domingo, 27 de outubro de 2013

Dilma & Merkel vs NSA USA



A revolta dos chefes de Estado ocidentais contra a espionagem celular e informática dos Estados Unidos não vai terminar em pizza como Washington queria e apostava.
Na imprensa internacional, tudo começou com o artigo de Glenn Greenwald, jornalista estadunidense residente no Rio de Janeiro, no jornal londoniano The Guardian. Glenn era um simples mensageiro do whitleblower estadunidense Edward Snowden.
Nas capitais mundiais que contam, tudo começou em Brasília com a nossa presidente/a Dilma.
Primeiro, Dilma revoltou-se nos bastidores, usando a/de diplomacia.
Porém, o diretor da NSA (a superpotente National Security Agency USA) lançou um comunicado de imprensa no dia 8 de setembro dando uma de Joãozinho sem braço que era um insulto à inteligência tupiniquim. "The United States," contra-informou, "collects foreign intelligence - just as many other governments do - to enhance the security of our citizens and protect our interests and those of our allies around the world."
Nem se deu ao trabalho de explicar porquê espionavam a Petrobrás e em quê a nossa petroleira constituía uma ameaça à segurança dos EUA.
Nem se deu ao trabalho de oferecer desculpas formais, mea culpa mea culpa etcétera e tal. Aí não deixou espaço para o Brasil receber a bofetada e voltar a dar a outra face.  Somos cristãos, mas bobos, não.
Não sendo atendida, nossa presidenta foi ao palco das Nações Unidas.
O discurso da Dilma foi um dos pontos fortes da última sessão que reuniu os maiores e menores 194 chefes de Estado em Nova York, junto com o de Rohani, presidente do Irã, e Abu Mazem, presidente da Palestina.

Quando a presidente do Brasil botou a boca no trombone e deu ao mundo inteiro a notícia do cancelamento de sua visita a Washington (esperada ansiosamente por um bando de empresários gringos querendo fazer negócio à sua vantagem) alguns jornais estadunidenses ousaram fazer pouco caso, parafraseando o dito popular "quem não deve não teme" citando como reação séria a da Europa, que sofreu o mesmo estupro de privacidade calada.
Acho que a Dilma naquele dia com seu pronunciamento na ONU  lavou a alma se não de todos, da maioria absoluta dos brasileiros. E de centenas de milhões de estrangeiros.
Eu, que acho a nossa presidente bastante competente (bem acima da média internacional inclusive do nosso vizinho norte-americano superpotente), aplaudi de pé e pensei: se fosse o Fernando Henrique teria engolido mais este sap, teria dito (em inglês para exibir erudição em vez de prestigiar a lingua pátria) algumas banalidades e no final teria quase se desculpado por ter sido espionado.

A Dilma (que alguns compatriotas míopes ou mal-intencionados chamam de mandona e outros adjetivos misóginos depreciativos que não usariam se ela fosse homem - se fosse, diriam que dá firmeza porque tem pulso forte) indignou-se com  a afronta ilegalíssima e perigosa para a nossa Pátria Amada Salve Salve, deu um chapéu no Obama que estava fazendo careta ameaçadoras em vez de tocar a bola no campo da lealdade e marcou um gol de placa. Quando marcou o gol diplomático, Dilma suscitou surpresa e admiração nas capitais europeias, até na Rússia, o Brasil subiu, no mínimo, mais um degrau na escada de influência diplomática internacional e passou vergonha nos demais presidentes e primeiros ministros que ficaram de braços cruzados.
Ora em julho deste ano Obama ao ser interpelado deixara claro que espionava seus aliados europeus "If that weren't the case, then there'd be no use for an intelligence service". Deixando margem à interpretação que os Estados Unidos não confia em ninguém e não considera nenhum país amigo. Ou melhor, ou pior, declarou publicamente o que todos sabem, que, tirando Israel, os Estados Unidos não são amigos permanentes de ninguém e que com eles, conduzir diplomacia na base de confiança é ingenuidade infantil da parte do outro lado.
Esta posição grave constitui um golpe fatal nas relações diplomáticas internacionais e certamente inaugura uma nova era de reestruturação de cadeias e aliados.

A Europa ficou estática. No fundo, ninguém se importou dos EUA estarem espionando o Brasil ou qualquer outro telefone que não fosse o próprio.
Solidariedade internacional? Respeito mútuo? Zero.
Os Primeiros Ministros da França e da Inglaterra estavam na lista dos espionados, mas ficaram de braços cruzados tremendo de medo do Big Brother - este, o real, do escritor inglês George Orwell e seu visionário 1984, que, diga-se de passagem, deveria ser obrigatório nas escolas.
Demorou a cair a ficha que eles também estavam sendo espionados e que também tinham direito à privacidade.
A Alemanha demorou mais do que o Brasil a descobrir os fios invisíveis da espionagem, mas acabou descobrindo e reagindo. Aí se aliou ao Planalto na batalha pela privacidade, e pela proteção de dados confidenciais nacionais do governo, das empresas e dos cidadãos em geral.

Angela Merkel ficou na dela até descobrir que ela também fora visada pessoalmente. Seus celulares e emails, assim como os de dezenas de alemães com segredos nacionais e outros milhares com vida privada que têm o direito de manter privada. Foi só então que ficou chateada. E as conversas dela são ouvidas desde 2002, segundo o Der Spiegel.
A chanceler alemã também tentou as vias diplomáticas. Quando não dava mais para segurar a irritação e o sentimento de impotência pela impossibilidade real de gozar de meios de comunicação móvel e webiano fiáveis, resolveu pegar o telefone fixo e falar com seus vizinhos para convencê-los a uma ação europeia.
Convenceu a duras penas o primeiro ministro francês François Hollande a fazer uma declaração conjunta, e depois até James Cameron foi pressionado pela opinião pública britânica para que também reagisse. 
Mas Angela Merkel entendeu logo que os homens que a cercavam na Europa eram meio fracos e que tinha mesmo de aliar-se era a outra mulher do outro lado do Atlântico, se quisesse obter resultados.
Aí começou a dupla dinâmina Dilma/Merkel. E a brincadeira entre os jornalistas internacionais virou "coitado do Obama!" "Obama que se cuide porque essas duas são poderosas!" com o maior respeito do mundo.

