato de envenená-lo no anonimato.

Documentário Al-Jazeera: What killed Yasser Arafat?





domingo, 1 de julho de 2012

UNESCO tomba a Natividade, o SCAF policia o Cairo e na Síria, diplomacia



Acho que já foi manchete de todos os jornais do mundo, mas mesmo assim, resolvi marcar a data histórica acrescentando, espero, mais informações do que as que foram dadas na imprensa nacional. 
No dia 29 de junho a UNESCO (Organização Educacional, Científica e Cultural da ONU) reforçou sua posição de árbitro independente do controle estadunidense das Nações Unidas garantindo à Basílica da Natividade e à rota de peregrinação em Belém, na Cisjordânia, o estatuto de Patrimônio Universal da Humanidade, palestino, em perigo.
Junto com o gesto simbólico, desbloqueou verba para a restauração dos estragos. Causados pela visita anual de cerca de dois milhões de peregrinos cristãos (cujos euros e dólares não contribuem à economia local e sim à de Israel, devido ao controle turístico), pelas "obras" do muro/barreira de separação e pelas investidas militares da IDF em 2002 durante a campanha "Defensive Shield", sob o comando do então primeiro ministro Ariel Sharon.
A reunião dos 21 membros do Comitê de Patrimônio Universal (África do Sul, Alemanha, Argélia, Camboja, Colômbia, Emirados Árabes, Estônia, Etiópia, França, India, Iraque, Japão, Malásia, Mali, México, Qatar, Rússia, Senegal, Sérvia, Suiça, Tailândia) foi na Rússia, em São Petersburgo, cidade simbólica do cristianismo. Treze votaram a favor, dois se abstiveram e seis votaram contra.
O lobby dos Estados Unidos e Israel foi onipresente durante a campanha palestina de emergência, mas a Unesco já provara no ano passado que este lobby, lá, não é onipotente e desta vez também não conseguiu impedir o voto favorável.

Diretora da UNESCO, a búlgara Irina Bokova,
com o presidente da Autoridade Palestina Mahmoud Abbas,
durante o reconhecimento da Palestina na Organização no ano passado

http://mariangelaberquo.blogspot.fr/2011/10/unesco-desafia-onu-afeganistao.html
 http://mariangelaberquo.blogspot.fr/2011/11/unesco-diz-sim-palestina.html 
Vale lembrar que ao contrário da ONU em que as decisões da Assembleia dependem de ratificação unânime do Conselho de Segurança composto de cinco membros (China, Estados Unidos, França, Inglaterra, Rússia), o Comitê da Unesco funciona por maioria.
Foi assim que a Palestina foi reconhecida no ano passado apesar da rejeição dos Estados Unidos, de Israel e dos países a estes submissos.
O interessante do escândalo mundial causado pelo voto da Unesco é que no mesmo dia, da lista  de 35 candidatos (inclusive uma paisagem litorânea no Rio de Janeiro), a Basílica da Natividade não foi o único sítio escolhido no Oriente Médio.
Entre os cinco tombados, dois eram lá localizados.
O outro foi o Monte Carmelo, em Israel, chamado pelos israelenses de Sítio da Evolução Humana - as grutas de Nahal Me'arot/Wadi el-Mughara.
Esta inscrição passou em brancas nuvens e não foi contestada.
Só para refrescar a memória, a Lista de Patrimônio Universal foi criada em 1972 e contém 936 propriedades. 725 culturais, 183 naturais e 28 propriedades mistas, em 153 Estados, inclusive o Brasil, como se sabe - e a Catedral Notre Dame, em Paris, na França.  
O governo de Israel ficou tão preocupado em condenar e denegrir a vitória dos palestinos - e da humanidade - que nem celebrou sua vitória pessoal.
Soltou o veneno costumeiro junto com o padrinho estadunidense e apesar do voto duplo da Unesco ter demonstrado que não queria botar lenha na fogueira da discórdia, os dois inimigos mortais (literalmente) da Palestina foram de uma ingratidão que surpreendeu os ingênuos.
O comunicado de imprensa do ministro das relações exteriores de Israel - o colono fascista Avigdor Lieberman - dizia que "Isto prova que a UNESCO está agindo com considerações políticas e não culturais.... O mundo deve lembrar que a Igreja da Natividade, sagrada para os cristãos, foi dessacralizada no passado por terroristas palestinos".
Lieberman referia-se ao episódio que abordaremos dentro de domingos na História do conflito Israel vs Palestina, em que durante a operação Defensive Shield os padres deram santuário na Igreja a resistentes palestinos cristãos e muçulmanos que corriam risco de vida. Lieberman, que quase matou um menino palestino que sem água em casa tentou tomar um pouco da dele que abundava, não entende muito bem ou de jeito nenhum a noção cristã de santuário à qual nossas igrejas são engajadas. Coitado.
Quanto a seu porta-voz Yigal Palmor, declarou que Israel não se opunha à inclusão da Igreja da Natividade na lista de Patrimônios da Humanidade (como se sua opinião mudasse algo), mas considerou esta iniciativa um gesto político contra Israel.
Que eu saiba, nem Palmor nem Lieberman nem o primeiro ministro Netanyahu demonstraram satisfação pela inclusão do sítio israelense no Patrimônio da Humanidade. Reconhecimento pelo gesto de moderação diplomática da UNESCO, então, nem se fala, é claro. 
Nem Barack Obama, que em plena campanha eleitoral anda às catas dos dólares do lobby sionista da AIPAC e não quer deixar mais espaço nem dinheiro ao rival.
Através de seu embaixador David Killion, o presidente dos EUA declarou-se "profundamente desapontado com o Comitê. Este Corpo não deveria ser politizado". 
Cultura e política sempre andaram de mãos dadas. Ou Obama não sabe? 

