domingo, 5 de maio de 2013

Bush-Obama, Iraque-Síria, e a hi/estória de armas químicas



Israel bombardeou a Síria, em território desta, na semana passada. 
O comunicado israelense disse que era para bloquear um comboio de armas para o Hezbollah.
Nenhuma palavra sobre o bombardeio de domingo, testemunhado por moradores de Damasco.
Em janeiro a IDF já se dera ao direito de invadir o espaço aéreo sírio para bombardear o mesmo local - o centro de pesquisas de Jamraya.
A provocação israelense é clara, espera que Assad revide e dê motivos para a IDF usar seu arsenal e começar uma Guerra Mundial a partir do Oriente Médio. 
Acho que todo mundo no Planeta entendeu que faz meses que Obama prepara o terreno para convencer os estadunidenses incautos e estrangeiros com memória falha que Bashar el-Assad usou arma química na Síria.
Na guerra paralela da contra-informação, da "Inteligência" burra, era de se esperar que acabasse chegando ao ponto de afirmar "com certeza" que Assad está usando armas químicas em seus compatriotas.
Quem viu as armas serem usadas?
Quem viu vítimas sem ser em fotos facilmente adulteradas?
Daqui a pouco completa dois anos que começou a revolta. Que aos poucos se transformou em guerra civil do governo contra várias facções rebeldes díspares e disparates, salafistas integristas, estrangeiros extremistas. 
Hoje, no terreno, a população não sabe quem é o Mocinho quem é o Bandido. Só sabe na última hora, quando sobrevive a uma passagem de tropas "rebeldes" ou regulares e as mulheres da casa não são estupradas.
Já se viu armas leves, pesadas, facões, facas, tanques, helicópteros, mas armas químicas só se ouviu falar de casos isolados do uso do gás sarim, em curta escala, em Aleppo, Homs e Damasco.
Mas não se sabe de onde vem e nem por quem foi usado.

