domingo, 4 de novembro de 2012

Valsa petroleira de Netanyahu no Sudão e no Líbano


Como disse há algumas semanas no blog do visível e do invisível, notícias divulgadas sem análise ou a partir de comunicados de imprensa partidários, tendem quase sempre a julgamento errado. E este, infelizmente, é raramente corrigido com a mesma ênfase e o mesmo impacto.
Hoje tenho três casos que poderiam servir de base.
O primeiro é na África.
Em blog anterior http://mariangelaberquo.blogspot.fr/2012/01/vox-populi-vox-dei.html, enquanto outros celebravam a liberdade dos sudaneses do Sul, eu levantava conjeturas sobre a velocidade em que Tel Aviv abordara Salva Kiir na capital do novo Estado.
Pois sabia-se que os Estados Unidos e Israel tinham sido os artífices maquiavélicos da divisão e, logo que a República do Sudão do Sul foi efetivada, na mesma rapidez em que a ONU a reconheceu, Binyamin Netanyahu "abraçou" o presidente "eleito" com USdólares em uma oferta suspeita "caridosa".
Salva Kiir foi logo pagar a dívida do Estado que lhe fora presenteado. Correu a Tel Aviv para estreitar os laços entre os dois países e lá foi recebido com honras de estadista de mãos limpas - como Binyamin Betanyahu foi recebido na França por um François Hollande simpatizante sionista - e voltou para casa convencido do papel que seu país "tinha de representar" na região em favor de Israel e dos Estados Unidos.
Embora o papel não fosse explícito, estava implícito que o Sudão do Sul - que nasceu com doenças corrupto- geopolítico-religiosas crônicas, e paralítico - seria o braço armado do compadre sionista. E este, em contrapartida, forneceria ao país recém-nascido potência bélica ilimitada contra o vizinho do Norte. Cuja ameaça era real, mas a se a ONU tivesse alguma potência própria e autoridade, teria resolvido a médio prazo sem guerra. Se não, para que serve?
Os meses passaram, Tel Aviv e Juba estreitaram ainda mais os laços, bases foram sendo criadas,mais tudo o que implica em uma relação de forças desiguais.
Enquanto isso, em Khartun, o presidente Omar al-Bashir (que também não é flor que se cheire nem de longe) foi ficando apreensivo e acabou tomando disposições que julgava necessárias. Foi bater à porta do inimigo que Israel queria combater por intermédio do vizinho de baixo. Ou seja, o Irã.
Pois o que se escondia atrás da caridade israelense era o combate, por vias africanas, do bicho-papão de Teerã.
Como se os próprios problemas dos africanos não bastassem, além dos conflitos intra e inter-nacionais que têm de administrar, a potência bélica do Oriente Médio incluiu mais este na agenda dsses primos inimigos.
Posso estar enganada, mas nem os sudaneses do norte nem do sul querem se meter na briga de Israel com o Irã e nem virar bucha de canhão.
Mas ninguém pediu a opinião das respectivas populações.
Atendendo ao pedido de socorro de Khartun, o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, chegou ao Sudão com dois navios de guerra, um contratorpedeiro, um porta-helicóptero, e disposição de ferro.
Para que toda esta parafernália?
Porque poucos dias antes, Israel bombardeara uma fábrica de armamentos nas proximidades da capital sudanesa deixando Bashir muito irritado e preocupado.
Imagens estadunidenses mostravam cerca de 40 contêiners na fábrica bombardeada. Reduzidos a pedaços.
A "justificativa" de Israel para a operação militar em terra alheia, dada por um oficial da IDF, foi que seu serviço de inteligência havia detectado "ameaça iminente" em Yarmuk.
(Como se Tel Aviv gozasse de uma prerrogativa especial nas Nações Unidas de agir em solo alheio como e quando lhe aprouvesse. Como na Palestina.)
Não é que alguém tenha pedido contas a Binyamin Netanyahu ou a Ehud Barak, mas um general da reserva "explicou" que o ataque aéreo da IDF talvez tivesse visado destruir "uma nova categoria de armas" que seriam contrabandeadas para a Faixa de Gaza.
Aí dá para ficar boquiaberto.
Primeiro, "nova categoria de armas" inventada em um país do terceiro mundo... difícil de acreditar que o Sudão possua teconologia superior à de Israel e dos EUA que investem bilhões em segurança em detrimento de bens públicos necessários.