Enquanto Israel e os EUA resmungavam engolindo a bilis do ódio, os palestinos nem pensavam em lamentar a inclusão do Monte Carmel na Lista. Só pensavam em celebrar o novo estatuto de proteção internacional da Basílica da Natividade e do caminho que os peregrinos seguem para chegar até ela.
O primeiro ministro palestino Salam Fayyad reconheceu a importância internacional para um futuro Estado Palestino, o fato de seu país ter sido colocado junto com nações e culturas mundiais, "e um triunfo da justiça". 
A parlamentar cristã Hanan Ashrawi, porta-voz da Autoridade Palestina, declarou por sua vez que "o voto foi uma afirmação da soberania palestina sobre o sítio que para os cristãos marca o nascimento de Jesus Cristo."  
Para quem ainda não esteve na Basílica da Natividade, uma rota de peregrinação leva até a portinha baixa que força o peregrino a abaixar-se em um gesto de humildade para adentrar o recinto sagrado.
A igreja em si é adornada de mosaicos e lâmpadas e uma escadinha leva o visitante à gruta da Natividade.
A basílica foi edificada no ano 339 DC pelo imperador romano Constantino I (que também construiu Constantinopla - atual Istambul e a igreja Hagia Sofia).
O sítio fica a 12 quilômetros de Jerusalém, na gruta que Justino identificou no Século II como a gruta em que Nossa Senhora dera a luz.
A basílica foi queimada no século VI e restaurada em seguida com a preservação dos mosaicos originais do assoalho.
O sítio inteiro comporta os conventos ortodoxo, armeniano, latino; a igreja de Santa Catarina; a torre com um sino da época; jardins e rota de peregrinação controlada pelos soldados israelenses. 
Tudo foi incluído na Lista e em princípio a IDF terá de deixar, pelo menos nestas imediações, os palestinos, os turistas conscientes e os ativistas internacionais em paz. 
Daí a procedência de emergência usada pela delegação palestina.
"O sítio tem claramente tremendo significado histórico", disse o embaixador dos EUA, "porém, o procedimento de emergência usado é reservado a casos extremos".
Que era este caso. Evitar a pressão do lobby antagonista sobre os membros do Comitê e conseguir que o voto sofresse o mínimo de influência possível.
Que esperneiem ou se conformem não mudarão o fato que desde o dia 29 de junho de 2012, a Igreja da Natividade está inscrita na UNESCO desta forma: propriedade da Palestina N31 42 15 67 E35 12 27 de 2.98 hectares em um zona de 23 hectares, referência 1433.
O processo é, em princípio, irreversível.
Esta vitória diplomática só será completa quando os turistas ocidentais em visita aos sítios cristãos da Terra Santa - Jerusalém, Jericó, Betânia, Monte das Oliveiras - começarem a exigir das agências de turismo que lá os levam que contratem guias palestinos (além do gesto  solidário, estes têm a vantagem de saber realmente do que falam, pois além de conhecerem os Evangelhos, conhecem suas cidades ancestrais de cor e decorado).
E quando você estiver lá, não entre e saia dos locais como uma ovelha alienada. Ande pelas ruas de Belém, Jericó, Betânia, Jerusalém Oriental e consuma algo nos "botecos" e restaurantes locais. O chá de menta palestino é delicioso e os doces são de comer ajoelhado!
Concluindo com duas perguntas de incentivo à caminhada de braços dados com um cristianismo real, realista, engajado: Quando a UNESCO vai tombar a Jerusalém antiga, Gaza, para proteger esta cidade de cinco mil anos dos bombardeios constantes que a desfiguram desde 1967;  e quando a ONU vai acabar com a ocupação civil e militar da Palestina mandando os capacetes azuis imporem as leis internacionais?
O reconhecimento da Igreja da Natividade é só o segundo passo.
Ainda faltam muitos para que justiça seja feita de maneira integral.