 Só em Israel e nos Eua onde o boato foi espalhado é que "têm certeza" que armas químicas estão sendo usadas.
O fato é que acabaram entendendo que não há fim à vista deste conflito que começou há dois anos e cuja estimativa de mortos já está em 70 mil - número fornecido pela ONU sem nenhuma prova concreta possível do número exato. 
Estima-se também que 3 milhões de sírios estejam ao Deus dará e cerca de um milhão tenha escapado para Turquia, Líbano e Jordânia.
Além da perda de vidas, que é certamente grande, mas impossível de ser calculada no caos atual, há a perda material, que esta sim é visível por toda parte.
A Economia e a infraestrutura do país sofreram um colapso claro.
Em 2010 o PIB da Síria era avaliado a US$57.5 bilhões. Hoje caiu abaixo de US$30b. A libra síria (LS) perdeu a metade do valor. Trocava-se LS47 por um dólar. Hoje troca-se por LS85 no mercado oficial e bem acima de 95 no mercado negro.
E o desmoronamento da arquitetura antiga e dos domicílios é de cortar o coração, em um país tão bonito.
Mas arma química...
O que se ouviu foi a "fiável" "Inteligência Militar" de Israel - que vive contando estórias pra boi dormir e fazendo horrores na Palestina - dizer que o Exército de Bashar el-Assad usou ou talvez tenha usado ou teria usado ou talvez use armas químicas.
Que atualmente são protegidas hermeticamente e por um batalhão de soldados para que não caiam em mãos erradas. Que é preocupação constante de Assad.  
Portanto, nada concreto em escala suspeitável, mas "suspeitas" que Netanyahu adoraria transformar em realidade.  
O que se viu foi o Ministro da Defesa dos EUA Chuck Hagel em Tel Aviv prometendo um suplemento de armamento pesado - além das mais de 200 bombas nucleares que Israel possui por fabricação própria e os US$3 bilhões anuais que recebe para usar nos territórios palestinos ocupados - e trocando figurinhas sobre a "Inteligência" (Serviço Secreto) israelense no uso provável-possível-desejado de armas químicas na Síria.
Aí Chuck Hagel voltou para Washington alimentado de conjeturas pontuadas de pontos de exclamação no lugar de pontos de interrogação e da lenga lenga perisoga.
Foi à Casa Branca e repetiu as palavras, com vírgulas, ao "most powerful man of the world" (como dizem em Hollywood).
Deve ter sido convincente na pontuação e nos tempos verbais usados inadequadamente. Pois o "Chief of the Free World", hoje, Barack Obama (que sabe quão pouco fiável é o Primeiro Ministro de Israel) diz para o Congresso dos Estados Unidos (de cuja autoriação precisa para lançar suas bombas) que a Inteligência dos EUA (talvez as mesmas de Israel já que normalmente trabalham de mãos dadas) têm "varying degrees of confidence" nesta informação de armas químicas.
Aí a senadora Dianne Feinstein, chefe da Comissão de Inteligência do Senado, entrou em cena.
Um parênteses sobre esta mulher e sua história de amor cego sionista. Ela ousou defender Israel até em 1996, logo depois da IDF ter massacrado 105 crianças em Qana, no Líbano.
Pois bem, foi esta fã de Israel que anunciou sobre a Síria que "it is clear that red lines have been crossed and action must be taken to prevent larger-scale use".
Terreno preparado, a Casa Branca solta a famosa frase que vem repetindo intermitentemente em sua richa com o Irã: "All options are on the table."
Em um mundo em que as pessoas tivessem memória, em que se pensasse em vez de acreditar em estórias mal contadas, em que se separasse o joio do trigo e os boatos da realidade, na mesma hora em que se ouvisse Obama falar com a seriedade convincente que o caracteriza (mas que não significa segurança no taco e sim anos de treinamento político) quem viu e ouviu sua fala teria dito "Peraí!"
"Parece que foi isso mesmo que ouvi em 2002 e em janeiro e fevereiro de 2003 até o bombardeio do Iraque no dia 20 de março!"
"Peralá, cara! Antes de bombardear um país soberano cheio de gente dentro e ruínas milenares insusbstituíveis - como fez com as da antiga Mesopotâmia - me mostra aí direitinho vítimas e testemunhas do uso dessas armas químicas para eu acreditar e me explica tintim por tintim o que pretende fazer e quais serão os resultados!"
Mas não.
Embora há meses Obama venha preparando o terreno dizendo à imprensa que "the use of chemical weapons in Syria would be a game changer", a notícia do possível uso de armas químicas foi veiculada pela maioria dos jornalistas sem o sinal de "Aviso: Perigo!"
Aliás, cada vez que Obama repetia e repete esta expressão "game changer" quando se refere aos horrores que estão acontecendo na Síria, me arrepio de indignação com a leviandade frívola da ladainha.
É claro que é melhor ouvir os EUA usarem pelo menos uma palavra que demonstre o que para eles "guerra" significa.
É um game".
Assim banalizam ataques em que pessoas de carne e osso morrem, outras tantas ficam aleijadas, amputadas, traumatizadas, desalojadas, miseráveis humana e materialmente. 
É um game. Um jogo. Um jogo de disparidade astronômica de capacidade dos times e dos jogadores. 
Como se a Seleção de 70 "enfrentasse" um adversário que é lanterninha da Terceira Divisão de um país cujo time nacional nem sonha com um lugar na Copa do Mundo.
A hipocria reina e revolta quem pensa.