Angela Merkel é filha de teólogo e formou-se em Física na Universidade Karl Marx, de Leipzig, na antiga Alemanha Oriental. Seu dossiê na Stasi (polícia comunista de repressão da época) a descreve como hostil ao regime autoritário e simpatizante do sindicato polonês Solidarność. Recusou o "convite" de ser dedo-duro e foi coerente com suas ideias custasse o que custasse. Como a Dilma, do outro lado.
As duas têm o mesmo perfil, fortes, competentes e determinadas.
As duas são hoje, junto com Vladimir Putin, os três chefes de Estado mais potentes do mundo. 
Barack Obama não conta porque seu poder é inerente ao cargo de presidente dos Estados Unidos. É e será ainda por algum tempo. Não por causa do país propriamente dito, decadente e falido, e sim por causa das fortunas privadas, das corporations, do controle cibernético - Google, Yahoo, Facebook, Twitter, Apple e outros fornecedores de informação para a NSA espionar seus próprios cidadãos e os cidadãos estrangeiros.
Pois o mais rentável mesmo é a espionagem industrial que os EUA fazem através dos mesmos veículos que usam para espionar nossos governantes e nós mesmos.

A Chanceler alemã queria um tratato europeu de não-espionagem e a Presidenta do Brasil queria uma Resolução formal das Nações Unidas.
As duas chefes de Estado se uniram e acabaram liderando um movimento Europa-América Latina contra a piratagem de informação público-administrativa e privada desenvolvida e praticada pelos Estados Unidos.
O que começou como um "rompante" da Dilma em Nova York em setembro virou um movimento internacional amplo e de peso que ela lidera de Brasília.
O Brasil e a Alemanha redigiram uma proposta conjunta de Resolução que será apresentada à Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas nesta sexta-feira e deverá ser votada o mais tardar no fim de novembro deste ano.
O objetivo de Dilma e Merkel é atualizar a Convenção Internacional de Direitos Civis e Políticos que foi estabelecia em 1976, antes da existência da Internet.
O Brasil e a Alemanha querem acrescentar, entre outras linhas, a que diz que "no one shall be subjected to arbitrary or unlawful interference with his privacy, family, home or correspondence, nor to unlawful attacks on his honor and reputation" extensivo ao espaço cibernético.

Embora o governo estadunidense insista no discurso da necessidade de sua espionagem na luta anti-terrorista, para proteger-se e proteger seus "aliados", seus atos provam o contrário.
Os documentos revelados por Edward Sowden mostram claramente que espionam os outros países em conferências que visam acordos econômicos, a OEA (Organização dos Estados Americanos), a Petrobras e outras petroleiras, ministros e ministérios encarregados de  recursos em minas e energia, e os líderes democraticamente eleitos nos países ocidentais aliados dos Estados Unidos e milhões de pessoas nestes Estados.
Inclusive o nosso.
No final da contas, por mais que o Presidente dos Estados Unidos minta de cara lavada para seus pseudo-aliados e para o mundo todo, desde Julian Assange, Bradley Manning e Edward Snowden surgiram no cenário internacional, suas falcatruas de espionagem político-econômico-social têm os dias contados e não poderão mais ser usadas como arma para levar vantagem.
(A quem quiser detalhes sobre reuniões espionadas aconselho a leitura do artigo The End of Hypocrisy, de Henry Farrel e Martha Finnemore, publicado pela revista Foreign Affairs deste mês.)
Concluindo, vale lembrar que nesta trama toda da hipocrisia em que os EUA levam sempre a melhor, a NSA espiona metadata e ciberneticamente, diretamente, a CIA mexe os pauzinhos derrubando governos, semeando discórdia, rebeldia interna, que desestabilizem a economia e os dirigentes dos países com os quais discordam ou que queiram controlar em benefício próprio.
Aliás, a NSA é a maior fornecedora de informação para Israel. Fizeram até um documento top secret revelado por Snowden. Todos os dados recolhidos pela NSA são transmitidos a Tel Aviv. Inclusive os dados do governo, das indústrias e dos cidadãos brasileiros. É por isso que os dois países são adiantados tecnologicamente e ganham tantos contratos. Não é porque são mais inteligentes do que os demais, é porque aplicam a Lei do Gérson ao máximo, em toda ilegalidade.
Esses serviços de inteligência predadores influenciam também as redes sociais em que a juventude está ligada o tempo todo engolindo fofoca como se fosse informação confirmada. É a arma mais eficaz.
A Dilma deveria era ter dado asilo para Snowden para o Brasil desfrutar de seus conhecimentos em todas as áreas. É assim que os Estados Unidos fazem. Cooptação de cérebros é um grande passo para o desenvolvimento porque já chegam formados e prontos para serem "usados". Putin, o homem mais poderoso do mundo, entendeu direitinho a jogada.




PS1: ISRAEL vs PALESTINA
Neste domingo 27 de outubro de 2013, a Fundação Ahmed Kathrada lançou uma campanha internacional para a libertação de Marwan Barghuti, o líder do Fatah que está preso em Israel desde 2002, e de todos os prisioneiros políticos palestinos.
Esta Fundação é a mesma que lançou a campanha internacional em 1963 para a libertação de Nelson Mandela detido pelo regime sul-africano do apartheid.
Mandela e Barghouti, dois intelectuais que seguiram o mesmo percurso  de resistência contra opressores ganaciosos e violentos. 
Mandela lutou contra o apartheid do regime dos afrikaaners na África do Sul, onde os nativos negros eram tratados como cidadãos de última classe.
Barghouti lutou contra a ocupação israelense violenta que desde 1948 maltrata, humilha e rouba terra palestina delimitada pela ONU.
A esposa de Marwan, Fadwa, advogada de Direitos Humanos na Cisjordânia, viajou para Robben Island (onde Mandela foi preso durante 18 anos) com Issa Qaraqe, ministro palestino dos prisioneiros políticos, e cinco nobelizados da Paz a fim de marcar o evento.
Marwan foi o primeiro membro do Congresso palestino a ser detido por Israel e o mais eminente dos 5.000 palestinos encarcerados pelos ocupantes.  Dentre eles, 236 meninos, 14 mulheres e 14 parlamentares.
A União Europeia e o Parlamento Europeu aderiram ao movimento e também soilicitam sua libertação com urgência. 
Marwan Barghuti é a figura chave da reconciliação entre o Fatah e o Hamas e o único considerado por todos os palestinos com autoridade para negociar uma paz justa e definitiva.
Sua libertação é crucial para o fim do conflito.
Junto minha voz à de Fadwa, dos nobelizados e dos demais seres humanos que apoiam esta causa.