Enquanto isto no Cairo, dezessete meses depois dos estudantes ocuparem a praça Tahrir exigindo trabalho e liberdade, os egípcios exerceram o direito democrático, votaram e escolheram para a presidência Mohammed Morsi, o candidato da Irmandade Muçulmana.
Alguns colegas jornalistas veem a vitória de Morsi como uma derrota para o movimento de liberdade que só integrou após a prisão de Mubarak.
Pensando a curto prazo, concordo quando a análise é baseada nos dois seguintes fatos.
O primeiro releva do papel nulo ou fraco que a Irmandade representou no processo revolucionário. Longe de valer-lhe a liderança máxima da nação que pouco fez para livrar de Hosni Mubarak.
O segundo releva dos conchavos feitos durante os meses de transição com o SCAF - Conselho Supremo das Forças Armadas - para aceder ao cargo máximo.
Aliás, a relação entre a Irmandade Muçulmana e o SCAF foi mais do que de conchavo. Foi um Amém às emendas legais feitas pelos militares antes das eleições.
Dentre elas, uma que submete o presidente ao comando militar e não o inverso - todas as decisões de segurança são da alçada do SCAF e não do presidente eleito. Inclusive declaração de guerra - "O presidente da República declara guerra após aprovação do SCAF", é a frase específica do estatuto atual.
Estas emendas foram publicadas no Jornal Oficial al-Jaridah Al-Rasmiyyah que detalhou as atribuições do SCAF antes das eleições esvaziando o poder de qualquer candidato que o povo elegesse. 
Falando em povo, outra emenda floreada com belas palavras - "princípios revolucionários", "interesses nacionais" -  atribui poder aos oficiais militares de policiar os civis e usar força considerada constitucional, além de autorizar o presidente a ordenar que as forças armadas o ajudem a manter a ordem pública e a proteger instalações vitais... Ordem esta também submetida à aprovação do Conselho.
O pior não é a restrição de poder do presidente ao lado.
O pior é a expansão dos poderes do SCAF até na Constituição que ainda vai ser escrita e aprovada.
Os generais do Conselho se outorgaram o direito de leitura do rascunho da constituição e de contestar sua substância antes de ser passada a limpo. Pode revisar qualquer cláusula que "contradiga os objetivos e os princípios básicos da revolução".
E uma das emendas autoriza o SCAF a assumir o controle da Assembleia Constituinte - se esta encontrar algum obstáculo - a formar outra Assembleia em uma semana e que esta redija a Constituição em três meses, submeta-a a referendum nas duas semanas seguintes e proceda a eleições parlamentares em seguida.
Além do controle político o SCAF preenche o vácuo do Poder Judiciário quando se nomeia "árbitro moral" da nação.
Tem um artigo em que concede o mesmo direito de vistoria da Constituição ao presidente, ao primeiro ministro, ao Conselho Supremo do Judiciário, ou a um quinto da Assembleia Constituinte. Sob aprovação do SCAF.
Apesar disso tudo - é aí que discordo dos colegas pessimistas - acho que o país do qual o SCAF tem as rédeas não é mais aquele de "Primeiro, Mubarak!" 
Este Egito em renovação tem partidos políticos de várias cores e os estudantes não vão submeter-se facilmente à "democradura" militar que os generais desejam.    
Com as passeatas experimentaram a liberdade.
Com Mubarak foi-se o medo de reivindicar seus direitos e viver plenamente os valores democráticos que reivindicaram.  
Sem contar que a integração dos religiosos ao processo político, com todas as imperfeições da Irmandade Muçulmana, divide os polos e pode não ser nociva, se for moderada.
Quem quer que esteja no poder, o que os jovens egípcios que ocuparam a Tahrir em janeiro de 2011 querem mesmo é um país em que cooptas e muçulmanos, religiosos e laicos, homens e mulheres convivam e contribuam para o desenvolvimento de um país que lhes dê perspectiva e trabalho.
E com o SCAF protegendo todos em vez de oprimir o povo de mãos dadas com os Estados Unidos.
Só para lembrar o que o SCAF representa, quem lidera o Conselho é o general Mohamed Hussein Tantawi Soliman. Pois é, aquele mesmo que comandava as Forças Armadas desde 1991 como ministro da defesa de Hosni Mubarak. Foi ele também que comandou as tropas egípcias na "Guerra do Golfo" liderada pelos Estados Unidos de George Bush pai.
Mohammed Morsi inaugurou seu mandato com um discurso de desafio, de independência, em suma, de rebelião contra o SCAF.
O futuro dirá se foi só para acalmar os universitários ou se está realmente determinado.
De qualquer jeito, no caos econômico em que se encontra o Egito (a Tunísia, ídem), a faixa presidencial devia estar com um abacaxi pregado.