Se um jornalista sério for à Síria e perguntar para um agente de Inteligência (sim, eles também têm, e pensam!) se estão usando ou pensam em usar armas químicas, e o agente tiver confiança na integridade do jornalista e estiver à vontade para responder, ele vai dizer o seguinte: "If Syria can cause infinitely worse damage with its MiG bombers (que está usando efetivamente) why would it want to use chemicals?"
E eu acrescento o seguinte, já que tanto Assad quanto seus inimigos têm sido acusados de usar este mesmo tipo de bombas, por que Chuck Hagel não teme os "rebeldes" como teme a ditadura de Assad?
Quem lhe garante que conseguirá controlar estes milhares de pára-militares locais e estrangeiros armados até os dentes de armamento leve e pesado?
Pois vira e mexe Tel Aviv e Washington repetem a mesma lenga lenga infantil: "we fear that the chemical weapons fall into the wrong hands".
Ou seja, nas mãos erradas dos "rebeldes", sobretudo os salafistas, que eles mesmos vêm apoiano junto com os europeus.
É ou não surreal?!

Uma notícia exata é que três crianças sírias foram levadas para um hospital em Trípoli, no norte do Líbano, com queimaduras doloridas no corpo.
Este tipo de ferimento não é estranho a quem cobre guerras sujas ou durty games, se preferir a terminologia gringa.
É o resultado de bomba a Fósforo, proibida pelas leis internacionais e usada bastante por Israel e pelos Estados Unidos de vez em quando.
Isto sim, deveria ser uma preocupação. Que Assad esteja usando esta bomba suja que causa danos na hora e anos após se jogada.
O mesmo tipo de bomba proibida que os Estados Unidos usaram sem vergonha em Fallujah (foto ao lado), no Iraque. Onde, diga-se de passagem, tem havido um número assustador de recém-nascidos com defeitos físicos. Embora as bombas tenham sido jogadas anos atrás.
Portanto, sobre isso Israel e os Estados Unidos nem piam. Quem tem telhado de vidro...
Outro argumento verdadeiro que poderiam usar contra Assad também é a tortura impiedosa praticada nas masmorras de Damasco.
Mas aí também os EUA têm de calar-se e se fazerem de desentendidos. 
Ora, dez anos atrás, em plena aplicação do projeto Rendition, ou seja, em que a CIA sequestrava cidadãos estrangeiros pelo mundo afora para interrogá-los em Guantánamo e em centros de detenções estrangeiros, um destes centros de detenção ficava onde mesmo?
Em Damasco. Onde vários inocentes foram parar para serem horrivelmente torturados. Inclusive um canadense.
De hiprocrisia, basta.
Espero que qualquer que seja o plano arquitetado pela dupla dinâmica Israel-EUA para invadir a Síria, a ONU desta vez não permita o bombardeio de Damasco como cruzou os braços quando os EUA e a GB bombardearam Bagdá com argumentos falsos.
O problema sírio é doméstico. A solução na Síria só pode ser diplomática.
A ONU deveria intervir militarmente é na Palestina a fim de impedir a limpeza étnica que Israel há anos pratica em toda impunidade.
Mas disso ninguém fala. Ninguém cogita, pois o "chief of the free world" vetaria de novo.
Em Israel ninguém tasca.
Mas na Síria, fiquem à vontade.
É a valsa da hipocrisia pragmática.


O célebre cosmologista britânico Stephen Hawking acabou de aderir ao boicote de Israel.
Cancelou sua participação em junho em uma conferência organizada pelo presidente israelense Shimon Peres.
A Universidade de Cambridge onde Hawking é professor primeiro deu a desculpa que era por motivos de saúde, mas o cientista fez questão de precisar que era um boicote contra a ocupação da Palestina.
Há duas semanas foi o escritor escocês Iain Banks que aderiu ao boicote mandando sua editora tirar seus livros das prateleiras de todas as livrarias de Israel.
Antes deles cantores como Elvis Costello, Santana, Steve Wonder, os atores Meg Ryan e Dustin Hoffman e outros já haviam cancelado viagens a Tel Aviv.
Sem contar o líder do Pink Floyd Roger Waters. Que até compôs a música abaixo contra a ocupação e a concentração do milhão e meio de palestinos cercados de muros e arames farpados na Faixa de Gaza, privados de gêneros de primeira necessidade.
LOWKEY

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