PS2. O Pink Floyd Roger Waters deu uma entrevista ao jornal israelense Yediot Ahronot que, naturalemente, distorceu suas palavras. 
Para corrigir o "erro", Roger publicou em seu Facebook uma carta aberta para esclarecer os fatos. 
Publicou também a transcrição completa da conversa que teve com o jornalista Alon Hadar.
E lembrou a carta aberta que enviou aos colegas roqueiros na qual explica o porquê de seu ativismo no BDS - Movimento Internacional de Boicote a Israel e os convida a fazerem o mesmo.
Eis um extrato do que disse Roger Waters.
"The fact is that there are different rules of law for Arabs and Jews. Completely different. In the occupied territories, Jews are governed under a civil law and have completely different rules in terms of their movement and so on and so forth … and the occupied people, the Palestinians, are under martial law. And it’s a completely different set of laws. They also have completely different sets of documents.
It’s just like the old pass laws in South Africa. It is apartheid. Clear and simple. If you go and look at the definition of what the crime of apartheid is, then it describes perfectly what’s going on in the West Bank. And not quite so perfectly, but also, Gaza, which is under siege, it’s completely surrounded. They have no freedom. When one race or ethnic group subjugates another race or ethnic group, to its power and control, that is the crime of apartheid."



Documentário de Scott Nobel: Counter Intelligence The Company (1h18')


Documentário australiano da Journeyman: In Google we Trust (trailer de 4')


domingo, 20 de outubro de 2013

Israel vs Palestina: História de um conflito XLII (05-2004)



O dia 02 de maio de 2004 caiu em um domingo. No Brasil o domingo é dia de oração, de descanso, de churrasco. No Oriente Médio este do dia dois foi como tantos outros domingos, repleto de bombas e acontecimentos.
Ariel Sharon apresentou seu plano de retirada civil da Faixa de Gaza ao seu partido Likud, e o plano foi rejeitado por 59% dos membros (nos dias seguintes, pesquisas mostrariam que dois terços dos israelenses eram favoráveis à evacuação dos colonos da Faixa de Gaza).
A prova da impossibilidade física de manter as colônias chegou no mesmo dia, quando militantes do Jihad Islâmico mataram a família Hatuel - mãe e quatro filhos - perto da colônia de Gush Katif.
Um ato bárbaro injustificável. Porém, ao ver do Jihad, explicável.

Gush Katif era um bloco de 17 colônias de judeus ortodoxos sionistas no sudoeste da Faixa de Gaza. Foi instalada nesse local - entre Rafah ao sudeste, Khan Yunis ao leste, Deir el-Balah ao nordeste, e ao oeste e noroeste o Mar Mediterrâneo e todo o litoral - por estratégia de ocupação.
Era um enclave israelense paradisíaco no litoral da Faixa. Bem protegida dos nativos e servida por duas estradas especiais reservadas ao uso exclusivo dos colonos que viviam na Faixa como se fossem eles os donos das terras e os palestinos fossem as que a usurpavam.
Os gazauís não podiam aproximar-se das colônias (tinham de manter distância "de segurança" grande demais para o tamanho da Faixa) e não podiam usar as estradas nem em caso de emergência. As estradas, como as demais que serviam exclusivamente as 21 colônias israelenses na Faixa, eram patrulhadas noite e dia por soldados da IDF.
A estrada 230 - que subia ao longo do litoral a partir da fronteira com o Egito até a última colônia israelense no norte da Faixa - e a 240 - também paralela ao mar, mas a um quilômetro do litoral, tinham o mesmo propósito de os colonos circularem entre uma e outra colônia sem jamais cruzar nem ver a cara de nenhum gazauí no caminho.
Estas estradas, assim como a perpendicular construída para os colonos cortarem caminho, eram poupadas nos bombardeios e eram novinhas em folha. As estradas dos palestinos eram constantemente danificadas.
Os gazauís, como os cisjordanianos, sentiam-se sufocados em seu território exíguo, em que mais da metade era confiscada para uso israelense - civil e militar.
Desde o início da Intifada al-Aqsa que Gush Katif era a colônia mais visada militarmente pela resistência. Ataques pontuais de foguetes e nas estradas.
Ariel Sharon já fora informado pela IDF da impossibilidade de proteger noite e dia os 8.600 colonos que ocupavam 45% das melhores terras de um espaço pequeno em que nos 55% restantes 1 milhão e 400 mil refugiados e nativos se amontoavam. 
As colônias tinham de ser desmanteladas por uma questão tática.
Mas por enquanto, Sharon "tinha de" revidar o golpe sofrido na Faixa de Gaza.
Decidiu começar a vingança da morte da família Hatuel no mesmo dia, na Cisjordânia.
Quem matara os colonos era um membro do Jihad, mas o míssil da IDF foi atirado no carro de quatro resistentes nabluenses das Brigadas al-Aqsa. Feriu o dobro de pessoas que se encontravam nas proximidades, mas a operação foi considerada bem sucedida. 
Dois dias depois, enquanto montavam uma operação mais ampla, improvisaram uma investida no campo de refugiados de Khan Yunis na Faixa. Mataram duas pessoas, deixaram 22 feridas e demoliram 30 casas.
Nesse ínterim, os hebronitas sofriam com mais uma batida da IDF na cidade.  Nesta os soldados prenderam cerca de vinte pessoas.
No dia 10, os soldados da IDF mataram mais dois palestinos e demoliram mais 30 casas no sul da Faixa de Gaza.
No dia seguinte, a IDF teve outra prova que nem as Forças de ocupação israelense conseguiriam manter-se ilesas na Faixa.  Sofreu baixa em Rafah. Em uma operação conjunta do Jihad e das Brigadas al-Aqsa, do Fatah. Bombardearam um posto militar e seis soldados pereceram no ataque.
No dia 12 o Jihad atacou um veículo militar matando mais cinco soldados. Levaram os corpos, pois sabiam que poderiam trocá-los por palestinos que se encontravam em Israel presos.
No total, em menos de uma semana, a IDF sofreu a perda de 13 soldados nos diversos ataques. A maior baixa desde o começo da segunda Intifada.

