domingo, 3 de julho de 2011

Esperando Godot



A imagem do escritor e dramaturgo irlandês Samuel Beckett é a do Teatro do Absurdo, das poucas palavras, dos dramas humanos calados e profundos.
Na segunda guerra mundial Beckett deixou a boa vida de Dublin em 1940 para entrar na Resistência francesa na qual representou o papel de correio na Paris ocupada pelos nazistas.
Depois retomou a escritura e sua peça Esperando Godot provocou um choque na dramaturgia em 1948 conseguindo o que era até então impossível. Uma estória em que nada acontece com e entre as duas personagens Vladimir e Estragon durante todo o primeiro ato, e como se a genialidade de manter a platéia atenta a um vácuo não lhe bastasse, no segundo ato repete a dose e deixa os protagonistas do espetáculo, palco e platéia em fase, esperando por nada até a cortina fechar.
Seu primeiro livro, Murphy, foi recusado por 36 editoras antes de ser publicado... Ao ser informado do seu Prêmio Nobel literário em 1969 suspirou e disse: Que catástrofe! Quem sabe antevendo a banalidade em que o Nobel da Paz cairia quarenta anos mais tarde ao ser atribuído de maneira precipitada...
Faz quatro anos que um milhão e quinhentos mil gazauís vêm protagonizando Vladimir e Estragon em larga escala em uma peça com vários atos absurdos que se repetem em uma espera de víveres e de ajuda que nunca acaba.

A sabotagem feita no Saoirse

Vigília no Stefano Chiarim
Se Beckett não tivesse morrido em 1989 estaria na Flotilha da Liberdade II – Stay Human, que tenta dirigir-se a Gaza.
O barco dele seria o Saoirse http://irishshiptogaza.org/?p=715, sabotado há pouco em porto grego.
Resistência no Audacity of Hope
Junto com o ítalo-holandês Stefano Chiarim que está sendo consertado e vigiado noite e dia por tripulantes e passageiros irritados com o “terrorismo internacional” praticado pela Grécia em nome de Israel e dos EUA.
Mas nem todos os estadunidenses são insensíveis e sectários, é claro.
O navio que ostenta a bandeira deste país, o Audacity of Hope, carrega dezenas de ativistas entre os mais determinados. Também foi bloqueado na Grécia.
Aliás, a embaixada grega em Tel Aviv anunciou sem vergonha que sua Guarda Marítima está fazendo tudo para evitar que os barcos lá ancorados deixem o porto para integrar a Flotilha a tempo. Está bloqueando no porto todos os navios que por lá transitam e chegou a pôr o capitão do navio estadunidense atrás das grades.
Primeiro pensou-se que fosse só para espantar os humanistas determinados, mas não, sua acusação é grave, de pôr a vida de seus passageiros em risco.
Polícia grega contendo manifestantes pró-Flotilha
As autoridas gregas estão apelando para a ignorância sem nenhum constrangimento e sem piedade.
Será que querem resolver o problema do rombo financeiro da Grécia sujando as mãos de lama alheia?
A do Mar Morto é escura e cola. 
Em meados de maio, Ehud Barak, ministro da Defesa de Israel, disse que a “Transição palestina do terrorismo e bombas suicidas para demonstrações desarmadas massivas é uma transição que nos trará dificuldade”.

Pois é, os participantes da Flotilha estão até recebendo treinamento de resistência à provocação e para abordagem pacífica.
Porém não estavam preparados para a postura duvidosa da Grécia, do presidente da ONU nem da sabotagem que os Estados que não podem ser chamados de terrorista praticam sem pestanejar.
Após Israel ousar desafiar a imprensa internacional com banimento de 10 anos aos que embarcarem na Flotilha, devíamos ter imaginado que tudo o mais fosse possível e provável.
Mas o nosso sindicato internacional em Jerusalém saiu em defesa dos colegas estrangeiros e está pressionando as autoridades israelenses para que voltem atrás. Por que a ONU, que é muito mais potente (?)  não teria a mesma coragem de desafiar os todo poderosos e em vez de dar bronca nos ativistas deixasse a Flotilha em paz?
Já se sabe que não ajuda. Então que pelo menos não atrapalhe.