Segundo, de Khartun a Gaza, a rota é longa e complicada. A entrada então, nem se fala! com o bloqueio que não deixa passar nem gêneros de primeira necessidade.
Mas desculpas não faltam.
O fato é que com Muammar Ghadaffi aniquilado, essa região toda que ele controlava e cultivava com fundos de investimento, corrupção e punho de aço, ficou à mercê de quem pagar mais e falar mais grosso e alto.
O Hamas e o Hezbollah (o qual a União Europeia não quis rotular de Organização Terrorista, apesar das pressões gringas) parecem ser mesmo é desculpa esfarrapada na contenda de Israel com o Irã e na corrida israelense pela hegemonia na reião e além de lá.
O Hamas está mais preocupado em contrabandear água para os gazauís que arma. Questão de prioridade.
E o Hezbollah, bem, o Hezbollah, está entre a cruz e a espada. Sobreviver e/ou defender Bashar el-Assad.
Mas o que é que tem no Sudão que interessa tanto Israel e os EUA?
O ouro negro que provoca cobiça e guerras nos países fracos.
A "revolução" da Líbia foi fomentada de fora para a derrubada de Gaddaffi e o campo ficar livre para Israel, os EUA e os 1% de abastados que dominam o planeta se esbaldarem com o petróleo e com o campo virgem para aplicarem seu capitalismo selvagem.
A Líbia ficou como se esperava - uma hostil colcha de retalhos tribais sob um guarda-chuva de carteis internacionais que estão tirando dos líbios seu patrimônio natural.
No Sudão do Sul, tem muita coisa para explorar e pouca gente instruída para defender os interesses reais da nação recém-criada.
A geopolítica é complicada.
Sobretudo com uma Organização das Nações Unidas tão fraca.
Se a ONU tivesse voz ativa, interviria no Sudão antes que fosse tarde. E na Síria, implementaria o plano de paz de Kofi Annan, que era o mais sábio http://mariangelaberquo.blogspot.fr/2012/08/o-visivel-e-o-invisivel-no-oriente-medio.
Se Barack Obama tivesse sido derrotado (apesar da ajuda providencial do furacão "Sandy"), com Mitt Romney nas rédeas dos EUA, nem o futuro de Bashar el-Assad, nem dos sírios, nem dos sudaneses, nem de Israel (que o Republicano pensa ajudar dando carta branca à dupla Binyamin Netanyahu & Ehud Barak), nem do mundo, estaria assegurado. Dos estadunidenses então, nem se fala.
Com as leis anti-terroristas aprovadas nos EUA nos últimos dez anos, inclusive por Obama, o país virou o maior perigo do planeta, se cair nas mãos de um presidente inescrupuloso. Veremos isso outro dia.
Concluo esta nota com meu leitmotiv de sempre: guerra nunca resolveu e nunca resolverá nada.
  
O segundo leão invisível está no recente atentado em Beirute, que matou o chefe de segurança libanês Wissam al-Assan e mais duas pessoas.
Os oponentes a Bashar el-Assad logo o culparam pelo atentado.
Eu preferi ficar calada porque não encontrei nenhuma prova que isso fosse verdade.
A experiência me ensinou que 99% dos atentados não reivindicados (e às vezes até os 1% que são, mas por grupos marginais) são fabricados para prejudicar a parte acusada.
Os serviços de inteligência das potências hegemônicas passam mais tempo arquitetando e cometendo delitos para incriminar seus antagonistas do que protegendo seus compatriotas.
No caso do recente atentado do Líbano, embora a hipótese de Bashar el-Assad não poder ser totalmente descartada, é difícil acreditar que com todos os problemas que tem e com a decrepitude do aparelhamento de Estado, o presidente da Síria tivesse cabeça, energia e fundos para levar a cabo um projeto no exterior tão bem arquitetado.
O serviço de inteligência da Síria está tão esfacelado que nem conseguiu localizar e prender seu próprio primeiro-ministro dissidente que ficou por lá tranquilo após sua defecção do regime.
Como então Bashar teria conseguido organizar em sigilo e realizar um atentado que exigiu planejamento minucioso e segurança de informação sem falha?
Assad não ganha nada com a desestabilização do Líbano no contexto atual. Sem contar que está longe de ser o único interessado na desestabilização do sistema de segurança do Líbano - Aliás, o presidente da Síria tem mais a perder do que ganhar.