A resposta de Ariel Sharon não se fez esperar.
Mobilizou 100 tanques, veículos armados e milhares de soldados para levar a cabo a Operação Arco-íris (מבצע קשת בענן). Nome idílico mas que indicava a amplitude da manobra que mobilizou aviões, helicópteros, cruéis (como os veículos militares israelenses são chamados "carinhosamente" pelos soldados) e caterpillars armados.
A partir da sexta-feira e durante nove dias, os Apaches sobrevoaram a Faixa atirando mísseis esporádicos em alvos mais ou menos determinados.
A operação lembrava a Defensive Shield de 2002 na Cisjordânia, quando Jenin e Nablus foram arrasadas.
Primeiro a IDF isolou Rafah do resto da Faixa, impôs toque de recolher, estado de sítio, privou a população de energia e água. Como sempre faz cada vez que ataca uma cidade.
A população ficaria isolada e sob fogo cerrado durante nove dias. 
Como em Jenin e Nablus, em vez de visar os resistentes que haviam infligido à IDF a perda militar, Ariel Sharon autorizou o ataque de Rafah sem nenhuma preocupação em poupar mulheres, idosos e crianças.
Só no primeiro dia mataram doze pessoas e feriram dezenas.
Yasser Arafat pediu intervenção internacional para aplacar a ira do Primeiro Ministro General, mas em vez de ajuda os gazauís receberam chumbo e mais onze perderam a vida.
Em vez de calar as armas de Ariel Sharon, Collin Powell encontrou Ahmed Qorei para insistir para que ele usasse a oportunidade do plano israelense de desengajamento civil da Faixa para segurar a resistência armada do Fatah e do Hamas.
Era surreal, para não dizer indecente. A Faixa de Gaza sendo martelada de mísseis, moradias sendo demolidas como se não fossem lares de famílias, vidas sendo exterminadas, e o Secretary of State dos Estados Unidos ousava, na mesma hora, forçar o Primeiro Ministro palestino a calar as armas da resistência e sofrer a ocupação passivamente.
Em Rafah, os Apaches e os caterpillars não paravam. Era uma orgia de demolições de residências e a IDF não economizava nem mísseis nem balas.
No domingo, após curta trégua nos ataques e nas demolições, os caterpillars voltaram a esmagar filas inteiras de moradias no bairro mais pobre de Rafah.
No mesmo dia a Corte Suprema de Israel rejeitou a petição de proibição das demolições que há meses os habitantes de Rafah lhes haviam enviado.

Na quarta-feira, os moradores de Rafah saíram às ruas em uma marcha pacífica de protesto e foram recebidos com uma chuva de bala. Dez pessoas morreram na hora e os feridos eram carregados para todo lado.
No dia seguinte, dia 20 de maio, Rafah continuava em estado de sítio, com toque de recolher, sob fogo de tanques e helicópteros, com dificuldade para tratar dos inúmeros feridos e impossibilitada de enterrar os mortos que se acumulavam.
Israel respondia às reprimendas internacionais com o argumento que estava bombardeando os túneis cavados entre a Faixa e o Egito para contrabandear gêneros de todo tipo, inclusive de primeira necessidade.
Entretanto, o argumento de visar os túneis era absurdo. O bairro mais visado nos três primeiros dias foi o Tel es-Sultan, longe da fronteira e de onde não sai nenhum túnel. Só depois é que os mísseis e os veículos armados visaram o Brazil (pois é, tem um bairro em Rafah que homenageia nossa pátria). A caminho do bairro, destruíram o Jardim Zoológico da cidade. Por que será? 
Nos dias 22 e 23 uma Reunião de Cúpula dos países árabes não deu em nada.
No dia 25, depois de arrasar com o Brazil e outros setores do campo de refugiados, a IDF começou a retirada das tropas de Rafah terminando a Operação Rainbow em câmara lenta.
Mas mataria gente até o dia 30. Neste dia, em Gaza, matou Wa'iI Nassarin, chefe das Brigadas al-Qassan, junto com Muhammad Sarsur, outro membro do Hamas.

A Operação Arco-íris terminaria oficialmente no dia 01 de junho. Até o dia 29 a IDF matou gente na Faixa. E também na Cisjordânia.
Segundo a UNRWA (Serviço da ONU para Refugiados), nos nove dias de ataque a IDF destruiu totalmente 155 imóveis e demoliu centenas de casas deixando 1.960 pessoas desabrigadas.
Segundo fontes locais, 62 pessoas foram mortas. Um terço de menos de 18 anos. Duzentos feridos graves foram atendidos nos postos médicos. 220 casas nos bairros de Brazil, Salam e Sultan foram pulverizadas ou derrubadas ao ponto de ficarem inabitáveis. 641 famílias, cerca de 4000 pessoas, ficaram desabrigadas. Cerca de 700 lavouras foram destroçadas assim como 48 lojas, 56 imóveis , uma mesquita e cemitérios.

Apesar dos escombros aos quais Rafah foi transformada, o Ministro da Defesa de Israel Shaul Mofaz justificou-se culpando o Hamas pelo desastre. "Innocent people were hurt because the terrorists chose to operate in a dense population center."
Pronto. A culpa é do ocupado que luta para defender seu território e não do ocupante que mata mulheres e crianças dentro de casa.
A Operação Rainbow foi um horror bastante celebrado no governo israelense. Causaram os estragos desejados e da ONU tinha quem cuidasse. Da opinião pública internacional também, pois aos olhos da grande mídia quem era mesmo o culpado? O Hamas, é claro. 
No fim do mês de maio Israel enterrara 19 mortos.
Os palestinos 112, e rezavam pela sobrevivência de muitos feridos graves.