Ataque da Flotilha no ano passado  


 

Mahmoud Ahmadinejad e as eminências não tão pardas que estão de olho em seu reinado 
Dando um pulo para a direita no mapa mundi para abordar uma linha paralela de terrorismo de Estado, na semana passada houve um Colóquio anti-terrorismo de dois dias em Teerã que reuniu delegados de 6 países para discutir medidas de colaboração contra atentados.
O Irã tem vítimas célébres de atentados mortais. No ano passado o Dr. Masou Ali Mohamedi explodiu junto com seu carro, o serviço secreto israelense Mossad foi logo acusado, e negou, é claro. O Dr. Mohamedi era um eminente professor da Universidade de Teerã, um dos maiores cientistas iranianos e diziam que trabalhava no projeto nuclear. Seu colega, o professor Majid Shahiari tinha sido assassinado do mesmo jeito alguns meses antes.
O maniqueísmo do Colóquio foi quase risível, caso se pudesse rir de terrorismo. Os delegados iranianos apontaram para os estados terroristas ocidentais conhecidos com dedos hirsutos e esqueceram as vítimas da Revolução islâmica de 1979. De lá a cá, o regime executou sumariamente centenas de prisioneiros do grupo adversário Mojahedin e em 1988, milhares de homens e mulheres opositores ao regime foram enforcados por ordem do Aytatollah Khomeini, sem contar as prisões aleatórias e as torturas que ainda não pararam.

A prisão de Guantánamo que
continua funcionando
Mas hoje em dia é difícil dar lição de moral. Até a última década do segundo milênio quando se entrevistava uma autoridade local ainda dava para argumentar, cutucar com vara curtinha, mas depois de Abu Ghraib, Haditha, Guantânamo, Bagram, do “simples” conceito de rendition e o recente massacre de libaneses e palestinos, fica um pouco difícil.
Quanto a Mahmoud Ahmadinejad, seus dias no poder parecem estar contados. É seu amigo do peito e braço direito no governo Esfandiar Rahim-Mashae que talvez consiga o que seus concidadãos revoltados não conseguiram com passeatas. O amigo da onça tem metido os pés pelas mãos (de propósito, dizem) deixando o presidente com má fama no lugar errado. Demitiu inclusive dois ministros “intocáveis” e acabou irritando Sayed Ali Khamenei, o líder do conselho de Aiatolás que constitui a eminência parda.
Em Teerã nas rodas dos poderosos especula-se sobre seu sucessor em voz alta. Aliás, segundo os locais, Ahmadinejad ganhou em 2005 apertado e não se esperava que terminasse o mandato, pois o Conselho de Aiatolás não achava que tinha estatura presidenciável. Só não foi logo descartado porque percorreu o interior do país conquistando grande popularidade. É mesmo querido em todos os povoados, mas emTeerã é "quase" persona non grata.
Seus sucessores potenciais são um dos três aliados recentemente presos por corrupção – Ali Asghar Parhiskar, Ali-Reza Moqimi, Mohammed Sharif Malekzadeh; o atual ministro das Relações Exteriores Ali Akbar Salehi e, por incrível que pareça, o próprio Esfandiar Rahim-Mashaee, cuja filha é nora de quem? De Ahmadinejad.
Se o presidente cair e o “amigo” Mashaee for empossado, este golpe de mestre de estado vai ficar na estória. Em Teerã o Golpe já virou piada antes de ser efetivado.

Na Síria, o regime ficou mais isolado após o sucesso popular das passeatas de ontem, de norte a sul do país fechado a cadeado. Desde a adesão da bela Aleppo à marcha  dita pró-democrata que o poder do presidente Bashar al-Assad tem se esvaziado. A população já começa a acreditar que nada consegue conter o movimento em direção a uma suposta liberdade. A cada novo enterro (mais de mil pessoas já morreram nas mãos das forças militares) a procissão é multiplicada e a palavra de ordem agora além de Tahrir (Liberdade) é diretamente contra Bashar. 
Este demorou demais a entender que não era intocável, e que a propaganda dos EUA é implacável. Talvez fosse bom negociar agora com as forças de oposição nacionais, para não chorar mais tarde. Os Estados Unidos vão fazer tudo para destituí-lo, como Gaddafi (erros geopolíticos crassos), mesmo que desestabilizem a região inteira neste processo de defender seus interesses a curto prazo. 