Outros grupos são igualmente ou mais questionáveis.
Sem querer bater na mesma tecla, a potência regional mais interessada na morte de Wassim al-Hassan é Israel. Pois ele presidia também o departamento libanês responsável pela detecção de espiões israelenses no Líbano.
Conhecendo o modus faciendi do Mossad - serviço secreto israelense- sua participação não pode nem deve ser descartada.
É bem possível que este atentado fatal tenha tido como principal motivo calar Wassin e criar caos e ativar conflitos sectários que dormiam sossegados.
E "por coincidência", o atentado aconteceu perto do escritório falangista.
A Falange libanesa é o partido que fez o trabalho sujo de Israel em Sabra e Shatila em 1982, quando centenas de palestinos foram exterminados em poucas horas enquanto os soldados da IDF montavam guarda do lado de fora dos campos de refugiados, impedindo que os moradores escapassem -
Foi o assassinato de Bashir Gemayel, então recém-eleito presidente do Libano, que foi usado como detonador do horrendo ato vingativo.
Na época, o assassinato de Gemayel foi conveniente e rapidamente posto nas costas da OLP (Organização de Libertação da Palestina) - então sediada em Beirute - e/ou nas de seus aliados.
Mil pretextos foram encontrados - como hoje contra Bashar el-Assad - para incriminar Yasser Arafat e induzir os jovens falangistas a aceitarem a hospitalidade israelense para formá-los para o futuro massacre. Que ficaria nos anais dos atos mais bárbaros do século XX.
Na época, pouquíssimos jornalistas ousaram contradizer a versão oficializada.
Um número menor ainda de analistas ousaram lembrar que pouco antes de ser assassinado, Gemayel não era mais protegido de israel. Já caíra em desgraça. Tel Aviv o apoiara esperando que quando eleito se comportasse como vassalo, o que não foi o caso. E como o primeiro ministro de então, o general Menahem Begin, não era de engolir sapo...
As batalhas armadas, incêndios, pilhagens, mortes e banditismo de um punhado de marginais que sucederam a morte de Wissam al-Hassan, embora tenham sido graves, felizmente não foram da proporção de Sabra e Shatila, é claro.
Mas não deixam de ser lamentáveis.
Desde que exerço o meu ofício jornalístico, ou seja, desde o início da década de 80, o Líbano tem sido palco de tentativas graves e repetidas de impedir sua existência em tanto que Estado pleno, uno e estável.
Desde antes, na verdade.
Mas nos últimos trinta anos o Líbano tem sido sido vítima de Tel Aviv em várias frentes. Invasões, ocupações, bombardeios, interferência em abastecimento de água, e outros projetos perversos que assegurem que a antiga Fenícia só consiga existir como um Estado aleijado.
Quer queira quer não, para ver o invisível no Oriente Médio, tem de olhar, ver e analisar os interesses de Israel em cada acontecimento mediático e em cada ato subreptício que o favorize a curto prazo e que prejudique seus adversários.
Se Tel Aviv levar alguma vantagem, ou achar que leva alguma vantagem imediata em algum desastre, infelizmente, antes de "jogar pedra na Geny", tem de perscrutar o que Israel ganha com o desenlace.
Isto não é paranóia. É fato.
É a geopolítica no que ela tem de mais execrável.
Concluindo, não se há de esquecer que dentro do ato terrorista reprovável, tem uma tragédia humana explícita lamentável. Em Beirute, ela estava presente no funeral que seguiu o crime. No sofrimento dos familiares das vítimas indiretas dos interesses inescrutáveis que os abalaram.
Ninguém merece isso.
 O Terceiro leão invisível de hoje é em resposta a uma pergunta que não param de me fazer por email (falando nisso, desculpem os que ainda não foram respondidos nestas páginas).
Andam querendo saber porquê o lobby israelense nos EUA está enchendo Mitt Romney de dinheiro sendo que Barack Obama sempre fez as vontades de Binyamin Netanyahu na Palestina.
A resposta é em dois atos.
Primeiro ato, embora Obama continue obstaculando o trabalho da ONU para que aja concretamente contra a ocupação da Cisjordânia e o bloqueio da Faixa de Gaza, não é segredo para ninguém que ele não quer ver o primeiro ministro de Israel nem pintado. E sua coalição de extrema-direita arrepia os cabelos de muitos Democratas.