Documentário Journeymand: The Heartland of Hamas


Documentário sobre a colônia Gush Katif antes da evacuação

Reservistas da IDF, forças israelenses de ocupação,
Shovrim Shtika - Breaking the Silence 
Can any combatant shoot?
Yes, from his personal weapon... And if by mistake I hit him in the back or kill him, and that happened to us… two-three times just in the last service term.
Soldiers killed kids.
Killed kids by mistake. Aimed at the legs, shot them in the back and killed them.
How do you know afterwards if they killed them?
Reports from the DCO (District Coordination Office), the Palestinians report, there is cooperation in that sense. So kids get killed.
Is there a trial? Any serious inquiry about this thing?
No. I’m sure it doesn't go beyond the battalion commander...
...Someone comes to the alert squad and says: “Let's go guys, there's a ‘disturbance procedure’”.  “Why, what happened?”  “There's an attempt to transfer weapons in Balata”. What do we do? We go around Balata and we can use the crowd dispersal equipment, two stun grenades…
Is there any restriction on using this equipment?
There’s no restriction on anything.  You can have four stun grenades on you. We have a box of equipment inside the vehicle and you can use as much as you want. How many rounds of gas does the launcher shoot? As many as he wants. No restrictions.
In every vehicle there's one commander… He says where to shoot…
No. He sits with the driver up front, we sit in the back. “Listen, there are some kids here, I’m throwing at them.” “Sure, chief to 2A, stun grenades ok.” “Check, roger”. You throw stun grenades, gas. No authorization, no nothing. “I’m throwing gas.” And it gets to a point where people are acting like little kids: “Let me throw gas, let me throw gas”.
Do you say anything about it?
Yes. I’m pretty much in a minority in the company. In a platoon of nine people, we were three against behaving like dumb kids every time you enter the city and throw stun grenades like…
What do you mean by “dumb kids”?
It's when they throw stones at you when you're in an armored vehicle, you know nothing will happen to you, so there's no need to throw stun grenades at them, making them deaf for a month.
The orders are to throw stun grenades at them?
There aren't any defined orders. If there are defined orders, then nobody knows them. Using crowd dispersal equipment – no one ever told us anything about it. Inside the city, inside Nablus.
Inside Nablus, you go in – you can do whatever you want? With rubber [-coated metal bullets]?
Rubber, yes.
Anything.
Yes, anything. Maybe you have to report on the two-way radio about shooting rubber. I never heard anyone say “no”. No matter what. Four soldiers in the back, the commander up front, he has no idea what's going on.
Depoimento de um sargento da Unidade Paratrooper

Documentário da israelo-marroquino-francesa Simone Bitton, 2004
MUR
Parte II - legendas em português, (10')

domingo, 13 de outubro de 2013

Pena de Morte!?


Anistia Internacional
Declaração dos Direitos Humanos em desenho animado

No dia 10 de outubro, as ONGs humanitárias e os humanistas bem informados celebraram o 11° aniversário do Movimento mundial para a extinção da Pena de Morte, liderado pela Anistia Internacional com sucesso.
Eu sou opositora ferrenha à pena de morte desde sempre. Não acho que ninguém tenha direito de tirar a vida de outrem, nem ilegal nem legalmente, e acho amoral ao extremo punir um crime, qualquer que seja, com o crime definitivo de tirar a vida.
O poder de vida e morte só Deus tem. Ou o destino, o acaso, ou o que quer que seja que rege o Universo em que vivemos.
Portanto, Abaixo a Pena de Morte!
Como diz o provérbio inglês: Tow wrongs do not make a right - Dois erros não equivalem a um acerto.
No caso da pena capital, a mensagem que ela transmite é que matar é um crime admissível, contanto que seja decidido por júri, juizes, um ditador qualquer ou um governante com princípios morais restritos.
Acho a pena de morte inadmissível em qualquer circunstância e quaisquer que sejam os delitos que os verdugos queiram punir recorrendo à bestialidade da vingança.
Olho por olho, dente por dente, é coisa do Antigo Testamento, obsoleto desde o Novo, tolerante, justo e cheio de amor e ensinamentos.
Portanto, quem for a favor da Pena de Morte, prepare-se para obter informação e opiniões contrárias de cabeça aberta e, quem sabe, mudar de ideia.
Quem for contra, encontrará abaixo informação e argumentos para apoiar sua posição em conversas sérias e papos de boteco.

"The death penalty is the ultimate denial of human rights. It is the premeditated and cold-blooded killing of a human being by the state. This cruel, inhuman and degrading punishment is done in the name of justice. It violates the right to life as proclaimed in the Universal Declaration of Human Rights." Anistia Internacional

A pena de morte nega qualquer possibilidade de reabilitação e reconciliação. Além disso, oferece uma resposta simplista a problemas complexos, em vez de promover explicações que possam gerar estratégias positivas para combater a criminalidade.
Por outro lado, ela prolonga o sofrimento da família da vítima e estende o sofrimento dos familiares e amigos do condenado, que sendo inocentes, são por tabela condenados ao sofrimento.
Ela desvia recursos e energia que poderiam ser mais bem aproveitados, como por exemplo no trabalho contra crimes violentos e na assistência das pessoas afetadas.
E a simples existência desta punição selvagem é um sintoma da cultura da violência, não uma solução. É uma afronta à dignidade humana.

No mundo inteiro, mais de 23 mil pessoas se encontravam no corredor da morte no fim de 2012.
O direito à vida e o direito de não ser submetido a tratamento e punição cruel, degradante e desumana são reconhecidos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e em outros instrumentos internacionais que protegem a integridade de todos os cidadãos do planeta Terra, além das constituições de vários Estados civilizados.
A adoção da Resolução 62/149 na 62a  Assembleia das Nações Unidas em favor de uma moratória em execuções, prova que a maioria dos países do mundo são favoráveis ao fim desta punição.
Porém, governos demais (um, já seria demais, mas neste caso são mais de vinte) ainda acreditam que conseguem resolver problemas politicos e sociais urgentes executando um punhado ou um montão de gente.
Muitas pessoas no mundo ainda se iludem achando que a pena de morte oferece à sociedade mais proteção, mas não, oferece sim mais brutalização.
A abolição está ganhando terreno, mas ainda tem muito chão pela frente.
Cada vez que a pena de morte é aplicada judicialmente ela é feita implicitamente em nome da população inteira, transformando todo cidadão do país em assassino.
Acho que todo cidadão do mundo deveria saber o que a pena de morte representa, como é usada e como o simples uso desta punição horrenda afeta cada um de nós cidadãos do mundo e brasileiros, pois sua simples existência, por tabela, nos desumanisa individual e coletivamente.