E no vizinho do litoral que conseguiu a duras penas acalmar-se, a instabilidade volta a rondar.
Seis anos atrás o primeiro ministro do Líbano Rafiq Hariri morreu em um atentado no litoral de Beirute junto com 21 outros libaneses. Uma queixa foi formalizada junto à ONU e um Tribunal Especial foi organizado para investigar o assassinato.
Desde então, o Tribunal encontrou vários culpados.
Os primeiros foram agentes nacionais de segurança que foram presos e depois libertados.
Depois foram sírios cujas identidades não foram divulgadas. Mais tarde também inocentados.
Sítio da explosão que matou Hariri e mais 21 pessoas 
Agora decidiram culpar os principais inimigos de Israel no Líbano, ou seja, o Hizbollah.
Quatro nomes foram divulgados e o que encabeçou a lista foi o de Mustapha Badraddin, o chefe de operações militares do Hezbollah.
Embora a imprensa libanesa já tivesse bordado esta eventualidade, a notícia caiu um Beirute como uma bomba relógio em contagem regressiva para detonar.
A ONU lançou mandados de prisão para o quarteto sem pensar (?) nas conseqüências deste ato.
Acontece que o Hezbollah é um partido devidamente constituído, tem vários parlamentares democraticamente eleitos, e além do mais, tem dezoito dos trinta ministérios no governo de coalizão formado pelo atual presidente do Conselho Najib Mikati (bilionário sunita amigo íntimo do presidente da Síria). Mikati precipitou-se à televisão para dizer que a ONU havia declarado suspeita e não dado veredito de culpabilidade.
A maior comunidade religiosa no Líbano é a xiita, à qual pertence o Hezbollah; a segunda é a sunita, à qual pertencia Hariri; a terceira é cristã (39%). Elas vivem em um equilíbrio frágil duramente conquistado.

Bombardeio do Líbano em 2006
Mikati está suando para estabilizar o país após o bombardeio israelense de 2006 em que as perdas humanas foram grandes e materiais de milhões de dólares.
O líder do Hezbollah, Sayyed Hassan Nasrallah não deixou por menos. Contra-atacou em seguida questionando porque Israel não fez parte da investigação da ONU, já que agentes do Mossad foram vistos no local fatídico na véspera do atentado e os computadores usados para incriminar o Hezbollah foram transportados através de Israel em vez de serem retirados do Líbano por Beirute. E levantou uma lebre dizendo "Nenhum dos investigadores do STL (Tribunal da ONU) questionou  ninguém em Israel..., em vez de investigarem os israelenses eles recolheram informações que estes lhes davam.    
Sem solidarizar-me com Nazrallah, longe disso, sou obrigada a admitir que a contra-informação que visa intoxicar em vez de informar é algo usado (mais amiúde do que se imagina) sem vergonha para manipular a opinião pública e/ou limpar a barra dos donos do mundo na hora em que precisam.
Desta vez, quem ganha com a desestabilização do Líbano?
Um colega jornalista baseado em Beirute diz que no Líbano todo mundo é inocente e todo mundo é culpado.
O que não dá à ONU o direito de condenar a população inteira ao caos.
No final das contas, na lógica do colega inglês, todos nós no mundo inteiro somos inocentes e culpados, já que, com conhecimento de causa, permitimos que um país ocupe e espolie outro de terra e de água sem dizer nem fazer nada.
No caso de Hariri, ou os altos funcionários da ONU vivem em outro planeta ou estão realmente seguindo uma agenda particular na qual a estabilidade do Líbano não está anotada e está longe de ser prioritária.


Manifestação em Istambul de apoio à Flotilha da Liberdade Stay Human

FLOTILHA DA LIBERDADE STAY HUMAN: http://www.freedomflotilla.eu/;
Free Gaza Movement: http://www.freegaza.org/;
Lowkey: http://youtu.be/ET6U54OYxGw;http://youtu.be/kmBnvajSfWU; http://youtu.be/GO5Cay6GUkM;
Global BDS Movement: http://www.bdsmovement.net/;
Ações do BDS Movement em Aukland: http://youtu.be/N6k7DaW4xmA;
http://www.bigcampaign.org/

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