Não canso de lembrar neste blog que a Palestina tem sido ocupada, pilhada, humilhada e "purgada" dos nativos desde 1948. 64 anos. Ocupação ilegal, segundo as Nações Unidas, mas mesmo assim tolerada bem que mal, apesar das inúmeras Resoluções abastratas infrutíferas.
A Síria, que vive um conflito interno, em um ano despertou a atenção das Nações Unidas e do secretário geral Ban Ki Moon cedeu lugar a seu predecessor no cargo Kofi Annan, menos identificado como porta-voz dos Estados Unidos, e Hillary Clinton fez da queda de Bashar el-Assad o cavalo de batalha internacional prioritário.
Primeiro queria uma intervenção militar, mas Vladimir Putin disse Нет (Niet, não) e os oponentes de Assad acabaram "só" com armas, primeiro leves, depois pesadas.
Vendo que a Rússia não abria mão e que Pequin seguia Moscou nesta decisão, acabou concordando com uma solução diplomática. Contudo, tirando Assad da jogada.
Na reunião da comissão internacional do dia 30 de junho, Putin repetiu sem Assad Нет e tiveram de procurar outra fórmula.
Aliás, resolver um problema sem os interessados é outra coisa comum que não entendo.
É aquela postura paternalista dos países ocidentais - não nós, mas os que dominam o mundo - acharem que sabem mais o que é melhor para uma nação do que os cidadãos locais.
Esta condescendência intelecto-cultural só causa danos. Vide o Afeganistão, o Iraque, enfim, onde quer que a OTAM intervenha e em vez de resolver agrave o problema.
Mas como defendo a cem por cento a diplomacia e o poder estável do diálogo contra a instabilidade da força bruta das armas, apoio a iniciativa de Kofi Annan e torço para que acordo se faça.
Mais cedo do que tarde.


Global BdS Movement: http://www.bdsmovement.net/