Começando por nosso continente, graças a Deus (e ao bom senso) o Brasil foi o segundo país da América a abolir a pena de morte no século XIX. Abolimos na Proclamação da República em 1889, um ano depois do fim da Escravatura. O primeiro país foi a Costa Rica, em 1859.
Com exceção do Caribe e das Guianas - onde quase todos os Estados continuam mantendo esta espada de Dâmocles sobre a cabeça de seus habitantes, cúmplices ingênuos ou involuntários - os dois únicos países da América a manterem a pena de morte são os Estados Unidos e Cuba. Sendo que Cuba, embora ainda não a tenha extiguido na Constituição, não executa há já algum tempo. Já os Estados Unidos executaram 43 pessoas até o fim do ano de 2012.
Dividindo por estado, o Arizona executou 6 prisioneiros; Delaware, 1; Florida, 3; Idaho, 1; Mississippi, 6; Ohio,3; Oklahoma, 6; South Dakota, 2; Texas, 15.
Há 77 pessoas à espera de serem executadas nos seguintes estados: Alabama, 6; Arizona, 2; Califórnia, 13; Connecticut, 1; Delaware, 1; Florida, 22; Georgia, 2; Luisiana, 1; Mississipi, 2; Montana, 1; Nevada, 3; Ohio, 3; Oklahoma, 1; Pensilvânia, 7; South Dakota, 1; Tennessee, 1; Texas, 9; Governo federal, 1.
Há 3.170 pessoas no corredor da morte, inclusive na Califórnia, 724; Flórida, 407; Texas, 308 e 204 na Pensyivânia.

Recapitulativo da valsa abolicionista estadunidense de 1846 a 2012 (6')
Apenas 17 dos 50 estados dos EUA não têm pena de morte

Dou atenção especial aos Estados Unidos porque é nosso vizinho, adora dar lições de moral aos outros países, e porque foram os únicos que aplicaram a pena de morte no nosso Continente em 2012. Como disse acima, o Caribe, infrator até hoje irredutível, não entra nesta conta.
A Belarússia foi o único país a aplicar a pena de morte na Europa e na Ásia Central.
Estes dois países são os únicos dos 56 Estados membros da Organization for Security and Cooperation
na Europa a ainda usarem esta punição bárbara.
Na União Africana, 37 dos 54 Estados são abolicionistas por lei ou na prática. E que se saiba, cinco dos 54 recorreram à execução judicial no ano passado: Botswana, Gâmbia, Somália, Sudão do Sul e Sudão.
Na Liga Árabe, sete dos 214 Estados membros confirmaram ter executado prisioneiros: Iraque, Palestina, Arábia Saudita, Somália, Sudão, Emirados Árabes e Yêmen.
Na Associação das Nações do Sudeste Asiático, não houve nenhuma notificação dos 10 membros.
No Commonwealth, cinco dos 54 Estados membros confirmaram execuções: Bangladesh, Botswana, Gâmbia, Índia e Paquistão.
O Japão e os Estados Unidos foram os únicos países do G8 a aplicarem a pena capital em 2012.
Dos 193 membros das Nações Unidas, 174 já estão livres da barbárie da pena capital em 2013.
O governo chinês é o maior assassino oficial do planeta.


O Second Optional Protocol to the International Covenant on Civil and Political Rights (ICCPR) é o tratado universal que proíbe execuções e fornece mecanismos essenciais para um Estado abolir a pena capital.
Em 2013, 75 dos 167 Estados participantes do ICCPR e dos 140 Estados abolicionistas em lei ou em prática ratificaram o Segundo Protocolo.
O Brasil, junto com Azerbaijão,Chile e Grécia, ratificaram, sabe-se lá por que cargas d'água, com reserva.
A punição por morte é um assunto controvertido em vários países por razões ideológicas, culturais, ou simplesmente por lógica irracional.
Algumas pessoas influenciadas pela raiva, pelo horror imediato que sucede um crime hediondo, ou simplesmente por vulneráveis a informações erradas, acham que a pena de morte é um mecanismo que dissuade o crime.
Não dissuade de jeito nenhum.
A pena de morte é mesmo é assassinato premeditado, a sangue-frio, de um ser humano por um Estado em nome da justiça.
Que justiça?
A pena de morte viola o direito à vida proclamado na Declaração de Direitos Humanos, portanto, é injusta.
É uma punição cruel, desumana e degradante em todas as suas formas: decapitação, eletrocução, enforcamento, fuzilamento, lapidação ou injeção letal.
Não existe execução humana.
Toda execução é desumana.
Até a do Sudão, que executa na onda de "quem com ferro fere com ferro será ferido" matando o criminoso do mesmo jeito que ele cometeu seu crime.

A pena de morte é sempre uma tortura com preâmbulo de dias, meses e anos durante os quais o condenado vive em tempo "emprestado" pelo Estado.
A espera é em si uma tortura. E como todo tipo de tortura, ela é inadmissível e insuportável em uma sociedade civilizada.
Como a tortura, uma execução constitui um assalto físico e mental extremo do condenado.
Não há nenhuma justificação possível para a crueldade.
Ninguém ainda pensou ou conseguiu quantificar os danos morais e psicológicos que cumprir ordens de morte causam em um verdugo acidental encarregado de matar em nome do governo ou da pátria em uma sala, pátio de execução ou em campo de batalha.
Talvez esta pesquisa não tenha sido feita para evitar descobertas que apavorem os governos belicistas. A pesquisa poderia provar que um verdugo civil ou militar e um reservista que matou para "servir a pátria", de sensibilidade normal, após apertar o gatilho ou qualquer outro instrumento que tire a vida, convive com a cena da morte e carrega dentro de si o sangue da vítima durante meses, anos e às vezes a vida inteira. Pois matar é revelar o lado bestial do homem, e quando a besta é solta, nem que seja só o tempo de baixar alavancas de injeção letal, ela adultera a natureza humana e corrói por dentro, até que ponto não se sabe.

