domingo, 4 de fevereiro de 2018

Dois livros em defesa da Palestina

Na segunda feira, cerca de 13 mil funcionários da Agência da ONU para refugiados palestinos, UNRWA, entraram em greve na Faixa de Gaza para protestar contra a decisão de Donald Trump de cortar o financiamento dos Estados Unidos para a agência. Reem Abu Hmeid, professor em uma escola da UNRWA, explicou: "Estamos protestando pelo direito dos refugiados, o direito de retorno. Nunca desistiremos deste direito de retorno às nossas terras ocupadas. É o dever da UNRWA e das Nações Unidas nos prover educação e serviços médicos ".
É um fato.
Aproveito a deixa para apresentar o novo livro de Norman Finkelstein, GAZA, um inquérito de seu Martírio.

Recomendo o livro GAZA, an inquest into its Martyrdom a quem quiser entender melhor o funcionamento da Faixa e o suplício dos palestinos concentrados neste território pequenininho.
Norman Finkelstein é um escritor claro, ativista incorruptível e surpreendentemente erudito para um estadunidense. É a pessoa mais bem informada em documentos. Acumula em seu escritório décadas de arquivos e no coração, uma tonelada de indignação contra  ocupação da Palestina para compartilhar com o mundo.
Desde que cubro o dito "conflito" Israel vs Palestina , recuso-me a usar a palavra guerra que meus colegas usam erroneamente.
Guerra é uma luta orientada para objetivos, temperada por risco mortal e estratégico. O que Israel faz na Palestina não enquadra nessa definição.
Após a Operação israelense Protective Edge em 2014, Norman inaugurou o termo "responsabilidade proporcional". Eu não aderi à terminologia porque para mim o único responsável é o ocupante, segundo as leis internacionais. Ele mais tarde voltou atrás após muito pesquisar. É acadêmico, distante do terreno, procurou respostas científicas, encontrou e neste livro as apresenta em detalhes.
Em "Gaza: uma inquérito de seu martírio", Norman decidiu desconstruir a falsa narrativa de "guerra" em Gaza, refutando suas partes componentes.  
Gaza é um depoimento exaustivo, acadêmico e de cidadãos presentes neste enclave sofrido e carente.
Desde o início, Norman é específico sobre sua tarefa. "Este livro não é sobre Gaza. É sobre o que foi feito com Gaza. "As próximas 400 páginas confrontam e desmascaram uma década de manchetes de violência".
Norman acusa não apenas os atores políticos e militares israelenses, mas também as ONGs e instituições internacionais que não exercem corretamente seu trabalho de proteger os direitos dos gazauís. Estes são bombardeados por Israel e depois "traídos" por um grupo de instituições cúmplices do agressor.
O livro conjuga academicismo rigoroso e indignação com o comportamento dos que possibilitam direta e indiretamente a violência israelense.
Norman se desculpa antecipadamente por um eventual tédio da leitura, mas achei sua pena muito legível, apesar do conteúdo ser chocante para quem não conhece Gaza. Ultrajante, para os demais.
Para os que não conhecem muito a Faixa, Norman incluiu notas de rodapé explicativas, e não notas finais. Funcionam também como fonte para leitura adicional. 
À pergunta de por que Israel ataca Gaza?
Norman explica: porque é "mal defendida, mas orgulhosamente desafiadora". 
Gaza tem sido o foco de guerra contra a paz.
Ali, Israel renovou periodicamente sua dissuasão regional, sem correr o risco de lutar contra um inimigo bem equipado. "Porque Gaza não possui armamento defensivo, Israel dispara à vontade da terra, do mar e do ar. Essa unilateralidade torna cada vez mais importante examinar minuciosamente as escolhas do agressor.
O escrutínio que Norman faz de Gaza é implacável. Usa estatísticas para mostrar a assimetria brutal de violência e danos. Como por exemplo na operação Cast Lead, a invasão de três semanas de 2008/9, na qual 6300 casas de Gaza foram destruídas, contra uma casa israelense.
Denuncia a hasbara (propaganda) israelense de alegações repetidas, absorvidas na linguagem da grande mídia - mas nunca fundamentadas. Depois que 29 ambulâncias foram danificadas ou destruídas na Operação Cast Lead, o relatório (e o relatório comissionado) da ONG israelense Physicians for Human Rights, concluiu que as ambulâncias tinham sido "visadas" em uma campanha cujo "significado subjacente era de criar terror sem misericórdia".
A hasbara rebateu com o" amplo "uso militar das ambulâncias do Hamas", sem fornecer provas fiáveis. O investigador da ONU, Goldstone, não conseguiu encontrar nenhuma. A ONG israelense B'Tselem também não. Magen David Adom, a "Cruz Vermelha" de Israel, também contesta a acusação. Porém, a hasbara primou sobre a verdade no inconsciente coletivo internacional. 
Na operação Protective Edge em 2014, Israel quase dobrou o número de de ambulâncias danificadas ou destruídas - 45. Repetiu a lenga lenga e ficou por isso, como sempre.
Aliás, Norman ilustra bem o uso da doutrina Dahiya. Antes de mostrar seu ponto de vista, tenho de esclarecer do que se trata. É uma estratégia militar formulada pelo general israelense Gadi Eizenkot que teoriza o contexto de guerra assimétrica nas áreas urbanas e exige o uso "desproporcionado" de força do agressor contra a resistência atacando civis em áreas urbanas, como argumento demoníaco de dissuasão.
Para ilustrar a intencionalidade da doutrina Dahiya em todas as operações israelenses, Norman mostra como Israel se auto-incrimina impunemente. O vice-primeiro, Eli Yishai, disse durante a Operação Cast Lead que "[deveria ser] possível destruir Gaza, para que eles entendessem que não podem mexer com a gente ... Milhares de casas de casas, túneis e indústrias serão demolidas. "
Ameaçou cometer crimes de guerra e cumpriu.
E nem tendo se auto-incriminado foi levado à Haia para ser julgado.
Crimes de guerra que ninguém pensa em punir.
Por que as ONGs e as instituições retrocederam e se abstêm de investigar mais agressivamente possíveis violações das leis internacionais?
Norman atribui o "lapso" ao fato da opinião pública internacional ter se acostumado e aceitar os "massacres periódicos" em Gaza, do temor das represálias israelenses de difamação e outros procedimentos criminosos, e à covardia política.
O livro termina com um apêndice sobre "o repúdio do Direito Internacional pelos ocupantes". Neste, Norman insta a Assembleia Geral da ONU a exigir o fim dessa indiferença; independentemente de qualquer "processo interminável de negociação de paz, cujo propósito óbvio é tornar a ocupação irreversível e consignar ao esquecimento o povo da Palestina".
Concordo plenamente.