Para completar esta aversão incurável, tanto o presidente quanto seu vice-presidente Joe Biden, são claramente contrários às invasões judias na Cisjordânia e à ocupação militar, apesar de não tomarem nenhuma medida concreta contrária.
No segundo ato, o ouro negro entra em pauta.
Em 2010, prospectores encontraram petróleo na região delimitada no mapa acima.
Sem entrar em detalhes técnicos, a bacia petrolífera descoberta é considerada tão rica quanto a do golfo e pertence geograficamente a Israel, à Palestina, a Ciprus e ao Líbano.
Entretanto, Israel logo batizou a bacia de Leviathan, o monstro marinho evocado no Antigo Testamento, e apossou-se dela em toda a sua extensão, como é de seu feitio.
O Líbano recorreu à ONU, com provas cabais de propriedade de parte da área traçada, mas Israel não abriu mão da piratagem marítima.
Avigdor Lieberman, seu ministro do exterior fascista, disse com seu sarcasmo habitual We won't 'give' an inch.  
Em 1982, a ONU estabeleceu uma convenção que legifera sobre os oceanos e os mares do planeta Terra, justamente para resolver questões litigiosas que possam gerar conflitos inúteis.   
Porém, Israel, como os Estados Unidos, nunca ratificou o Tratado e por isso se dá ao direito de infringir mais uma lei internacional como se a ONU e os Tribunais Internacionais fossem só para os demais, quando não legifera em seu benefício.
Só que dessa vez ele estava mexendo com gente tão forte quanto ele.
Tem libanês rico demais espalhado pelo planeta e com influência em Washington... e no final das contas, Barack Obama tomou o partido do Líbano contra Israel, nesta questão petroleira.
Daí a aversão súbita do governo israelense de extrema-direita ao atual presidente dos Estados Unidos e seu interesse exclusivo na eleição do candidato republicano. Mitt Romney prometeu a Israel apoiar tudo o que quisesse (quiser?) fazer no mundo. 
De prosseguir sua limpeza étnica na Palestina, a bombardear o Irã, a roubar o petróleo do Líbano, a sabe-se lá até onde vai a sede de poder e de expansão desses sionistas vorazes.
Se o governo israelense atual pensasse a médio e longo prazo, aproveitaria esta oportunidade providencial para compartilhar o petróleo com os vizinhos que têm direito ao ouro negro. Assim daria um primeiro passo para a colaboração inter-nacional em vez de atolar seus compatriotas em um conflito perpétuo com os países que os cercam e que só querem viver livres, bem e em paz.
  
Lembrando Sabra e Shatila: 30 anos
Al Jazeera: Sabra & Shatila massacre of Palestinians - 
Eyewitness Robert Fisk & Odd Karsten Tveit 
Trailer do filme israelense, de Ariel Folman: Waltz with Bashir
O filme de Folman relata a ocupação do Líbano e o massacre de Sabra e Shatila com uma perspectiva própria, pragmática. Não é preciso com a História. Como por exemplo, o massacre não durou apenas uma noite. Começou ao anoitecer do dia 16 de setembro e só terminou ao amanhecer do dia 18.
A psicóloga israelense Ronit Shpiner, analisou o filme da seguinte maneira.
"The Israeli soldiers are shown as being good, as being people who are tormented by what is going on. Ultimately, the moral responsibility is taken off of them even though those who saw the slaughter should have stopped it. The movie depicts the soldiers as the victims of the massacre because they were traumatised by it."
Concluindo, embora o Serviço Militar em Israel seja obrigatório, há muitos objetores de consciência. Muitos jovens se recusam a fazer o trabalho sujo da IDF nos territórios ocupados e fora.   A vítima real não é o opressor, que tem escolha, e sim o oprimido, que é presa fácil da engrenagem militar de quem o invade.    Ariel Sharon era o chefe da IDF na época e co-responsável pelo massacre, embora no filme o general só seja mostrado de passagem.            Tenho reservas quanto ao conteúdo, mas acho o filme de Ariel Folman forte e de boa qualidade. E é inegável que, à sua maneira, tentou "Break the silence" para redimir-se de atos obscuros que não consegue exorcizar nem nesta obra de arte.
Global BdS Movement: http://www.bdsmovement.net/



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