Como não dá para quantificar o dano moral que matar causa, não dá para quantificar o sofrimento psicológico à espera da morte pelas mãos do Estado.
A pena de morte é discriminatória e é usada disproporcionalmente contra os pobres, as minorias e membros de certas etnias. Quando não por questões religiosas, em países em que este tipo de conflito ainda provoca morte.
Em alguns países, é usada como meio de repressão para silenciar oposição política.
Em outros, erros e falhas do processo judiciário são exarcebados por discriminação, má-conduta processual e representação legal inadequada.
Enquanto a justiça humana continuar falível, o risco de executar inocentes continua imenso.


Há Estados que são pressionados pela opinião pública, influenciada pelo oportunismo de políticos irresponsáveis ou de uma mídia ignorante dos fatos, para selecionar o "pior do pior" dos crimes e criminosos entre os milhares de assassinatos cometidos anualmente em suas cidades.
Esta "seleção" inconsistente é em si absurda. Leva a erros e falhas evocadas acima. Pois até em um país sem preconceito, democrático, com um sistema judiciário incorruptível, o juiz e o júri são humanos. Portanto, falíveis.
Extinguir a pena de morte é também uma aceitação desta falibilidade humana.
Entinguir a pena de morte é reconhecer que ela é uma política pública destrutiva e divisiva incompatível com valores pioritários que fazem de nós seres humanos, racionais.
Além de permitir o risco do erro irrevogável, ela custa muito caro, além de financeira, social e psicologicamente.
Não há nenhuma prova que ela dissuada o crime.
Se dissuadisse, não haveria criminosos nos Estados Unidos.
Opor-se à pena de morte não significa minimizar nem aceitar os crimes dos quais os condenados são culpados.
Opor-se à pena de morte não significa minimizar o sofrimento dos familiares das vítimas dos crimes dos quais os condenados são culpados.
Opor-se à pena de morte significa admitir que o sentido definitivo e a violência que lhe são inerentes são incompatíveis com as normas da vida moderna e de um comportamento civilizado.
Tal resposta ao crime é inapropriada e inaceitável, quando se deseja aprimorar a sociedade.
Sem contar que em muitos Estados em que é usada, funciona como um instrumento de repressão política, de mordaça aos oponentes ou de eliminação de concorrentes. Nesses casos, as sentenças de morte são pronunciadas em julgamentos de fachada em que a justiça é totalmente descartada.
Só a abolição total internacional conseguirá garantir o fim de abusos, de erros e presentear nossa geração com um degrau a mais na escada do processo evolutivo de sentimento e comportamento.

Há vários mecanismos internacionais que protegem a integridade humana e combatem a pena capital.
O primeiro é a Declaração Universal dos Direitos Humanos, acima, adotada nas Nações Unidas em 1948 em resposta à brutalidade e ao terror da Segunda Guerra Mundial. No Artigo 3, ela reconhece o direito à vida e no Artigo 5 afirma categoricamente que Ninguém deve ser submetido a tortura nem a tratamento e punição cruel, desumano e degradante.
A pena de morte viola estes direitos universais.
Há também os protocolos internacionais: O Second Optional Protocol to the International Covenant on Civil and Political Rights, pré-abolicionista, adotado na ONU em 1989; o Protocol No. 6 to the European Convention for the Protection of Human Rights and Fundamental Freedoms [Convenção Europeia de Direitos Humanos]  com respeito à abolição da pena de morte, adotado no Conselho da Europa em 1982 - este abole a pena de morte em tempos de paz e reserva aos Estados o direito de a ela recorrerem para punir crimes "in time of war or of imminent threat of war"; o Protocol to the American Convention on Human Rights to Abolish the Death Penalty, adotado na OEA em 1990, estatua a abolição total da pena de morte, mas também permite a adoção da pena em tempos de guerra; e o Protocol No. 13 to the European Convention for the Protection of Human Rights and Fundamental Freedoms [Convenção Europeia de Direitos Humanos] adotado no Conselho da Europa em 2002, que abole a pena de morte em qualquer circunstância, incluindo tempos de guerra ou ameaça iminente de agressão militar. 
Além dos protocolodos acima, no Statute of the International Criminal Court adotado em 1998, a pena de morte foi excluída das punições que a Corte Internacional autoriza, apesar desta Corte ser encarregada de julgar crimes extremamente graves como os contra a humanidade - genocídio e violação das leis internacionais que regem os conflitos armados.


Estudos científicos encomendados inclusive por Estados homicidas como os Estados Unidos não conseguiram encontrar nenhuma prova que a pena de morte dissuada o crime.
As pesquisas mais recentes conduzidas pelas Nações Unidas em 1988 e atualizadas em 1996 e 2002 concluíram que "...research has failed to provide scientific proof that executions have a greater deterrent effect than life imprisonment. Such proof is unlikely to be forthcoming. The evidence as a whole still gives no positive support to the deterrent hypothesis".
Estatísticas de países abolicionistas provaram que a abolição da pena de morte não repercutiu no aumento da criminalidade.
No Canadá, por exemplo, a taxa de homicídio era de 3.09 por 100 mil habitantes em 1975 e após a abolição em 1980 foi caindo até chegar a 1.73 por 100 mil.
É uma ilusão pensar que as pessoas que cometem crimes graves os cometem racionalmente, calculando as consequências. Na maioria das vezes os assassinatos são cometidos em momentos de emoção intensa ou sob efeito de álcool ou droga.
A Anistia Internacional  descobriu que pelo penos um entre 10 prisioneiros executados nos Estados Unidos desde 1977 sofriam de severa desordem mental que os impedia de pensar de maneira racional e até de entender a sentença.
E que se saiba, o bandido de verdade, de qualquer classe social que comete crime sério premeditado, não pensa nas consequências porque acha que não será descoberto e se for, vai se safar.
Portanto, o elemento dissuasivo eficaz seria aprimorar a detecção, aumentar a possibilidade de prisão e condenação formal. E depois de preso, a reabilitação, é claro, sem a qual um presídio não passa de escola de criminalidade.
Voltando à pena de morte, ela é uma pena dura, mas não é dura contra o crime.
A opinião pública favorável se baseia na ideia errada de que é uma medida eficicente contra o crime. O que não é. Portanto, o que estas pessoas querem mesmo são medidas efetivas que reduzam a criminalidade. Quando vão ingenuamente na onda de pessoas ou mídias com agenda própria que advogam pela pena de morte é responsabilidade do governo esclarecer que esta punição capital é uma resposta emocional ineficaz e atacar a criminalidade com meios efetivos, como a educação.