The Bg lie about Gaza is that the Palestinians have been the aggressors

Norman Finkelstein on his book
I
II
III
IV

Aproveito para apresentar outro livro importante sobre a Palestina: Cracks in the Wall, de Ben White.
Depois de décadas de ocupação e anexação insidiosa, Israel criou um apartheid, a realidade de um estado na Palestina histórica.
Os esforços de paz falharam por causa de uma verdade inconveniente: o máximo que os israelenses oferecem não corresponde ao mínimo suportável pela Palestina e nem aos padrões do Direito internacional.
Mas, apesar da situação no terreno ser sombria, Ben White argumenta que existem fendas cada vez maiores nos principais pilares de apoio de Israel. A oposição às políticas israelenses e até as críticas ao sionismo estão crescendo nas comunidades judaicas, bem como entre progressistas ocidentais.
A eleição de Donald Trump serviu de catalisador para esses processos, inclusive a mudança de partido tomado por Israel incondicionalmente passar a ser uma questão de divisão nos Estados Unidos. Agora os liberais contrários ao sionismo podem exprimir-se sem medo de recriminações de seus líderes Barack Obama e Hillary Clinton.
Por outro lado, a campanha de boicote liderada por palestinos está ganhando impulso e provocando uma reação desesperada por Israel e seus aliados.
Com uma análise acurada, Ben White faz uma análise bem feita da questão e diz que está na hora de mudar o rumo evitando os erros do passado. Um caminho para frente, além do apartheid na Palestina.
A solução, diz, não é partição e separação étnica, mas igualdade e autodeterminação - para todos.
Utópico?

PALESTINA

Freedom fighter Ahed Tamini is still in jail in Israel

Israeli occupation forces have already killed
three 16-year-old unarmed Palestinians in 2018: 
Musab Tamimi
Ameer Abu Musaed,
Ali Qino

Nenhum comentário:

Postar um comentário