O outro argumento que os defensores da pena de morte levantam é que evita o recidivismo.
Aí também há um engano. Ora, o condenado já está preso e não representa mais nenhuma ameaça à sociedade de quem está protegido.
E como a punição é defintiva, não há como saber se os executados teriam recidivado...
Uma execução não pode ser usada para condenar assassinato.
Tal ato vindo de um Estado só espelha a vontade criminosa do criminoso de usar violência física.
Repito, todo sistema, por mais evoluído que seja, inclusive o da Escandinávia, é vulnerável à discriminação e ao erro. Nenhum sistema é ou poderia ser capaz de decidir com justeza, consistência e infalibilidade quem deve morrer ou viver.
A pena de morte é totalmente aleatória, já que ela é usada para uns e não para outros que cometeram crimes similares ou crimes bem maiores - enfim, se pudesse haver hierarquia entre assassinatos. Até isso é aleatório.
Quem não tem dinheiro para pagar um bom advogado vai para a cadeira elétrica enquanto que outros, como o milionário O.J. Simpson, que matou a ex-mulher e o namorado dela, é absolvido graças a um arsenal de advogados e chega à velhice intocável.
Concluindo, os Direitos Humanos são inalienáveis a todas as crianças, a todas as mulheres e a todos os homens indiscriminadamente. Eles não podem ser tirados de alguém porque cometeu um crime. 
Os Direitos Humanos se aplicam aos piores e aos melhores de nós humanos, é por isso que eles protegem todo mundo no mundo todo.
Os Direitos Humanos nos protegem até de nós mesmos, do nosso lado negro. É por isso que a Declaração é importante e tem de ser respeitada religiosamente.
Os Direitos Humanos são universais, indivisíveis e interdependentes.
Quando são infringidos em um Estado, em um continente, afeta todos os demais a curto, médio ou longo prazo; direta ou indiretamente.
Os Direitos Humanos são devidos até aos terroristas. Pois até os agentes que os combatem admitem que execuções judiciais ou sumárias só servem para fabricar mártires; como foi o caso de Ossama Bin Laden.


Amnesty International welcomes the multiplicity of discourses on human rights grounded in different cultures and religions and believes that different visions contribute to our understanding of human rights. At the same time, major world religions emphasize mercy, compassion and forgiveness in their teachings. Amnesty International's call for the cessation of all executions is consistent with these teachings.
All major religious denominations are to be found in states which continue to use the death penalty in different regions of the world. Likewise states that have abolished the death penalty either in law or in practice are also found throughout the world, cross-cutting religious lines. The death penalty is not exclusive to any particular religion; thus it would be wrong to interpret Amnesty International's campaign for the abolition of the death penalty as an attack on any particular religion. Amnesty International is an ethnically and culturally diverse, non-political organization which bases its work on international human rights. Its worldwide membership is drawn from across the globe and from a plethora of religions.
An informed public opinion is shaped by education and moral leadership. Governments should lead public opinion in matters of human rights and criminal policy. The decision to abolish the death penalty has to be taken by the government and legislators. The decision can be taken even though the majority of the public favour the death penalty which indeed has historically almost always been the case. Yet when the death penalty is abolished there is usually no great public outcry and it almost always remains abolished.
A government would not be justified in torturing a notorious prisoner or persecuting an unpopular ethnic minority simply because the majority of the public demanded it. Slavery was once legal and widely accepted. Its abolition came about through years of efforts by those who opposed it on moral grounds.
At the turn of the last century only three countries had permanently abolished the death penalty for all crimes. Today, at the beginning of the 21st century, two thirds of the countries in the world have abolished the death penalty in law or practice. Indeed, over the past decade more than three countries a year on average have abolished the death penalty in law or having abolished it for ordinary crimes have gone on to abolish it for all crimes. Moreover, once abolished, the death penalty is seldom reintroduced.
The USA introduced execution by lethal injection almost 30 years ago, applying it for the first time in 1982. Since then, nearly 900 prisoners have been killed by this method in the USA, and it has all but replaced the alternative methods- electric chair, hanging, gassing and shooting. Nearly 20 years after its introduction into USA law, lethal injection was adopted by China, Guatemala, the Philippines (although the Philippines abolished the death penalty in June 2006), Taiwan and Thailand.
Lethal injection avoids many of the unpleasant effects of other forms of execution: bodily mutilation and bleeding due to decapitation, smell of burning flesh in electrocution, disturbing sights and/or sounds in lethal gassing and hanging, the problem of involuntary defecation and urination. For this reason it may be less unpleasant for those involved in carrying out the execution. However, lethal injection increases the risk that medical personnel will be involved in killing for the state, in breach of long-standing principles of medical ethics.
Any form of execution is inhumane. All known methods can be painful and have their own unpleasant characteristics. Moreover, it must be remembered the death penalty is not only about the minutes during which the prisoner is brought from the cell and killed; a prisoner lives with the penalty of death hanging over their head from the moment he or she is sentenced to the moment of unconsciousness and death.
The search for a "humane" way of killing people should be seen for what it is -- a search to make executions more palatable to those carrying out the killing, to the governments which wish to appear humane, and to the public in whose name the killing is to be carried out.




Filme de Tim Robbins: Dead Man Walking, com Sean Penn e Susan Sarandon

Filme de Ernst Lubitsch: Broken Lullaby com Phillips Holmes  (1932)  

Extrato de 19' do filme Le Dernier Jour d'un Condamné
baseado no livro homônimo do escritor francês Victor Hugo (1829)

Ópera Le Dernier jour d'un Condamné, de David Alagna. 
Baseada no livro homônimo de Victor Hugo (O último dia de um condenado)